O ano passado houve um tema fracturante que sacudiu a blogosfera por umas semanas: o direito dos homossexuais doarem sangue. Formulado da forma que o foi, o que para aqui se escreveu… e até fazia sentido, não se desse o caso do problema estar mal fundamentado porque o direito prevalecente e a perspectiva correcta como o tema tem de ser abordado é o de quem recebe a transfusão de sangue, que tem um direito prioritário ao de qualquer doador em não o receber contaminado e poder vir a ficar infectado por causa disso. E, por muito estranha que pareça a associação, há algo de déjà vu entre a maneira como se fundamentava aquele debate sobre transfusões sanguíneas e a publicitada contestação da Banca portuguesa quanto aos termos da proposta de lei sobre a recapitalização daquele sector pelo Estado.
E eu não estou a ver Jerónimo ou Louçã a reconhecerem que é um governo de direita que está a defender com intransigência os interesses do estado contra os seus odiados inimigos de classe…
Parece ser verdade que as condições impostas pelo Estado serão draconianas, mas também não deixa de ser verdade que os bancos portugueses não tem que as aceitar, basta preferirem recapitalizar-se aumentando os seus capitais próprios com a entrada de dinheiro fresco de outros parceiros - afinal, seria o mercado a funcionar! Se o não fizerem é porque não há parceiros interessados ou então os que há imporão condições ainda mais desvantajosas que as do Estado português. Neste debate algo está muito mal fundamentado: o que torna a actividade bancária diferente de tantas outras actividades económicas onde o Estado não interfere e que o levará a intervir agora, quando a Banca parece ameaçada, não são propriamente os interesses dos accionistas: é a defesa dos interesses dos milhões de depositantes.
É por isso que as bojardas do accionista do BES Ricardo Salgado, que compara esta proposta com as nacionalizações de 1975, tem a mesma razoabilidade – e devem receber o mesmo acolhimento – que as bojardas simétricas de Jerónimo de Sousa quando comparava Passos Coelho com Pinochet. Aliás, não deixa de ser sintomático, neste debate que se afigura tão propenso à intervenção ideológica, que sobre ele haja um silêncio ensurdecedor da parte dos partidos (comunistas e bloquistas) que usam recorrentemente expressões como o grande capital ou os grandes banqueiros. Esta carta com queixas que os banqueiros enviaram para Bruxelas mostra que não é preciso usar-se aquela retórica de esquerda radical para que se verifique uma situação de ruptura entre o executivo e a alta finança portuguesa…
E eu não estou a ver Jerónimo ou Louçã a reconhecerem que é um governo de direita que está a defender com intransigência os interesses do estado contra os seus odiados inimigos de classe…
Gosto do termo "bojarda" que já não lia nem ouvia há muito tempo.
ResponderEliminarA democracia é assim. Qualquer um é livre de dizer bojardas. O eco de quem as diz é que é diferente. E até pode acontecer que uma bojarda repetida "ad nauseum" passe a ser um a tirada inteligente.
Tenho para mim um conceito muito límpido do que é uma bojarda.
ResponderEliminarNão as diz quem quer e mesmo quem tem autonomia para as dizer pode não as poder dizer porque não se reuniram condições para o fazer.
Pressupõe alguém muito convicto de si mesmo, convicção que se alimenta de um círculo próximo onde não existe ninguém com autonomia para o contrariar, círculo esse que tem de necessariamente estar presente durante a bojarda para anuir concordantemente com o autor.