03 julho 2024

PAÍSES BAIXOS E A NOTÍCIA QUE HOUVE UM CÃO QUE MORDEU NO CARTEIRO

Quase sete meses e meio depois das eleições legislativas de 22 de Novembro de 2023, finalmente tomou posse o novo governo dos Países Baixos. Há seis meses, houve uma grande animação mediática internacional porque as eleições haviam sido ganhas pelo PVV. O PVV é mais um daqueles partidos-de-um-homem-só-de-discurso-radical, como acontece com o Chega nacional, e o André Ventura lá do sítio chama-se Geert Wilders. E como é um homem só, quando o encarregaram de formar governo... ficou a falar sozinho. OS restantes partidos recusaram-se a integrar um governo que fosse encabeçado por Wilders. Este acabou por desistir ao fim de mais de três meses de esforços, em Março deste ano. Foi uma clamorosa derrota pessoal do próprio, ostracizado pelos seus pares. Os detalhes da constituição do novo governo constam das notícias que ontem saíram a este respeito. Geert Wilders não faz parte do elenco. Se fizesse, as notícias da tomada de posse em Haia não teriam recebido a cobertura discreta que receberam. Consciencializem-se que a comunicação social não é absolutamente nada neutra na forma como nos transmite os acontecimentos. Quando é o cão a morder no carteiro não lhes interessa nada - o que importa é ser o carteiro a morder o cão! Extrapole-se daqui que, entre nós, André Ventura não tem a importância que parece nos media, a importância vem de quem dá ressonância ao que ele diz e faz.

O PROJECTO «ITHACUS»

Entre os projectos militares mais surpreendentes que nunca avançaram conta-se este foguetão intercontinental de transporte que constituía notícia a 3 de Julho de 1964, após o encerramento da 1ª Reunião Anual do Instituto de Aeronáutica e Astronáutica. Será desnecessário explicar em que consistia a ideia: a notícia acima explica-o. Assim como se afigura óbvio que essa ideia estava muito longe de se concretizar: seria necessário esperar ainda uns dez a doze anos (1975) e investir os «fundos necessários» (que não são estimados sequer...). Mas o objectivo estratégico do foguetão «Ithacus» parecia límpido: como potência hegemónica, os Estados Unidos passariam a dispor de meios para colocar uma unidade militar de poder de fogo significativo em muito poucas horas em qualquer local do mundo onde Washington considerasse que os seus interesses estivessem a ser ameaçados: um golpe de estado hostil num país aliado, por exemplo.
O projecto e a ideia de «Ithacus», apesar de imaginativa e engenhosa, tinha dois óbices. O primeiro e mais imediato era o seu custo e a sua eficácia, quando comparado com uma operação aerotransportada mais convencional, que colocaria os mesmos efectivos e as mesmas cargas no mesmo local, só que uma dúzia de horas depois. Seria que os custos - astronómicos - do projecto valeriam essas escassas horas de antecipação? O segundo óbice era de cariz mais estratégico e os responsáveis militares e políticos norte-americanos só se vieram a aperceber dele depois de efectuarem vários outras intervenções no Mundo, como a do Vietname, do Iraque ou do Afeganistão. O problema principal para os Estados Unidos nunca se põe quanto à celeridade como chegam aos locais de intervenção, localizem-se eles onde for por esse Mundo fora; o grande problema dos Estados Unidos têm sido sempre as condições de dignidade como depois conseguem sair desses locais. No Afeganistão, por exemplo, passaram 20 anos (2001-21) por lá e os resultados finais foram os que foram...

02 julho 2024

SOBRE UMA CERTA MEDIOCRIDADE DO ACOMPANHAMENTO INFORMATIVO DE ELEIÇÕES ESTRANGEIRAS

Este Domingo houve eleições legislativas em França e na próxima Quinta-Feira havê-las-á no Reino Unido. Qualquer delas muito interessantes e importantes. Só que o acompanhamento que os canais informativos portugueses fazem destas eleições é... medíocre. A culpa nem é dos convidados. Alguns, nem todos, sugerem, pelas suas intervenções, quão aprofundados são os seus conhecimentos sobre a matéria. O problema é que eles são convidados pelos jornalistas do estúdio a reexplicar (pela enésima vez!) todas as particularidades daquele acto eleitoral - que são as mesmas dos actos eleitorais precedentes! É uma forma de se perder e de enxotar uma parte importante da audiência: os espectadores que sabem esses detalhes elementares mudam imediatamente de canal e só lá ficam a assistir aqueles que já se tinham esquecido do elementar. Forma-se assim um circuito fechado em que os comentadores portugueses em estúdio, uns mais esforçados, outros mais pedantes, dissertam sobre uns tópicos mais elementares, outros tópicos mais superficiais, para uma audiência que as circunstâncias do formato do programa tornaram pouco exigente: por exemplo, ficaram a saber que as eleições francesas são a duas voltas, e que tudo - a composição da Assembleia Nacional - só ficará decidido daqui por uma semana, mas da próxima vez que houver eleições em França eles já se esqueceram disso tudo. É que as últimas eleições legislativas francesas tinham sido apenas há dois anos...

Indo recuperar aqueles que, a meio da narrativa precedente já se tinham ido embora, cansados de ouvir lugares comuns, vamos encontrá-los durante estas noites eleitorais nos canais mais elevados e escondidos das grelhas, acompanhando a informação e a opinião junto de fontes mais originais (no duplo sentido da palavra...). Foi assim no Domingo passado (França) e irá ser assim na Quinta-Feira (Reino Unido) e no Domingo próximos (outra vez em França). Confesso que fico bastante intrigado quando vejo certos comentadores televisivos domésticos de assuntos internacionais a mostrarem-se tão cheios de si próprios.   

O CASO DO DUELO DE ESGRIMA DO PRESIDENTE DO MINISTÉRIO

O dia 2 de Julho de 1924 foi muito animado. Da parte da manhã houve um duelo de Honra na Tapada das Necessidades entre o próprio chefe do governo, o presidente do Ministério, Álvaro de Castro e um dos oficiais-aviadores, o capitão Ribeiro da Fonseca, daqueles que se haviam sublevado no início do mês anterior contra as directrizes do governo. Refira-se que o desafio para o duelo de esgrima que a fotografia mostra, partira do chefe de governo. Concluído o duelo, e como se pode ler noutra notícia do jornal, os duelistas haviam ido para o hospital de São José tratar dos ferimentos, mais graves no capitão Ribeiro da Fonseca que ficou internado. Depois dos curativos, e crendo-se reforçado pelo significativo político da sua vitória no duelo, depreende-se que o presidente do Ministério fora tentar reconstituir o Ministério, já que se encontrava a braços com mais uma crise governamental. Ao fim da tarde, já Álvaro de Castro se convencera que a espadeirada fora em vão e desistira de organizar um novo gabinete, enquanto dois representantes do Partido Democrático se apresentavam em Belém para indicar o nosso conhecido Rodrigues Gaspar como sucessor de Álvaro de Castro. Apesar dos predicados do novo presidente, o novo Ministério não vai chegar sequer ao fim do ano. Quando leio estes episódios da politica da primeira República tendo a dar a mão à palmatória nas minhas críticas à incompetência e irresponsabilidade de Pedro Santana Lopes: nomeado primeiro-ministro em 2004, ele pode ser visto como alguém que chegou apenas com 80 anos de atraso à política... Se calhar, em 1924 ele teria passado desapercebido.

A FUNDAÇÃO DA FORÇA AÉREA FRANCESA

(Republicação)
2 de Julho de 1934. Foi a data da fundação da Força Aérea Francesa (Armée de l'Air) como um ramo autónomo das suas Forças Armadas. Já se haviam passado 16 anos depois da criação equivalente da RAF (Royal Air Force) entre os seus antigos aliados britânicos, ainda durante a Primeira Guerra Mundial (a 1 de Abril de 1918), mas acredita-se que esta decisão terá sido precipitada pela criação no ano anterior e ainda às escondidas, da equivalente Luftwaffe, entre os seus antigos inimigos e ainda rivais alemães. Porém, formalmente, esta última só aparecerá em 26 de Fevereiro de 1935. Mas, ao contrário das outras duas, a Armée de l'Air francesa, derrotada na Primavera de 1940, teve uma importância negligenciável para o desenrolar das operações aéreas da Segunda Guerra Mundial. O prestígio do ramo, com as Aventuras de Tanguy e Laverdure, são uma criação bem posterior, da década de 1960, na BD e na televisão...

01 julho 2024

ELE QUE TENHA CUIDADO E NÃO DEIXE CAIR O SABONETE QUANDO ESTIVER NO DUCHE

Entre aquela fauna que rodeia Donald Trump, há aqueles que, se isso for concebível, são ainda mais detestáveis do que o próprio, pela insolência e pela arrogância como se exprimem na comunicação social. É reconfortante por isso vê-los a pagar judicialmente o preço dessas atitudes, neste caso concreto, a cumprirem penas de prisão por se terem recusado a acatar as intimações para comparecerem diante de comissões do Congresso que investigavam temas - o assalto ao Capitólio - em que lhes seria inconveniente prestar contas. Depois de usarem todos os expedientes legais (dois anos a emperrar!), os craques que alegavam não se intimidar com nada que a comissão lhes fizesse, acabaram finalmente dentro. Já em Março deste ano isso aconteceu com Peter Navarro, hoje calha o dia a Steve Bannon. Ambos apanharam quatro meses e os votos - maldosos mas sentidos - para o que já lá está e para o que hoje vai lá para dentro, são para que não deixem cair o sabonete quanto forem ao duche...

ALGUMAS MODALIDADES OLÍMPICAS DE HÁ 120 ANOS

1 de Julho de 1904 foi o dia do início das competições dos Jogos Olímpicos de 1904, que se disputaram na cidade norte-americana de Saint-Louis no Missouri. Estas edições iniciais dos Jogos Olímpicos - esta era a III Olimpíada, depois das de Atenas (1896) e Paris (1900) - são hoje eventos que só ocasional e discretamente são evocados pelo Comité Olímpico, por causa de várias circunstâncias exóticas a eles associadas: neste caso concreto de há 120 anos disputaram-se competições olímpicas de corridas de sacos, saltos do barril e cuspidelas de tabaco. Concordemos que são aspectos que retiram dignidade ao passado olímpico...
Mas convém fazer estas evocações com o distanciamento e a consciência de quanto as modas e as dignidades são passageiras, para imaginar aquilo que se virá a comentar em 2144 sobre uma nova modalidade olímpica intitulada breakdance que irá ser estreada nos próximos jogos olímpicos de Paris...

OBSERVEM COMO O OBSERVADOR AINDA O DEIXA POR AÍ À SOLTA...

1 de Julho de 2014. O quase recém nascido Observador ainda anda à procura de nomes de colunistas que o projectem. E então desencantaram este João Marques de Almeida. Nem vale a pena desancá-lo. Basta que o leitor leia o que ele há precisamente dez anos antecipava que aconteceria com a candidatura presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. Ou então aquilo que, noutro rasgo de presciência, nem duas semanas depois, augurava para o futuro do Bloco de Esquerda (abaixo). Mas o que eu considero verdadeiramente prodigioso, não é apenas, nem sobretudo, João Marques de Almeida ter escrito estes disparates há dez anos e ter saído impune. O prodígio é ele ter continuado a escrever aleivosias deste mesmo género, e o Observador ter continuado a dar-lhe palco por dez anos a fio. Ainda lá continua. Entre a colecção de disparates que tem escrito mais recentemente, destaco, mais pelo impacto imediato dos títulos do que pelos conteúdos: Miguel Morgado para o Parlamento Europeu (não foi sequer escolhido) ou então O Chega ajuda a democracia portuguesa (tem-se visto a ajuda que o governo da AD tem recebido do Chega!). O que é misterioso nestes casos não é a existência destes medíocres, são os processos misteriosos que os fazem subsistir com esta projecção por anos a fio.