02 setembro 2006

À ESPERA QUE O CÃO LADRE

- Aconteceu um incidente curioso com o ladrar do cão – comentou Sherlock Holmes.
- Mas o cão não ladrou! - exclamou o Dr. Watson.
- Esse é o incidente curioso!

Arthur Conan Doyle (O Cão dos Baskervilles)


Eu bem sei como será mais correcto e muito mais bem interpretado afirmar que na blogosfera existe a liberdade de os autores poderem escrever sobre os temas que lhes apetecem nos seus blogues. Contudo, a verdade é que quem os lê acaba, com a rotina, por os classificar e seleccionar de acordo com os temas que costumam tratar.

Para falar apenas do meu Herdeiro de Aécio, onde já escrevi sobre imensos temas, há também uma infinidade deles sobre os quais nunca escrevi nem tenciono vir a escrever. Mas, em contrapartida, houve temas a que, por uma questão de oportunidade e por força das circunstâncias, veio a despertar o meu interesse e vim a ganhar-lhes uma particular afeição.

Um caso foi o da evolução dos acontecimentos em Timor, que é um exemplo de um tema a que me exijo estar atento, assim como, quase de forma involuntária, neste ou noutros temas, quase que exijo igual atenção sobre determinados assuntos específicos a outros colegas de blogosfera a quem atribuo uma especialização.

As notícias de Timor são, como de costume, confusas. Os australianos dispõem-se a aceitar o dispositivo de segurança preconizado pela ONU (350 militares e 1.600 polícias) mas reservam-se o direito de manter no país um dispositivo seu, autónomo, com a composição que julgarem mais conveniente.

Ironizando, refira-se que um daqueles dois dispositivos poderia englobar guardas prisionais, uma vez que o major Reinado se evadiu do local onde estava detido conjuntamente com mais 56 companheiros. Mas parece existir uma certa dificuldade em responsabilizar alguém – timorenses, australianos ou neozelandeses? - pelas evasões.

Parece existir igual dificuldade em saber quem deverá perseguir e capturar os evadidos. No tempo em que Xanana era guerrilheiro e clandestino era quase impossível conseguir dele uma entrevista para a televisão mas esse tempo parece que já lá vai porque o major Reinado deu logo uma no dia seguinte ao da sua fuga… a explicar porque fugiu.

Os conflitos entre gangs armados são quotidianos e as notícias publicadas nos jornais portugueses costumam dar relevo à boa prestação das forças da GNR e às divergências que vão surgindo entre o primeiro-ministro Ramos-Horta e os australianos. Contudo, um incidente curioso, como diria Holmes, é que a Paulo Gorjão não lhe tem surgido inspiração para se pronunciar sobre todos estes acontecimentos em Timor.

Voltando ao início do post e à liberdade dos autores de blogues, reconheça-se, para quem conheça o caso, que uma das especializações mais notórias da blogosfera é a do Bloguítica à volta do caso de Timor, com Paulo Gorjão a comparecer ufanamente – e com o meu maior aplauso – em programas da SIC Notícias para se pronunciar, como especialista, naquela matéria.

Apesar de, sobre o tema, com ele ter algumas discordâncias pontuais (nomeadamente uma simpatia excessiva pela posição australiana), não haja dúvidas que foi uma presença positiva para o alargar de um debate que parecia estar fechado aos convidados generalistas do costume. Entretanto, há dois meses Freitas do Amaral foi substituído na pasta dos negócios estrangeiros por Luís Amado.

A atentar pela escolha dos temas do blogue, a condução da política externa parece que melhorou espectacularmente (a questão timorense incluída), só que isso aconteceu em detrimento do titular da administração interna (António Costa) que passou a sofrer um escrutínio severo do autor do Bloguítica. Será que haverá por ali alguma agenda organizada por ministérios?

Tudo isto teria sido apenas uma especulação de mim comigo mesmo, não fosse esta frase: «de uma vez por todas, a comunicação social portuguesa tem de aprender que os temas não são descartáveis e que há um acompanhamento posterior que tem obrigatoriamente de ser feito», que foi retirada de um post recente de Paulo Gorjão.

Leia-se a totalidade daquele post, com toda a sua assertividade e a sua aparente intransigência de princípios – que pelo que foi atrás referido, não parece estar a cumprir-se em causa própria – e ficar-se-á com a sensação de estarmos perante um Frei Tomás… talvez iludido, como que por um qualquer canto de sereia, que influencia a política portuguesa a partir do seu blogue…

2 comentários:

  1. Certeiro, muito certeiro...
    Creio que num dos meus vários comentários críticos ao personagem (Gorjão), referi que o sonho dele era ser um misto de Pacheco Pereira ("blogueiro") com Prof. Martelo ("tv personality").
    Aliás, a desfaçatez da figurinha surgiu no post em que colocou uma fotografia dele na "Sic Notícias" e, com extraordinária falsa modéstia, criticou a gravata...
    Ressalvando que não gosto de JPP (pelos seus tiques de ex-marxista), e muito menos do Prof. Martelo (uma picareta falante, que pouco sabe do que fala, e um académico de pacotilha), o Gorjão ainda tem que encher muito para estar na mesma divisão destas duas figuras...

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  2. Parece-me não me ter precipitado ao esperar dois meses para poder concluir que todo o debate sobre Timor afinal era instrumental para criticar Freitas do Amaral e a sua condução do ministério. Afastado este, parece que se acabaram os problemas e muda-se o alvo para António Costa (e Mariano Gago?).

    Agora escrever posts como aquele que linkei («uma imprensa responsável não pode agir de outra forma» e que «eu, como consumidor e como cidadão, não lhes exijo menos do que isso») só pode ser visto como a "cereja em cima do bolo do disparate" da parte de Paulo Gorjão.

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