26 janeiro 2007

OS ESLAVOS OCIDENTAIS

Se o poste anterior (imediatamente abaixo) começa por nos mostrar os contornos do estado germânico no período de apogeu da expansão germânica no Leste durante o II Reich (1914), este poste começa por um outro grande império germânico, precisamente 1100 anos mais antigo: aquele que existia à data da morte de Carlos Magno em 814 e que veio a ser dividido pelos seus herdeiros em 843.

O Império de Carlos Magno tornou-se um must propagandístico durante o período da Guerra-Fria: os territórios que engloba correspondem quase escrupulosamente aos países membros da NATO mais passíveis de invasão no caso de um ataque soviético e, além disso, mostravam uma coabitação franco-alemã debaixo de uma mesma estrutura política que era uma verdadeira raridade na história europeia.

Mas repare-se como as fronteiras orientais do império carolíngio terminavam no rio Elba e mesmo as terras que hoje constituem a Áustria se situam num dos seus extremos. Para lá dessas fronteiras habitavam povos eslavos sobre quem os germânicos mostravam o mesmo tratamento desdenhoso que outrora os romanos haviam manifestado a seu respeito: admite-se que a razão da palavra inglesa para escravo (slave) seja a origem étnica dos primeiros escravos empregues pelos anglo-saxões.
Nos tempos de Carlos Magno, as tribos eslavas dominavam a Europa Central a Leste do rio Elba. Como se vê pelo mapa acima, as regiões onde hoje se localizam cidades alemãs de referência como a própria capital, Berlim, Leipzig ou Dresden eram na altura territórios controlados pelos bárbaros eslavos. Foi um intensivo (mas pouco conhecido) trabalho de colonização (e evangelização) germânica, desenvolvido a partir dos Séculos XII e XIII que integrou culturalmente os habitantes dessas regiões que são hoje alemãs.

Na região representada no mapa, onde habitavam os eslavos designados por polábios, o sucesso da aculturação parece ter sido quase total. Embora no Século XV os dialectos usados nas regiões rurais fossem quase todos de raiz eslava, actualmente existem apenas cerca de 60.000 falantes de um idioma eslavo deles descendente: o sorábio. Uma verdadeira curiosidade etnográfica. Em contrapartida, é visível pelos resultados actuais que no caso dos checos essa aculturação acabou por falhar.

Foi nestes territórios colonizados, com as populações constituídas maioritariamente por estes eslavos germanizados, que acabou por surgir o Principado do Brandenburgo e, depois, o Reino da Prússia, reputados pela sua disciplina, e que acabaram por constituir, graças a Bismarck, o núcleo central da unificação alemã em 1871. Com uma bandeira severa a preto e branco e uma águia, a Prússia sempre permaneceu como uma espécie de Alemanha ainda mais rigorosa, num pais onde os habitantes já não são muito dados a exprimir estados de alma, de antemão.
Essa especificidade voltou a ser realçada quando, entre 1945 e 1990, a Alemanha esteve dividida entre dois estados. Na República Democrática Alemã (RDA, no mapa acima - compare-se a quase coincidência com o mapa anterior...), para além das diferenças ideológicas e naquilo onde não houvesse contradição com a sua ideologia oficial obrigatória, pareceu que os seus dirigentes quiseram incorporar quase todas as características que haviam sido as do estado prussiano. A prazo, parecia haver na RDA possibilidades de cunhar uma identidade nacional própria, como hoje acontece com a Áustria.

Um dia, estando em Praga, ao ver a forma rigorosa e disciplinada como os checos (os tais que, por pouco, não chegaram a ser colonizados) se comportavam colectivamente (a subir as escadas rolantes do metropolitano, por exemplo, onde se arrumavam metodica e escrupulosamente à direita, sem dar mais um passo ou subir um degrau ou dois) dei por mim a especular, juntando o que conhecia de várias cidades alemãs (Berlim, Colónia, Munique ou Hamburgo), se não se podia dar o paradoxo que afinal os famosos rigor e disciplina germânicos se devessem a características antropológicas destes famosos eslavos ocidentais…

2 comentários:

  1. Há pouco tempo houve uma proposta para se alterar o nome do estado do Brandeburgo para Prússia. Há sentimentos que não se esquecem.

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  2. Não sabia dessa proposta.

    Percebe-se a causa mas não concordo com ela. A Prússia, enquanto região geográfica, tem uma localização específica, que não é a do Brandenburgo*. Se adoptada, seria uma designação política e como tal potencialmente causadora de mal estar na vizinhança...

    * Alguém me poderá esclarecer sobre a forma mais correcta em português para aquela região: Brandenburgo, Brandeburgo ou Brandemburgo?

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