17 novembro 2006

CAVACO E A FLORIBELA

Nem sei que superlativo da expressão lugar comum possa usar para qualificar o quão vulgar são as menções à importância das aparências em política. São-no. E, como acontece com muitos comentários políticos, confesso de antemão a minha superficialidade de não ter ido procurado saber há quanto tempo estava agendada a entrevista a Cavaco Silva ontem transmitida – em directo – pela SIC.
Contudo, mesmo não sabendo isso, sei que, ao contrário daquela episódica entrevista à SIC, na grelha de programas da RTP a quinta-feira é o dia da semana consagrado ao programa Grande Entrevista. Portanto, dada as circunstancias de as entrevistas de Santana Lopes à RTP e de Cavaco Silva à SIC terem sido simultâneas, não hesito em atribuir à segunda a responsabilidade pela contra-programação.

Mas, se o gesto nada tem de inédito na disputa entre televisões, outra coisa se passa quanto aos protagonistas envolvidos na disputa de audiências, um ex-primeiro-ministro português, de um lado, e o actual Presidente da República, do outro. E se, da parte do primeiro, a imagem pública de que goza permite esperar uma grande latitude nos comportamentos, também não deixa de ser verdade que a publicação recente de um livro seu permitia antecipar, com naturalidade, a sua participação num evento televisivo daquele género.

Outra coisa seria de esperar do ocupante do palácio de Belém (e dos seus conselheiros) que não deve dar entrevistas por rotina e que deve pensar as causas e as circunstâncias porque as dá. Antecipando a sobreposição de horários, suponho que a sua reacção devia ter sido outra e não se ter prestado a ser uma espécie de chamariz de uma batalha de audiências de TV. Porque é o tipo de competição onde o Presidente – para já não falar da pessoa de Cavaco Silva... – só pode perder, nem que seja dignidade.

Além de que o seu gesto pode ter transmitido para muitos algum fundamento à tese conspiratória que Santana Lopes expõe no seu livro – eu, por exemplo, disponho-me a levá-la agora muito mais a sério que anteriormente. Isto no caso da presença de Cavaco na SIC ter sido deliberada. Porque se foi involuntária ainda é pior, e temos um Presidente da República disposto a participar na guerra das televisões com a inconsciência de uma estrela adolescente recentemente catapultada para a fama…

2 comentários:

  1. Por princípio, Cavaco deveria resguardar-se, fugir das câmaras, porque nunca foi nem jamais será um bom comunicador.
    Cavaco é rígido na expressão, atabalhoado na elocução, enfático e cansativo.
    Faz lembrar Jacques Chirac que é insuportável nos tiques, no discurso martelado, arrastado e postiço.
    Cavaco foi eleito sobretudo por falar pouco.
    Será que está a ficar deslumbrado com o relativo sucesso da sua actuação?

    Santana é um talento natural diante de um microfone.
    E ontem conseguiu transmitir a ideia de que (apesar dos seus erros) foi tramado.
    Por muita gente, a começar em Sampaio, passando por Cavaco, Marcelo e o seu PPD/PSD que em nada o ajudou...

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  2. "o seu gesto pode ter transmitido para muitos algum fundamento à tese conspiratória que Santana Lopes expõe no seu livro – eu, por exemplo, disponho-me a levá-la agora muito mais a sério que anteriormente"
    Eu estou totalmente convencido, desde os próprios acontecimentos, de que ele foi "frito" e bem frito por Cavaco, Sampaio e cia... Agora, ele merecia ser "frito"? Merecia. Só lamento que pelo caminho se tenha brincado com os destinos do país, algo que foi negligenciado na decisão da "fritura".

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