
Anteriormente, já aqui
chamara a atenção para a localização estratégica da Malásia entre os dois colossos asiáticos: a China, a Oriente e a Índia, a Ocidente. Entenda-se por Malásia neste caso, não o país com esse nome, mas as regiões meridionais da Ásia onde predominam os malaios – as ilhas de Java e Sumatra e a península malaia. As duas primeiras, onde reside sensivelmente 90% da população malaia, foram colónias holandesas enquanto a última esteve sob hegemonia britânica. Para complicar o xadrez étnico (e político) local, existem apreciáveis (e influentes) minorias representativas de cada um dos colossos asiáticos: chinesas e indianas. O mapa abaixo, com cidades identificadas por quatro alfabetos distintos, dá-nos uma boa ideia da encruzilhada que é a região.

Ao prepararem-se para abandonar os seus antigos domínios no final da década de 1950, os britânicos quiseram preservar para a
sua Malásia as fronteiras políticas que haviam sido traçadas na época colonial. Em oposição a isso,
Sukarno, o presidente da Indonésia, passava por ser um
visionário impulsionando os promotores da ideia de uma
grande federação dos povos malaios que se denominaria
Maphilindo (
Ma – Malásia,
Phi – Filipinas,
Indo – Indonésia). Convém esclarecer que a contraproposta britânica, embora não tão
lírica, era igualmente
forçada, ao reunir num mesmo país as várias colónias da península com as outras três colónias britânicas –
leia-se a curiosa história de Sarawak – situadas na ilha de Bornéu, onde os malaios nem sequer se encontravam em maioria.

Os projectos de Londres e Jacarta entraram em conflito aberto em finais de 1962, a pretexto da criação dessa federação, juntando a Malásia ocidental peninsular a
essa outra
Malásia no Bornéu Setentrional (acima). Desencadearam-se
insurreições armadas nestas últimas colónias, embora os objectivos políticos dos insurrectos pudessem divergir dos da Indonésia que os apoiava militarmente: o
Partido Popular do Brunei, por exemplo, pronunciava-se a favor de uma independência autónoma das três colónias do Bornéu – nem a federação com a Malásia, nem a reunião com a Indonésia. Mas o conflito armado acabou por pôr fim à viabilidade política dessas
terceiras vias. Tratou-se de uma guerra subversiva clássica, deliberadamente limitada na sua dimensão pelos dois contendores.

Reino Unido e Indonésia defrontaram-se assim por cerca de quatro anos, num Teatro de Operações selvagem compartilhando 1.780 km de fronteiras mais ou menos indefinidas, traçadas pelo meio de uma selva tropical e impossíveis de patrulhar eficazmente. Do ponto de vista táctico, o conflito veio a tornar-se uma sucessão de incursões no território inimigo, com choques ocasionais e ferozes entre pequenas unidades de infantaria. A narrativa das operações do livro acima é uma sucessão de episódios desse género, que aumentaram de frequência a partir do momento em que os britânicos decidiram assumir também a iniciativa de penetrar em território indonésio sem o assumirem (
Operação Clarete)… Constata-se que o número de efectivos envolvidos foi surpreendente baixo.

Para os 209.000 km² e 1,5 milhões de habitantes do Bornéu Setentrional e, apesar da acelerada rotação de unidades que lá prestaram serviço (recorde-se que os britânicos se defrontavam em simultâneo com
uma outra guerra subversiva no Iémen do Sul), o número de efectivos engajados do lado britânico nunca terá superado os 17 mil – já havia igual número em 1965 na Guiné portuguesa (TO com 36.000 km² e 0,5 milhão). Isso reflecte-se no número de baixas: 800 mortos do lado malaio (95% militares), mas onde apenas um pouco mais de 100 eram soldados britânicos, e uma estimativa de 600 do lado indonésio. Mas, se esta foi uma guerra de que os britânicos se podem orgulhar de ter vencido, as razões para a sua vitória não terão sido obtidas tacticamente no terreno...

As teorias de
Basil Liddell Hart (acima) sobre a
abordagem indirecta do inimigo encaixam na perfeição na solução arranjada pelos britânicos para esta confrontação: para eles, a causa do conflito era a política expansionista desenvolvida por Sukarno e pelos que o rodeavam. Portanto,
como acontecera no Irão a propósito de Mossadegh em 1951, houve que espicaçar os Estados Unidos (e a CIA) para se
sensibilizarem com os problemas estratégicos regionais que estavam a ser agudizados pela conduta de Sukarno – algo que os norte-americanos tenderam a levar a sério considerando o seu envolvimento progressivo na questão vietnamita. Com o apoio da CIA e do MI6, o
General Suharto derrubou Sukarno em Outubro de 1965. E em Agosto de 1966,
a Confrontação estava terminada…
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