03 fevereiro 2020

A PRISÃO DE KLAUS FUCHS

3 de Fevereiro de 1950. Prisão (pela contra-espionagem britânica) de Klaus Fuchs. A pretensão do livro acima (2014), de que ele terá mudado o Mundo é provavelmente excessiva. Mas aquilo que torna a sua história desinteressante para ser explorada como epopeia de propaganda, quer do lado ocidental, quer do lado soviético, é o facto de a sua história ser desprovida da emoção e moralidade de que as histórias de espiões que prestam precisam ter para serem popularizadas para propaganda. Klaus Fuchs foi um físico teórico e, como tal, acabou prestando relevantes serviços como tal ao desenvolvimento do programa nuclear que criou as primeiras armas atómicas em 1945, nos Estados Unidos. Foi um espião que, apesar de ter sido espião, foi um espião útil à causa contra a qual veio a espiar. E não foi um espião muito dissimulado. Quando o Reino Unido o contratou, em 1933, o seu percurso e as suas simpatias comunistas na Alemanha eram conhecidas; aliás, fora por isso que fugira ao nazismo. Quanto à sua carreira como espião, ele foi um espião activo mas menor: aquilo em que os soviéticos estiveram verdadeiramente interessados de 1945 em diante era nas soluções práticas para a construção da arma nuclear, informações que ele, como físico teórico, apenas acompanhava colateralmente. A acrescer, documentos que mais tarde vieram a ser conhecidos (projecto Venona), parecem indiciar que a contra-espionagem dos Estados Unidos desde muito cedo (1943) soubera que havia espiões soviéticos no seu programa nuclear, e que um dos suspeitos principais era Fuchs. Isto torna intrigante o facto de os britânicos terem esperado quase cinco anos para questionarem Fuchs e finalmente o prenderem há 70 anos. Uma análise à sua actividade como físico teórico e como espião mostra que os prejuízos que Fuchs havia causado com a sua segunda actividade haviam ocorrido em 1946 e que em 1950 Fuchs já teria acesso a pouco material que interessasse aos soviéticos. Aquilo que mudara recentemente fora o anúncio da detonação da primeira bomba atómica soviética, em Setembro de 1949 e a percepção pelas opiniões públicas dos países ocidentais que os Estados Unidos haviam perdido a vantagem da exclusividade do armamento nuclear. O que obrigara a respostas como aquela que aqui publicámos anteontem, com o anúncio norte-americano do desenvolvimento de uma bomba termonuclear (Bomba H), muito mais poderosa. O resto da história de Klaus Fuchs parece mostrar que a sua prisão terá sido muito mais ditada pelas circunstâncias dos poderes quererem que se aplacasse uma opinião pública (e não só...) desagradada do que verdadeiramente capturar alguém que passara informações ao inimigo. No Reino Unido, o First Sea Lord Bruce Fraser perguntava alto, dando voz a tantos: «Como é que é possível que, sabendo aquilo que nós sabemos sobre armamento nuclear desde 1945, ainda não possuímos uma bomba atómica, em contraste com o que acontece com os russos que, partindo do nada, aparentemente já nos ultrapassaram?» Para justificar e amenizar as vozes que assim se indignavam, no imediato um bode expiatório como Fuchs foi julgado e condenado em tempo record. Em menos de um mês (1 de Março de 1950) e num julgamento que terá durado hora e meio, ele recebeu uma pena de catorze anos de prisão por espionagem. Além disso, perdeu a nacionalidade britânica. Klaus Fuchs cumpriu a pena até Junho de 1959, quando foi amnistiado com uma redução por bom comportamento. Tinha ainda 47 anos. Foi viver para a Alemanha Oriental, para Dresden, onde se situa o Instituto de Pesquisa Nuclear, onde se tornou uma figura proeminente. O regime comunista deu-lhe alguns cargos de prestígio como a presidência da Academia de Ciências e um lugar no comité central do partido. Reformou-se em 1979, faleceu em 1988. Tendo trabalhado para os dois lados, é um espião com o qual é difícil antipatizar.

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