Eu sei que o Uruguai é um país que fica na América do Sul e que a sua capital é Montevideu. Sei até que é uma democracia presidencialista mas já tenho que recorrer a consultas para saber o nome do presidente (José Mujica) e qual o partido com maior representação parlamentar (Frente Ampla). Sei muito mais sobre a França, país que nos está muito mais próximo, cultural e geograficamente. Mas mesmo assim, foram precisos terem-se passado quase dez anos depois da sua aprovação para descobrir que existia no Direito civil francês uma figura chamada Pacto Civil de Solidariedade, que me parece uma espécie de casamento civil em versão suave. Mas suspeito que, não fosse o facto do ex-casal François Hollande / Ségolène Royal terem desfeito esse mesmo pacto que os unia, e ainda não teria sabido da sua existência. O direito civil vigente nos variados países do Mundo não costuma ser assunto digno de alimentar noticiários, nem mesmo quando exótico, como por exemplo o caso da poligamia na África do Sul, reconhecível porque o presidente Jacob Zuma tem quatro esposas…
É assim que parece totalmente desproporcionada a exuberante cobertura noticiosa que é dada quando das extensões dos direitos civis do matrimónio aos casais homossexuais, seja na África do Sul, no Uruguai ou agora em França. Serão excelentes notícias para uma minoria (suponho que os heterossexuais ainda sejam maioritários…) de estrangeiros (esse direito já está consagrado em Portugal desde 2010), mas a relevância do acontecimento não passará desse pouco, e o empolamento só se pode compreender pela militância ou pela incompetência. Exemplificativamente: se num ano a nossa comunicação social não chegará a dar relevo a uma dúzia de notícias que sejam oriundas da Nova Zelândia, por que será que dessa parca dúzia uma delas será a da aprovação dos casamentos homossexuais? Acredito que quantos mais homossexuais se puderem casar em mais países mais aumentará a onda de alegria que grassa nesse segmento da Humanidade, mas será que o assunto é assim tão sério que ombreie (e às vezes desaloje…) a guerra civil na Síria ou a situação na Coreia?
Desta vez acabo por onde costumo começar: a fotografia inicial é de um casal, ela é Erika Mann (1905-1969), escritora e actriz alemã, filha do escritor Thomas Mann; ele é W.H. Auden (1907-1973), poeta de origem inglesa que se veio a radicar nos Estados Unidos naturalizando-se norte-americano. A fotografia datará da segunda metade dos anos 1930, pois os dois casaram-se em 1935. Tratou-se de um casamento de conveniência, visto que Erika era lésbica e Auden homossexual, mas foi a forma dela adquirir nacionalidade britânica e fugir às perseguições que estava a sofrer na Alemanha nazi. Curiosamente, para um casal que nunca o foi, este outro casamento de homossexuais durou 34 anos, até à morte de Erika.
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