17 de Dezembro de 1938. Numa das páginas interiores do Diário de Lisboa, com as últimas notícias do estrangeiro, podia-se ler as declarações do embaixador norte-americano no Reino Unido, quando da sua chegada a Nova Iorque, para um pequeno período de férias por ocasião do Natal. Dizia então ele que «a situação na Europa não é (era) para optimismos. Acrescentava que estava de acordo com o presidente Roosevelt sobre a necessidade de se aumentarem as forças armadas nacionais. Referindo-se às perseguições dos judeus na Alemanha, disse que elas constituíam a coisa mais horrível que conhecera em toda a sua vida». Ora aqui está quem não se precavia nas palavras, nem acalentava expectativas de um compromisso funcional com o expansionismo alemão. Para ele, a guerra parecia estar prestes a eclodir (como de facto aconteceu) e a quadra natalícia não lhe pareceria razão para amenizar as suas impressões junto da opinião pública do seu país. O embaixador em questão chamava-se Joseph Kennedy (1888-1969), era o pai do futuro presidente John Kennedy (1917-1963), e, ao contrário do filho, tem hoje uma imagem histórica negativa como appeaser para com Hitler e como anti-semita. A verdade é que a sua curta carreira como embaixador em Londres (1938-40), saldou-se por um fiasco: os britânicos antipatizaram profundamente consigo. Tão má é a imagem que, em Fatherland, uma distopia de História alternativa escrita em 1992, em que o factor pivot é a vitória da Alemanha na Segunda Guerra Mundial e cuja acção decorre em 1964, Joseph Kennedy é que aparece como presidente dos Estados Unidos em vez do filho. E um presidente contemporizador para com o führer Adolf Hitler, nesse universo paralelo em que a Guerra Fria se travava entre os Estados Unidos e a Alemanha. E contudo, se atentarmos àquelas suas declarações (reais) de há 80 anos, torna-se difícil compatibilizar as duas impressões da mesma pessoa.
O livro e excelente. As declaracoes de Kennedy Sr. sao declaracoes de um embaixador em funcoes a falar em publico.
ResponderEliminarCerto, certo e que os alemaes escreviam bons relatorios para Berlim acerca do embaixador com base em conversas em privado...
As declarações de Joseph Kennedy não serão propriamente as de um embaixador em funções a falar em público... Não se deve perder de vista que ele estava a pronunciar-se sobre o futuro, a antecipar a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Só agora sabemos quanto ele estava certo, mas não me parece lá muito profissional de um embaixador traçar cenários sombrios mesmo junto da sua própria opinião pública...
ResponderEliminarSalvaguardando as distâncias, imagine-se um embaixador em Washington de um qualquer país europeu vir agora de férias de Natal e comentar publicamente que a situação interna nos Estados Unidos «não é para optimismos»?... Há um público que gostará de ouvir isso, o que não é garantido é que isso faça muito bem às relações bilaterais.
O mesmo, desconfio, terá acontecido em 1938.