Maigret, que olhou maquinalmente para os tornozelos de Anna Gorskine, reparou que ela sofria, como a mãe receara, de hidropisia.
Os seus cabelos ralos, que deixavam ver o couro cabeludo, estavam desgrenhados. O seu vestido preto estava sujo.
Para rematar, uma penugem mais do que evidente sombreava o seu lábio superior.
Mas, mesmo assim, era bonita, de uma beleza vulgar, animal. Com as pupilas cravadas no comissário, a boca mostrando desdém, o corpo vagamente encolhido, ou talvez enroscado pelo instinto do perigo, perguntou implicativa:
« Se sabe isso tudo, para que serve fazer-me essas perguntas?...»
Esta passagem é de Pietr-o-Letão, um dos primeiros romances de Georges Simenon, escrito por volta de 1930. Anna Gorskine é uma das personagens secundárias desse livro, uma jovem judia de Vilnius (então polaca, hoje lituana) que tinha vindo estudar para Paris e que entretanto se perdera. A cena decorre numa cela, a simpatia de Maigret por Anna Gorskine é evidente para o leitor, embora o trecho acima se venha a concluir com um episódio de uma exuberante histeria nervosa curado com o conteúdo de uma bilha de água que Maigret lhe atira à cara. Em compensação, à saída e discretamente, Maigret deixa a indicação para que as suas refeições viessem do restaurante da frente, uma mordomia rara para um detido...
Sabe-se muito mais de Anna Gorskine do que de Monica Lewinsky. É curioso como algumas páginas de um romance podem ser mais reveladoras de uma personalidade do que centenas delas de meses de acompanhamento de um escândalo. A bem dizer e para subsistir, o escândalo de Bill Clinton com a estagiária, nem precisava de personagens, apenas de uma história e das fotografias dos protagonistas, que o resto adivinhava-se. O padrão de beleza da estagiária não era o convencional, de WASP. Mas o que justifica esta minha associação é a descrição física acima de Anna Gorskine, mais pincelada que desenhada, mais sugerida que relatada por Simenon, e de como ela se assemelha a Monica, sobretudo quando os anos passam e pesam (abaixo). Vale a pena acrescentar que o escritor belga sabia desenhar os seus tipos físicos: os antepassados de Monica são também judeus e também originários daquelas mesmas paragens centro e leste europeias.
Esta passagem é de Pietr-o-Letão, um dos primeiros romances de Georges Simenon, escrito por volta de 1930. Anna Gorskine é uma das personagens secundárias desse livro, uma jovem judia de Vilnius (então polaca, hoje lituana) que tinha vindo estudar para Paris e que entretanto se perdera. A cena decorre numa cela, a simpatia de Maigret por Anna Gorskine é evidente para o leitor, embora o trecho acima se venha a concluir com um episódio de uma exuberante histeria nervosa curado com o conteúdo de uma bilha de água que Maigret lhe atira à cara. Em compensação, à saída e discretamente, Maigret deixa a indicação para que as suas refeições viessem do restaurante da frente, uma mordomia rara para um detido...
Sabe-se muito mais de Anna Gorskine do que de Monica Lewinsky. É curioso como algumas páginas de um romance podem ser mais reveladoras de uma personalidade do que centenas delas de meses de acompanhamento de um escândalo. A bem dizer e para subsistir, o escândalo de Bill Clinton com a estagiária, nem precisava de personagens, apenas de uma história e das fotografias dos protagonistas, que o resto adivinhava-se. O padrão de beleza da estagiária não era o convencional, de WASP. Mas o que justifica esta minha associação é a descrição física acima de Anna Gorskine, mais pincelada que desenhada, mais sugerida que relatada por Simenon, e de como ela se assemelha a Monica, sobretudo quando os anos passam e pesam (abaixo). Vale a pena acrescentar que o escritor belga sabia desenhar os seus tipos físicos: os antepassados de Monica são também judeus e também originários daquelas mesmas paragens centro e leste europeias.
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