Há dois dias (25 de Setembro), aproveitando a presença do primeiro-ministro japonês em Nova Iorque para a abertura da 74º Assembleia Geral da ONU, Donald Trump assinou um Acordo de Comércio específico com Shinzō Abe. Engolido pelas notícias do teor do telefonema que Trump fizera ao presidente ucraniano, pedindo-lhe um favor pessoal, e pela sentença em que o Supremo Tribunal britânico desautorizava, por unanimidade, Boris Johnson na decisão de suspender a actividade parlamentar, o noticiário internacional não ligou raspas ao assunto. Será que devia tê-lo feito? Os simpatizantes do presidente americano têm sempre este capital de queixa contra quem não se dispõe a seguir a linha editorial preconizada pela Casa Branca. Normalmente, esses simpatizantes esquecem-se de mencionar que, entre a comunicação social afecta a Trump, existe nomeadamente a Fox News, o bastião televisivo do trumpismo e que nem mesmo ali os desejos editoriais de Trump são sempre totalmente satisfeitos. Aliás, como se perceberá pelos próximos parágrafos, o que parece valer mesmo a pena, é os palermas (simpatizantes de um palerma), ficarem-se pelas lamurias, que o aprofundamento dos factos só costuma tender a enterrar ainda mais Donald Trump.
Recorde-se que o comércio e os acordos de comércio haviam sido uma anunciada pedra de toque da política externa da presidência Donald Trump. Ele é que ia dar uma volta ao assunto! Começou por se retirar do TPP mal tomou posse, comprou uma briga (feia) com a União Europeia por causa do aço e alumínio, impôs a substituição do acordo comercial que ligava os Estados Unidos ao Canadá e ao México (NAFTA) por um outro (USMCA), acordo esse cuja ratificação pelos próprios Estados Unidos - e isso é que não é divulgado... - se arrasta sem fim à vista pelos bastidores do Congresso. Mas tudo isto é a típica América política de Donald Trump feita, de espampanância sem substância. Mas será talvez por isso mesmo, e porque a mais espaventosa guerra comercial de Trump se tem vindo a travar contra a China que os sucessos que se possam registar entre outras potências do Extremo Oriente têm o significado especial de tentar colmatar a imagem de impotência estratégica para onde Trump empurrou o seu país - porque a China, ao contrário de um Canadá ou de qualquer outro grande país europeu, aliados da NATO, não tem quaisquer razões supletivas, para fingir diplomaticamente vergar-se aos discursos insolentes do presidente americano.
Quando há dois dias o presidente Donald Trump compareceu na cerimónia que a foto acima documenta, tratava-se, na realidade, de um reanúncio: um mês antes, os mesmos dois protagonistas haviam anunciado quase precisamente a mesma coisa em Biarritz durante o G7. Seguiu-se um mês de negociações bilaterais com concessões mínimas das duas partes, sobre o vinho ou o arroz, mas onde perdurou o impasse sobre os tópicos importantes, caso da indústria automóvel. Por isso, o acordo de comércio assinado não é geral. Mas o facto de estar a apresentar uma novidade requentada e limitada nunca incomodou, e não será agora que iria incomodar, Donald Trump: ele prometeu que isto iria representar «really big dollars for our farmers and for our ranchers» (dinheiro a sério para os agricultores e criadores de gado). Talvez sim. Subentendido ao costumeiro exagero trumpiano estava a oportunidade de novos mercados para os exportadores americanos de carne bovina, suína e queijo, entalados por causa da guerra comercial com a China. Tipicamente, e apesar de toda a fanfarra, o texto do acordo ainda não fora tornado público dois dias depois... Talvez por mostrar que no mundo real da diplomacia comercial é o melhor que se pode arranjar - a retórica de Trump não vale nada.
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