10 novembro 2006

AZIA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

Fernando Pessoa pôs Álvaro de Campos a conceber estas pérolas do conhecimento daquilo que é feita a natureza humana no início do seu Poema em Linha Recta. Intemporais como são, elas ocorreram-me quando me pus a ler a análise de José Manuel Fernandes no seu jornal ao resultado das eleições intercalares norte-americanas: A merecida derrota republicana numa vitória da democracia.

Trata-se de um primor de título, a não desmerecer o conteúdo, e escrito por alguém que parece que desde os seus tempos de UDP e do respectivo órgão central (Voz do Povo), não pode ser acusado de querer ficar conhecido como uma daquelas personalidades indefectíveis, das que, nas suas causas, se dispõe a ficar até ao fim para apagar a luz e fechar a porta à chave.

Entretanto, as pessoas daquele calibre vão apostando na (falta de) memória alheia, no esquecimento dos episódios das azias provocadas pela exuberância com que se defenderam posições onde hoje reconhecem – muito mais discretamente – terem estado erradas. Álvaro Cunhal, no pólo diametralmente oposto da indefectibilidade chamou-lhes, numa expressão que se tornou momentaneamente muito famosa, folhas secas...

Mas restam ainda muitas folhas vivas das políticas desta administração norte-americana que, tal como o presidente Bush, acolheram os resultados eleitorais recentes com um fair-play muito mais aparente que real. A argumentação, tal qual a ouvi formulada por pessoas como Lobo Xavier, é, apesar dos requintes, demonstrativa da azia com que a derrota eleitoral foi recebida no campo dos simpatizantes dos republicanos.

Essa azia concretiza-se na má-fé com que se brandem os argumentos de considerar que competirá agora ao partido democrata a definição das políticas alternativas às prosseguidas até agora pela administração vigente, nomeadamente em relação ao Iraque, e acusando-os simultaneamente de, dentro do partido, ainda não se terem decidido por uma política coerente a esse respeito.

Quem isto invoca, conhece – ou devia conhecer – perfeitamente as características dos partidos norte-americanos e o absurdo constituído pela exigência da existência de uma política coerente em grupos tão heterogéneos. Pior do que isso, só a ignorância aparente que estas eleições não ocasionaram a substituição do poder executivo norte-americano, apenas a mudança do legislativo para uma composição que é muito menos favorável à sua liberdade de actuação…

Bebam-se uns sais de frutos de um dos lados e modere-se o optimismo no outro: é George W. Bush que continua a decidir - e continua-lo-á a fazer nos próximos dois anos... - os destinos da nação mais poderosa do Mundo!

1 comentário:

  1. Será?
    Sempre duvidei da capacidade de George W. Bush DECIDIR!
    Parece-me apenas um fantoche nas mãos de conselheiros que lhe ditam o que deve fazer...
    Nesses conselheiros incluo o “papá”, claro!
    A ida para o Iraque foi só o retomar da política dos interesses dos cartéis do petróleo, “campo de manobras” da família Bush!

    Digamos que, assim, até podem entregar a gestão das empresas a gestores públicos recrutados em Portugal!!!

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