As crianças de hoje, talvez por escassearem e não poderem ser submetidas a trabalho infantil, já não fazem recados. Também é verdade que os locais onde se iam fazer esses recados também desapareceram praticamente quase todos. Era a inexistência de frigoríficos e arcas congeladoras obrigava à renovação quotidiana dos laços entre os comerciantes e clientes. Os lojistas do bairro conheciam-nos não só a eles como toda a restante família. E para suprir uma última falta à mesa à última da hora, uma das crianças da casa (agora só há uma, talvez duas...) era enviada rapidamente à esquina com o recado memorizado: - Depois a minha mãe há-de cá passar para pagar (o que levasse).
As crianças mais novas costumavam fazê-lo com o orgulho e o sentimento de importância que as duas fotografias iniciais mostram – a mais acima é de Willy Ronis (1952) e a outra de Henri Cartier-Bresson (1954). Depois, à medida que o tempo passava e elas cresciam, os recados multiplicavam-se e complicavam-se e a alegria orgulhosa inicial desaparecia das expressões das crianças como já acontece com esta fotografia abaixo de Robert Doisneau (1953). Mas, mais prosaicamente, o que não me surpreenderá é que, numa futura exposição fotográfica, qualquer destas fotografias clássicas seja acompanhada de uma explicação anexa enquadrando os hábitos da sociedade fotografada…
A propósito da fotografia de Henry Cartier-Bresson lembrei-me que os meus tempos de "puto" fiz muitos recados.
ResponderEliminarA minha tia solteirona que morava lá em casa, cada vez que eu ia à tasca da esquina comprar vinho para o jantar, rezava uma ladainha que dizia assim:
Fernandinho foi ao vinho e partiu a garrafa pelo caminho;
Ái dos cacos, Ai do vinho, Ái do cú do Fernandinho.
A minha Mãe e o meu Pai riam-se e eu não achava muita graça.
Era no entanto com muito orgulho que o fazia pois isso significava responsabilidade.
Os meus filhos fizeram poucos e os meus netos acho que não vão fazer nenhuns.
Lamentavelmente.