08 fevereiro 2020

«BRASSERIE LIPP»

É por brasserie Lipp que costuma ser designada a fotografia acima, tirada em 1969 pelo famoso fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson. A brasserie Lipp, situada no boulevard de Saint-Germain, é uma daquelas referências da Paris turística. E como acontece normalmente quando o caso é esse e a reputação se basta a si própria, uma consulta ao tripadvisor informa-nos que a qualidade do estabelecimento, especialmente o serviço e o atendimento, são uma merda (abaixo uma fotografia actual da brasserie). Mas, apesar do título, o seu avançado é apenas o local e o pretexto da fotografia, cujo tema é um indiscutível choque de gerações. Há décadas a separar as duas mulheres sentadas e essa distância é visível em quase tudo o que as rodeia. Desde o mais óbvio, aquilo que vestem (a mini saia versus o chapéu), à forma rígida ou descontraída como se sentam, ao que pediram (a mesa desimpedida da mais nova versus a mesa cheia da outra). Distinguem-se também pelo jornal que lêem, o Le Figaro versus o (mais difícil de decifrar pela disposição...) Le Monde. E por fim há a atitude, um olhar de soslaio e passível de múltiplas interpretações da mais velha na direcção da mais nova que, de dedo na boca, como que acentuando uma certa infantilidade da postura, parece absorta ao que a rodeia. Os cabelos tapam-lhe os olhos, ao contrário da sua colega de foto, interessa menos o que ela está a ver do que o facto de ser vista. Trata-se de um momento no tempo muito bem captado por Cartier-Bresson: hoje calharia à segunda, com os seus setenta e tal anos, a competência de olhar à sua volta, enquanto a representante da modernidade se fixaria no ecrã do telemóvel.

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