22 outubro 2006

O EDITORIAL


É muito instrutiva – e recomendo – a leitura do editorial de hoje do The Australian, que pode também ser interpretado como se se tratassem de recomendações para orientação do Primeiro-Ministro australiano, John Howard, quanto à forma como deverão ser geridas as relações da Austrália com os seus pequenos países vizinhos do Pacífico Sul, agora que se aproxima mais uma Cimeira dessa Organização, marcada para amanhã nas Fidji ao mesmo tempo que o governo de Howard anunciou pretender desencadear um combate sério contra a corrupção existentes nos governos de alguns desses países.

São compreensíveis as preocupações manifestadas pela Austrália, através daquele editorialista, com a estabilidade em todo conjunto de países daquela vasta região. São preocupações – com a corrupção, nomeadamente - que podíamos perfeitamente tornar extensíveis às de um qualquer país membro da União em relação aos seus colegas de organização. Serão menos transponíveis as imagens hipotéticas de, numa acção de combate à corrupção, ver um destacamento de polícia alemã invadir o gabinete do primeiro-ministro letão (como se lê no editorial que os australianos fizeram nas Salomão) ou de destacamentos militares italianos condicionarem a liberdade de circulação do comandante das forças armadas maltesas (como se pode ler no Público que aconteceu em Timor)…

No mundo de hipocrisia descrito por George Orwell em Animal Farm, havia a regra que os animais eram todos iguais mas depois havia uns que eram mais iguais que outros. Essa regra costuma ser transposta para as relações internacionais, onde, à priori, os países são todos iguais. É a gramática aparentemente usada na União Europeia, que impede o tal assalto da judiciária alemã ao gabinete do primeiro-ministro da Letónia. Será, se calhar, por Orwell se ter ficado pela Birmânia e nunca ter posto os pés na Austrália que Down Under nunca se interiorizaram esses pormenores de hipócrita cortesia diplomática…

A consequência principal parece ser que, naquela região do globo, nem se perde tempo pretendendo que existe essa coisa ficcional chamada de soberania nacional quando os acontecimentos desagradam a Austrália. Nem é em vão que, numa outra notícia da mesma edição do jornal, a respeito de Timor-Leste e oriunda dos seus correspondentes em Dili, é feita menção às tropas australianas ali presentes, assim como aos contigentes policiais neozelandeses e malaios, esquecendo acidentalmente o contigente português... É um novo estatuto com que Timor-Leste tem agora de se adaptar a viver. Já deixou, felizmente, de ser a 27ª província da Indonésia. Só que agora está em risco de se tornar a enésima uma outra coisa qualquer da Austrália…

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