12 março 2009

OS RAJÁS BRANCOS DE SARAWAK

Olhando para o mapa acima percebe-se como a Malásia é um país artificial, dividido em duas grandes metades, uma continental, a Ocidente, inserida na península donde o país retira o seu nome, e a outra insular, compartilhando a gigantesca ilha de Bornéu (que é a terceira maior ilha do Mundo com uma área de 743.330 km²) com a Indonésia e o pequeno Sultanato de Brunei. Este último país, conjuntamente com a poderosa cidade-estado de Singapura na parte Ocidental, funcionam ambos como uma espécie de enclaves dentro da Malásia, acentuando o carácter bizarro da geografia malaia.
A Malásia Ocidental é a parcela mais importante do país apesar de representar apenas 40% do território porque, em contrapartida, é nela que vive mais de 80% da população. Contudo é na outra metade do país, que está o maior estado malaio (a Malásia é uma federação). Chama-se Sarawak e, com cerca de 124.450 km², na maior parte cobertos por uma selva luxuriante, é ainda mais extenso que Portugal, apesar de possuir apenas uma população que se estima em 2.450.000 habitantes. Mas o que Sarawak possui de mais notável é o facto de ter sido, durante cerca de 100 anos, uma monarquia, cujo monarca era de origem britânica.
James Brooke (acima), aquele que veio a ser o primeiro Rajá de Sarawak, até nasceu na Índia em 1803, embora tanto o pai como a mãe fossem britânicos. A sua vida faz lembrar, embora com alguns séculos de diferença, as vicissitudes relatadas por Fernando Mendes Pinto na sua famosa Peregrinação. Brooke que, a dada altura, comprou e capitaneava um navio em actividades nem sempre lícitas nas águas da Ásia Meridional (embora o fizesse sempre com o beneplácito daquela que era a potência hegemónica de então: o Reino Unido), bem pode passar por uma espécie de António de Faria reencarnado…
A taluda veio a sair-lhe quando, em 1841, Brooke se dispôs a ajudar militarmente o Sultão de Brunei, tarefa de que se saiu com sucesso e da qual foi recompensado com o título de governador e com um feudo, inicialmente a cidade de Kushing. Nada de muito anómalo naquela região, lembremo-nos como esta narrativa se assemelha às alegadas condições em que Macau veio a ser cedida aos portugueses em 1557. Só que a sua pressão sobre o Sultão era muito mais eficaz à que os portugueses poderiam ter colocado no Século XVI sobre o imperador chinês* e o território de Sarawak foi-se estendendo até se tornar muito maior que Brunei…
Sandokan foi uma série de aventuras criada pelo italiano Emílio Salgari. Haverá quem ainda se lembre da série televisiva que passou há 30 anos na RTP (acima). O herói daquelas aventuras era um príncipe malaio (Sandokan) que era coadjuvado por um português, que foi baptizado com o nome (incrível de tão mal inventado...) de Yanez de Gomera. Ambos lutavam contra a expansão do império britânico, personalizado na pessoa de… James Brooke, precisamente este James Brooke de Sarawak. Sendo o mau da história em Sandokan, há outras coisas que fazem dele, do verdadeiro Brooke, um mau da história
James Brooke era também conhecido por ser um pederasta promíscuo. Nem mesmo as altas exigências de estado o levaram a procriar. Quando morreu em 1868, o seu sucessor foi um sobrinho, Charles e depois um filho deste, Charles Vyner, em 1917. Este último veio a entregar os seus poderes à administração britânica em 1946, depois de 4 anos de ocupação japonesa (1941-45). É significativo da maneira britânica de estar no Mundo que, embora tivessem adoptado exteriormente os costumes locais (adoptando títulos nobiliárquicos como Rajá Muda ou Rani) todos os três Rajás brancos estão enterrados em Inglaterra…

* No Século XIX as relações de poder com a China eram completamente distintas do que haviam sido no passado e os britânicos conseguiam obter do seu imperador inúmeras cedências em consequência das Guerras do Ópio – incluindo Hong Kong.

Sem comentários:

Enviar um comentário