19 janeiro 2006

O DIA EM QUE AS BRs PASSARAM À CLANDESTINIDADE…

Na vaga de surgimento de partidos que ocorreu depois do 25 de Abril, alguns houve que se destacavam pela originalidade, como foi o caso do PRP-BR. Era original por causa da sigla, composta, que se traduzia pelo acrónimo de Partido Revolucionário do Proletariado – Brigadas Revolucionárias. Mais nenhum partido tinha uma sigla com aquele tracinho; havia imensos com M-Ls entre parêntesis, havia mesmo o vetusto MDP/CDE, mas aquele tracinho na sigla principal era mesmo um exclusivo PRP-BR.

Depois havia o símbolo, onde uma enxada e uma chave-inglesa, com o significado dos operários e camponeses do costume, eram encimadas por um punho erguido fechado, segurando uma pseudo metralhadora estilizada que não se percebia bem como dispararia visto que não se via nenhum gatilho. Mas era uma ostentação do poder armado muito original, mesmo no Portugal de 1974.

Finalmente, outra originalidade era a liderança, conjunta, de Isabel do Carmo e Carlos Antunes, numa época em que a alternativa ao dirigente único tradicional eram os colectivos revolucionários. A atenção dada aos dois líderes era de tal forma excessiva que um cidadão comum nem conhecia mais nenhum membro do partido, o que levou ao aparecimento posterior de uma anedota, maldosa: ele era o PRP e ela a BR. Talvez não andasse muito longe da verdade.

Sabe-se hoje que muita da sua capacidade de influência vinha do facto de, durante o PREC, gravitarem na corte existente à volta de Otelo Saraiva de Carvalho. Mas o seu slogan a propósito das eleições constituintes (abaixo) continua poderoso: Não às eleições burguesas! Sim ao Poder popular! Contudo, faltava-lhe a imaginação, por exemplo, do Boicote activo à farsa eleitoral! usado pelo MRPP, também afastado daquelas eleições.
Posso precisar que terá sido no caminho progressivamente mais acelerado que levou ao climax do PREC ocorrido a 25 de Novembro de 1975, que, num belo dia qualquer (a 23 de Outubro), o PRP anuncia, com o maior estadão possível (com os militantes mascarados de capuzes), e põe os órgãos de comunicação a difundi-lo, que as BR se tinham separado do PRP e passado à clandestinidade, com o objectivo de treinar e armar os trabalhadores

Deve ter sido uma das melhores cenas gagas do PREC, só possível porque se estava no PREC... Qual é a racionalidade de uma organização formada umas dúzias de militantes anunciar estrondosamente que uma parte deles pretende tornar-se clandestino, condição essa que requer a maior discricionariedade? Faziam-no porque, naquelas circunstâncias caóticas, ninguém (nenhum serviço de informações, entenda-se) estaria com pachorra para ir atrás dos clandestinos?

Este último episódio associou-se-me às desventuras que antecipo que alguns comentadores profissionais terão de defrontar por estes dias até ao rescaldo das eleições presidenciais.

Sendo Portugal um país onde todos esses comentadores têm simpatias políticas, mas onde não se quer romper a tradição de se endossar e de se comprometer com algum candidato (excepção feita ao exemplo de Francisco José Viegas, de saudar), é possível, senão provável, que uma grande maioria dos apoiantes inconfessados de Soares (António José Teixeira, Mário Bettencourt Resendes, Luis Osório,...) irão, nos próximos dias, fazer como as BR e passar por uns dias à clandestinidade…

1 comentário:

  1. Venho penitenciar-me...

    António José Teixeira e Mário Bettencourt Resendes atravessaram galhardamente todo o descalabro eleitoral de Soares.

    As cenas tristes estiveram reservadas para os apoiantes confessados de Soares

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