29 fevereiro 2012

A VALSA DE AMÉLIE


Um dos grandes segredos deste filme será o de nos apresentar as personagens através dum punhado de manias inofensivas, descritas em frases curtas, e que nos torna intimamente cúmplices delas num ápice. Ou seja, enreda-nos na sua valsa...

Às vezes, à Sexta-Feira à noite, Amélie vai ao cinema
Onde gosta de olhar em volta, para ver a cara dos outros espectadores
Ou então notar aqueles pequenos detalhes do filme em que ninguém nunca repara
Porém detesta os filmes americanos antigos onde o condutor nem sequer olha para a estrada (…)
Em contrapartida, gosta de cultivar todos os seus pequenos prazeres
Como mergulhar o mais que puder a mão num saco de grãos
Partir a crosta do leite-creme com a ponta da colher
Ou atirar calhaus para saltitarem sobre as águas do canal de Saint Martin.

28 fevereiro 2012

PARIS QUE ENLOUQUECE

SOS Meteoros é uma aventura da dupla Blake & Mortimer desenhada e concebida pelo belga Edgar Pierre Jacobs, mas cuja acção se passa exclusivamente em França. Quase no fim da aventura (prancha 54), há um estranho episódio quando um nevoeiro tóxico, onde se detecta a presença de um elemento desconhecido que tem a faculdade de absorver gradualmente o azoto do ar, provoca o enlouquecimento colectivo da população parisiense, conforme se constata pelas gravuras mais abaixo (clicar em cima do desenho para o ampliar). Inicialmente publicada na revista Tintin em 1958, não deixa de ser interessante assinalar a coincidência da concepção desta Paris virtual que enlouqueceu (um detalhe que eu creio que nem chega a ser indispensável para a trama da aventura...) com o enlouquecimento real que, por essa mesma época, atacava os protagonistas da Quarta República francesa, então em vias de soçobrar por incapacidade de solução para o problema argelino

AINDA AS PAREDES DO PREC

Ainda a respeito do PREC, muito se costuma zombar dos maoistas, nomeadamente os do MRPP, da fauna que povoava aquela organização e da distância sociológica que mediava entre aqueles filhos da classe média, origem urbana, e frequência universitária, e os operários e camponeses que ornamentavam as suas palavras de ordem. Mas, aprecie-se pelo mural acima, como o MRPP não terá sido caso único entre os revolucionários daquele período épico. Sob o olhar patriarcal de Marx e Lenin, também os operários-camponeses-soldados-marinheiros do MES se exibiam em grandes murais por essa Lisboa revolucionária, pintados por quem teria muito pouco contacto com os ditos.
Serão diferenças mais de pormenor do que substantivas as que separam o percurso que foi percorrido desde essa época pelo futuro líder do PSD e Primeiro-Ministro (2002-04) Durão Barroso (acima, à direita) a partir da sua militância no MRPP e pelo futuro líder do PS e da oposição Ferro Rodrigues a partir da sua no MES. Aliás, quis o acaso que, apesar do MRPP ter sido o campeão dos murais revolucionários, foi precisamente diante do mural do MES que acima publiquei que se tirou a fotografia que melhor sintetiza a dissociação entre as trupes revolucionárias e o povo: defronte de tanto empolgamento passa placidamente uma carroça puxada pelo seu jerico. Modernizada, já usa rodas com pneus…

27 fevereiro 2012

ANARCAS – A VOZ LÚCIDA DO PROCESSO REVOLUCIONÁRIO EM CURSO

Em retrospectiva e pela análise do material que deixaram borrado pelas paredes, os anarquistas devem ter sido dos grupos que mais mantiveram a lucidez durante o PREC.
Se as suas máximas que inicialmente deixavam escritas pelas paredes pareciam ser de um carácter filosófico mais geral, como este Se Deus Existe, o Problema é Dele
...ou então parecessem descaradamente inspirados nas influências dos acontecimentos de Maio de 1968 em França como este Sejamos Realistas, Exijamos o Impossível..
...gradualmente, os acontecimentos do próprio PREC passaram a servir de inspiração para os seus slogans, como este Jesus Breve Vem. Todos ao Aeroporto! 32 Janeiro 25H numa analogia a apelos semelhantes pintados pelo PCP antes da chegada de Álvaro Cunhal.
Ou então este Já Não Há Eleições. D. Sebastião Volta Para a Semana em que se percebia tratar-se de uma observação associável às condições impostas pela ala mais radical do MFA para a realização de eleições livres em Abril de 1975.
Na verdade, como se percebe por este À Portuguesa, Só Conhecemos o Cozido! os autores destas frases mostravam-se muito cépticos quanto às teses promovidas por essa ala do MFA sobre as vias originais, à portuguesa, de transição para o socialismo…
Mas os comentários que mais perduraram na nossa memória colectiva foram os trocadilhos engendrados a partir das palavras de ordem militantes, proferidas tão cheias de entusiasmo quanto vazias de substância como este Viva a Dentadura do Proletariado!
Ou então, sequela de uma imperativa discussão teórica do problema da distribuição interna de poder dentro uma qualquer organização marxista-leninista à época, este inerente e antológico Abaixo os Organismos de Cúpula, Vivam os Orgasmos de Cópula!

25 fevereiro 2012

A ALEMANHA DE 1900

Utilizando o mesmo estilo de representação que já aqui fizera para a Prússia de 1800, analise-se agora o traçado das fronteiras do Império Alemão de 1900 sobreposto ao mapa da Europa de 2000. No Século XX a Alemanha perdeu cerca de ⅓ da extensão que tivera originalmente – de 541.000 km² para 357.000 km² – para a França (14.500 km²), para a Rússia (15.000 km²), para a Dinamarca (4.000 km²), para a Lituânia (3.000 km²), para a Bélgica (1.000 km²), até mesmo para a República Checa (300 km²), mas sobretudo para a Polónia (146.000 km²) – o que representa quase metade (47%) do actual território polaco.

Mas a evolução da importância relativa dos factores de produção clássicos nesses 100 anos (em detrimento do factor terra e em prol do factor capital) faz com que a predominância relativa da Alemanha à escala continental e mundial, mesmo apesar das duas derrotas militares que entretanto sofreu (1918 e 1945), não tenha sido substancialmente afectada, talvez antes pelo contrário...

DISTO JÁ NÃO HÁ MAIS – 4

Durante séculos a fotografia acima foi intemporal. Tecnologias à parte, o tema e aquela mesma paisagem já lá podiam ter estado desde os apogeus da Idade Média. O carro de bois e os camponeses em primeiro plano, em contraste com as muralhas ao fundo, sugerem uma distinção de sempre: a entre governados e governantes e entre rurais e urbanos. Feita em 1950 em Espanha – as muralhas em fundo são da cidade de Ávila – pela francesa Janine Nièpce, a fotografia mostra-nos um mundo rural que, materialmente, estava prestes a desaparecer ali e por toda a Europa. Não tenho tantas certezas é se o mesmo aconteceu também à percepção sociológica do encurtamento da distância entre governantes e governados…

24 fevereiro 2012

‘TOU CHIM? É O EUJÉBIO! É P´RA MIM!


Há cerca de um mês deu a volta ao mundo a história de um toque de marimbas de um iPhone de um espectador que, de tão irritantemente alto e repetitivo, conseguiu interromper a actuação da Orquestra Filarmónica de Nova Iorque (acima). O que se segue não vai dar a volta ao Mundo – o que é uma injustiça! – mas virá justificar os predicados há muito adquiridos por Portugal no mundo dos telemóveis desde aquele famoso anúncio de televisão do pastor de ovelhas da Telecel (abaixo).

Pergunta-se: o que poderá ser pior do que um telemóvel de espectador que desconcentre e interrompa a actuação do(s) intérprete(s) em palco? Resposta: quando é o próprio intérprete a interromper a sua actuação para atender uma chamada de telemóvel… O episódio insólito aconteceu com Paulo de Carvalho num espectáculo que deu no passado dia 17 de Fevereiro em Paredes de Coura. Alegadamente e de acordo com o próprio artista, o autor da chamada que merecia tal prioridade era… o Eusébio.
Não se faz. Nem que fosse o fantasma do Karl Marx a falar do outro mundo… O presidente da Câmara local aproveitou o incidente para fazer ondas e ganhar notoriedade. Paulo de Carvalho já veio desculpar-se, assim num modo irresponsável e ligeirinho. Parece estar a pedir que o seu próximo concerto seja interrompido uma meia dúzia de vezes por toques de telemóvel intempestivos seguidos de bocas de 2º Balcão: - É o Eusébio!... Por fim, destaque-se o papel importante de João Malheiro no incidente.
Foi ele que, atendendo a chamada e decidindo-se a entrar em palco em plena actuação, acabou por desencadear o incidente. Na sua incansável ânsia de protagonismo, João Malheiro é um eterno desastre ambulante. Ele tornou-se numa demonstração evidente da democraticidade das páginas dos mexericos, que não estão apenas reservada à Lili Caneças e às outras tias. Também há espaço para os grunhos como ele: apreciem-no aqui em baixo a lambuzar-se num gesto que se pretende passar por um beijo na boca…

23 fevereiro 2012

A PRÚSSIA DE 1800

Se sobrepusermos as fronteiras que o Reino da Prússia possuía em 1800 (abaixo, em cor verde escura) ao mapa político actual da Europa, apercebemo-nos que a maioria do seu território se situava em terras que hoje são polacas. É verdade que, como já aqui se escreveu, em 1945 houve milhões de alemães que foram expulsos desses territórios. Mas não deixa de ser interessante especular, caso Napoleão I não tivesse amputado a Prússia dessas regiões polacas para constituir um Ducado de Varsóvia em 1807, como teria evoluído este outro Reino da Prússia cujas elites seriam ainda alemãs mas onde uma apreciável percentagem da sua população (estimada em cerca de 40%) teria sido de ascendência eslava, sobretudo polaca.

UM «BLOGUE» ALFARRABISTA?

Só hoje me surgiu, como uma espécie de revelação, quanto o Herdeiro de Aécio tem vindo a adoptar ao longo dos anos e em consequência do que aqui vou escrevendo uma estrutura que lembra a arrumação dos livros de um alfarrabista¹: há muitos temas variados, dispostos de uma forma aparentemente anárquica, a necessitar de tempo e paciência para se encontrar aquilo que possa interessar. Tanto quanto me apercebo, os frequentadores do blogue conferem com essa analogia: há uma maioria de visitantes que vêm em busca de algo preciso e raramente retornam; há os habituais que vêm cá sempre ver as novidades; e finalmente há os outros que vêm só de quando em vez, mas se perdem preguiçosamente em horas esquecidas a vasculhar metodicamente uma ou outra etiqueta aí do lado direito…

¹ No Brasil creio que se chamam sebos.

22 fevereiro 2012

AS MINIATURAS DOS CARROS DAS AVENTURAS DE MICHEL VAILLANT

Ainda a pretexto da alusão a Michel Vaillant por mim feita mais abaixo, houve um amigo que me informou que a Altaya começara a apresentar recentemente uma colecção de miniaturas dos carros das aventuras de Michel Vaillant.
Uma rápida pesquisa no Google permitiu-me ficar a saber que a referida colecção, novidade em Portugal, já aparecera há três anos em França e permitiu-me também apreciar – ainda que apenas comparando imagens – o rigor das miniaturas da colecção.
E, embora os detalhes deixem sempre algo a desejar, há miniaturas que darão para matarmos saudades: o Leader de O Fantasma das 24 Horas (1968), mais acima. Outras, porém, deixam muito a desejar, como o Vaillante Commando de Rally em Portugal (1969)...

GOOGLE

Mais uma vez, o cabeçalho do Google de hoje surpreende-nos pela sua inventividade e imaginação. Quer como motor de busca, quer pela sua apresentação estética, o Google é uma demonstração diária de como se pode conceber algo que é qualitativamente muito bom e que, ao mesmo tempo, tem todos por destinatários – como acontece com um Sistema Geral de Saúde ou de Educação, por exemplo. Contudo, não será por culpa dos autores do Google que a esmagadora maioria daqueles que o utilizam nem se apercebam da sua qualidade intrínseca. Muito menos, será por culpa deles que continuará a haver quem, perante exemplos destes, por miopia ideológica e/ou pedantismo social, continue a insistir que a qualidade daquilo que se usa está sempre dependente de haver ou não restrições ao seu acesso…

21 fevereiro 2012

O CARNAVAL E AS MELANCIAS

Embora a melancia não seja propriamente uma fruta de carnaval, assinale-se a coerência e a consistência dos dois deputados ditos verdes com a entrega de uma proposta na Assembleia da República para a consagração do carnaval como feriado obrigatório. Parece-me adequado a dois simpatizantes comunistas que foram seleccionados para andarem mascarados de militantes de uma pantomina de partido…

A IMPORTÂNCIA RELATIVA DAS PERIFERIAS EUROPEIAS

Quanto mais os noticiários internacionais se congratulam com o Acordo alcançado esta madrugada com a Grécia, mais me parece plausível aceitar o cenário que os moderados alemães triunfaram por ora, quando fizeram prevalecer internamente a posição de que o seu país não poderia carregar o fardo, diante da opinião pública europeia, de forçar a saída da Grécia do Euro. Para aqueles alemães, há que manobrar e saber esperar porque, muito provavelmente, a Grécia virá mesmo a ter que abandonar a Zona Euro no futuro… Mas isso só virá a acontecer depois da Grécia falhar estes novos compromissos que hoje assumiu e desaproveitar mais estas condições vantajosas – tão vantajosas que chegam a tornar-se injustas para portugueses e irlandeses… – que lhes estão a ser oferecidas. Para os alemães aquele desfecho será o lógico e o seu problema é que não haverá ainda um quórum mínimo que compartilhe a sua opinião e, para agir isoladamente, o poder real da Alemanha dentro da União também não pode ser tão sobrestimado como o tem sido ultimamente…
Outra razão que recomenda esta prudência alemã é a imprevisibilidade dos efeitos de contágio, nomeadamente à Irlanda e a Portugal, os dois países da mesma Zona Euro que também solicitaram operações de resgate. Muitas razões, sobretudo de índole financeira, têm visto a ser invocadas para separar o tratamento dos dois países e da Grécia. Porém, não tenho visto análises numa perspectiva predominantemente geoestratégica que ajudem a explicar porque a atitude alemã pode diferir no interesse dedicado aos três países da periferia da Europa. Historicamente e no que diz respeito à Grécia, a Alemanha tem tido azar com aquela extremidade sudeste da Europa e com os Balcãs anexos. Foi por ali que ela se engajou na Primeira Guerra Mundial, por causa de um incidente em que os seus interesses vitais nem sequer estavam a ser ameaçados. E teve que voltar a perder tempo ali na Grécia e na Jugoslávia durante a Primavera de 1941, um tempo que depois se veio a revelar tacticamente precioso para a (in)conclusão da invasão da União Soviética, a primordial Operação Barbarrossa.
Objectiva e historicamente, a Grécia ocupa o canto mais problemático da Europa que é vizinho… de outros problemas históricos. Observe-se no mapa acima como a Grécia (a vermelho) faz fronteira com a Turquia que, por sua vez, tem vizinhos como a Síria, o Iraque ou o Irão. Em contraste, tanto a Irlanda como Portugal localizam-se geograficamente nas bordas do continente, naquela região que Spykman designou por Rimland. E os países que se localizam no Rimland têm uma outra importância para potências que aspiram à hegemonia continental… Portugal e Irlanda terão excelentes governos que se estão a dedicar afincadamente às reformas estruturais... Mas parte desse prestígio e simpatia – nomeadamente dentro dos órgãos da União Europeia – dever-se-á também à sua posição geográfica (abaixo) que torna as simpatias de qualquer daqueles dois países passíveis de serem disputadas entre a potência hegemónica da Europa – a Alemanha – e outras potências hegemónicas que existem ou emergem noutros continentes – Estados Unidos, China, Brasil. Ou seja, algo que a Grécia não tem…

20 fevereiro 2012

SÍNDROME DE BRINON

Mesmo em França, já serão poucos os que reconhecerão o nome de Fernand de Brinon (1885-1947) que foi mais uma das várias estrelas da constelação do colaboracionismo dos anos que medeiam entre 1940 e 1944 (assinalado na fotografia acima). De origens aristocráticas e de simpatias pró-nazis, Brinon dedicou-se ao jornalismo e à política e veio a tornar-se, com a derrota francesa diante da Alemanha em Junho de 1940, uma das figuras de topo do regime de Vichy, como Delegado-Geral do Governo para as regiões da França que estavam ocupadas e eram administradas directamente pelos alemães.
A partir de 1944, Fernand de Brinon chegou a presidir ao simulacro de governo francês no exílio que os alemães criaram na Alemanha. Capturado no final da Guerra, Brinon foi submetido a julgamento. Foi durante esse julgamento que Brinon se chegou a ufanar que, através da sua intercessão, fora o francês que mais vidas salvara entre 1940 e 1944. Seria possivelmente verdade, mas Fernand de Brinon perdera-se e perdera a perspectiva, sem se aperceber como ele colaborara para a manutenção do próprio regime repressivo que lhe permitia depois considerar-se benemérito… Foi condenado à morte e executado em 1947.
Pergunto-me repetidamente se, nas actuais circunstâncias difíceis que Portugal atravessa, não se corre o risco de poder vir a descobrir que algum (ou alguns) dos nossos governantes, com a sua reputação completamente engajada na solução canónica que nos é imposta pela Alemanha, também não poderão vir a padecer no futuro da Síndrome de Brinon

O OLHO DO FOTÓGRAFO

Já aqui publiquei no blogue um par de fotografias do norte-americano Richard Avedon (1923-2004). Foi um excelente fotógrafo, sendo a sua especialidade a fotografia de famosos, mas poucas obras da sua autoria se revelarão tão interessantes quanto este seu auto-retrato acima, dominado pela assimetria dos seus olhos, como se fosse causada por uma doença profissional...

18 fevereiro 2012

OS PILOTOS ECLÉTICOS

Ainda no seguimento do poste anterior, e embora os pilotos de uma das especialidades não se costumem defender mal na outra, não tenho conhecimento, depois dos tempos heróicos do inicio do automobilismo, de condutores que se tivessem notabilizado simultaneamente tanto em provas de velocidade em pista como nas de resistência em estrada… com excepção de personagens de ficção como Michel Vaillant na BD (acima) ou então Jean-Louis Trintignant em Un homme et une femme (abaixo).

17 fevereiro 2012

DISTO JÁ NÃO HÁ MAIS – 3

As competições automobilísticas dividem-se em dois grandes grupos: as corridas de velocidade em circuito, reservadas normalmente a protótipos e as provas abertas de resistência em estrada (mais conhecidas por rallies), disputadas por viaturas de produção especialmente adaptadas. A fotografia acima, um instantâneo de uma prova disputada em Nurburgring em 1967, será uma das últimas a conseguir combinar o encanto das duas modalidades. A assistência, casualmente distribuída pelas bordas da estrada como num rally moderno assiste ao voo do Lotus 49 de Jim Clark, um protótipo de Fórmula 1 concebido para atingir os 250 km/h mas não para aguentar consecutivamente aqueles impactos na pista ondulante. Disto, já não há mais!

DISTO JÁ NÃO HÁ MAIS – 2

As primeiras hospedeiras de bordo terão aparecido ainda na década de 1930, mas foi só nas décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, com a expansão da aviação comercial, que ela se terá tornado numa das mais reputadas profissões femininas. Esta fotografia das hospedeiras acima (que creio pertencerem à Air France porque a sua autora é Janine Nièpce), consegue condensar o encanto e a sofisticação sedutora das hospedeiras naqueles anos mágicos da decada de 1960, algo que entretanto se perdeu com a massificação do transporte aéreo. Porque os passageiros se tornaram diferentes, porque as companhias aéreas são diferentes, disto, já não há mais…

16 fevereiro 2012

DISTO JÁ NÃO HÁ MAIS – 1


Não sei se as pessoas, quando assistem à milagrosa cena da fonte de vinho do filme O Pátio das Cantigas (acima), se dão conta que o remate da cena acaba por ser dado por António Silva que nela nem participa directamente¹: num fim de refeição, ele, que é afinal o verdadeiro lesado pelo milagre do vinho palheto que decorre no pátio, enreda-se por sua vez num cerimonial epicurista de auto-congratulação:
- Isto é que é um palheto de primeira ordem! Deste, já não há mais! (aqui, aos 7:00)

Acontece que a última frase (Deste - ou disto - já não há mais!), pronunciada com a veemência que é ali empregue por António Silva, será um excelente título para algumas fotografias que vou encontrando por aí e que, sendo características de épocas passadas, só se tornam compreensíveis pela lógica da época em que foram tiradas. Anuncia-se assim um punhado de fotografias de época numa série intitulada Disto Já Não Há Mais!

¹ Quem transpôs a cena para o vídeo de Youtube que usei também não se deu conta certamente da sua importância, pois cortou-a.

54 ANOS DE UMA FELICIDADE FRÁGIL

Neste trecho de um daqueles programas de televisão dados a efemérides levanta-se uma dúvida filosófica muito interessante: a felicidade conjugal será um valor só por si ou torna-se fundamental para a sua existência clarificar em que parâmetros ela assenta?

15 fevereiro 2012

«PÉTANQUE» POLÍTICA EM FRANÇA?

Apesar da sua origem meridional, a pétanque tornou-se um ócio nacional dos franceses. As regras do jogo seriam muito mais simples - o objectivo primário do jogo consiste em aproximar o mais possível a bola de metal que se arremessa de uma bolinha menor em madeira que se chama boliche (cochonnet em francês) – se o jogo não fosse tipicamente francês, sociedade onde uma sacanice, quando é bem feita, torna-se num gesto acolhido com todo o respeito. É assim que as estratégias da pétanque evoluíram para a especialização de jogadores que não estão preocupados em aproximar as bolas que lançam do cochonnet mas em acertar em cheio nas bolas mais bem colocadas do adversário para as afastar…
As regras para a formalização de uma candidatura presidencial em França são bizarras: é preciso obter 500 assinaturas de uma lista de 46.000 membros pertencentes aos mais variados órgãos políticos que inclui senadores, deputados e eurodeputados, membros de conselhos regionais, etc. As eleições presidenciais têm sido, por isso, bastante abertas: nas últimas (2007) houve 12 concorrentes e nas anteriores (2002) houvera 16! Daí o meu cepticismo quando leio que há pré-candidatos às próximas eleições presidenciais com projecção mediática – como o ex-1º ministro Dominique de Villepin ou a dirigente da FN, Marine Le Pen, cotada com 15 a 20% nas sondagensque estão com dificuldades em obter as tais 500 assinaturas.
Se as queixas reportadas forem sinceras e não manobras mediáticas para dar emoção e atrair a atenção, será caso para perguntar se não haverá por ali manobra de jogador de pétanque, daqueles que atiram às bolas alheias? Não deixará de ser intrigante que, no caso especialmente de Marine Le Pen, pertencente a uma formação que tem recolhido consistentemente 10% dos votos em eleições presidenciais e atendendo aos resultados das sondagens, não conseguisse ao menos arranjar 1% das assinaturas para promover a sua candidatura… Já se imaginou o que seria em Portugal se os comunistas se vissem impedidos de apresentar a sua candidatura? Para os democratas – os verdadeiros! – a democracia tem de ser para todos...

A fotografia inicial é de Janine Nièpce, o desenho de Albert Uderzo em A Volta à Gália e a fotografia final de Willy Ronis.

14 fevereiro 2012

COBERTURA «COMPLETA» ou HIPOCRISIAS POLITICAMENTE CORRECTAS

No princípio deste mês foi notícia um incidente em Gaia, quando um professor de 63 anos, que anteriormente expulsara uma aluna do 6º ano da aula, foi agredido à frente da escola em retaliação por três adultos que seriam alegados familiares da estudante. As agressões terão deixado o professor suficientemente maltratado para que ele viesse a receber tratamento hospitalar, tendo entretanto apresentado queixa na esquadra da PSP e permanecido em situação de baixa no domicilio. Este é tudo o que se fica a saber do incidente depois de ler todas as notícias da cobertura completa que está disponível no Google (confira-se na imagem abaixo).
Contudo, em lado algum se dedicam palavras adicionais à explicação das relações familiares da tal família cujos membros adultos parecem dedicar estes cuidados extremosos à protecção dos seus membros mais novos. É um tipo de redacção equívoca onde o leitor já se habituou a identificar a etnicidade das vedetas da notícia porque o jornalista se abstém ostensivamente de a mencionar. Porque quanto a discriminação, mais do que a das palavras (informativamente tão acautelada), não há nenhuma mais efectiva que aquela que é assumida pelos discriminados através de um seu comportamento social diferente, como bater nos professores...

A PASSADEIRA DE «ABBEY ROAD»


A história da fotografia acima começou num dia de Verão de Agosto de 1969 quando os quatro membros de Os Beatles se juntaram para uma sessão fotográfica para produzir uma fotografia em que apareceriam a caminhar simultaneamente sobre uma passadeira, que seria a capa do seu próximo disco, seguindo uma ideia de Paul McCartney.

Os Beatles mantinham-se então no auge da popularidade e, depois de chegarem, a multidão de admiradores passantes começou rapidamente a aumentar, incluindo esta senhora acima com o seu horroroso casaco lilás, cuja pose inquiridora junto aos seus ídolos valerá uma análise tão interessante quanto a fotografia inicial, a que é objecto deste poste.

O exercício dos Beatles nessa manhã consistia em atravessar a passadeira para um lado e para outro enquanto o fotógrafo Iain Macmillan, empoleirado numa escada tentava captar o momento apropriado. Repare-se como a ordem como eles aparecem nestas fotografias é sempre a mesma: John Lennon, Ringo Starr, Paul McCartney e George Harrison…

…ou como McCartney aparece em algumas delas calçado de sandálias e não descalço como acontece na versão definitiva. Macmillan acabou por tirar seis fotografias e a escolhida foi a quinta da série, quando apanhou os quatro no mesmo ritmo de passada desenhando uma sucessão de vês. A sessão tinha durado apenas cerca de um quarto de hora…

O álbum dos Beatles, intitulado precisamente Abbey Road foi editado nos finais de Setembro de 1969. A capa era simplesmente a fotografia sem qualquer outra identificação tanto da obra como dos autores - abaixo, a contracapa e o som do disco. Desde então, Abbey Road, especialmente a sua passadeira, tornou-se no local da mais famosa passadeira de peões do mundo!

É um destino turístico para quem visita Londres. Também se tornou um problema de circulação rodoviária. Houve 22 acidentes naquele local só nos últimos dez anos, envolvendo os turistas mais entusiasmados na recriação da cena e os automobilistas mais impacientes. Há uma ligação Webcam directa para o local! Vendo-a, percebe-se logo o porquê dos acidentes...

13 fevereiro 2012

O BAMBO E O EUROBAMBO

Wolfgang Münchau (acima, à direita) é um jornalista alemão que tem uma página sobre economia no Financial Times. Onde assina imensos disparates. Por exemplo, já previu o colapso iminente da eurozona num artigo que se intitulava The eurozone really has only days to avoid collapse, onde rematava profética e taxativamente que ela teria no máximo uns dez dias de duração (The eurozone has 10 days at most). Acontece que o artigo já foi escrito há dois meses e meio (27 de Novembro de 2011) e, certamente só para o chatear (ao Wolfgang) a eurozona ainda se mantem por aí… Agora tem outra teoria: seria melhor que Grécia e Portugal assumissem esplendorosamente a sua falência! E haja quem a noticie em Portugal! Isto não é apenas uma questão de capitais angolanos, é toda uma questão cultural da nossa ligação com África. Temos séculos de habituação aos esquemas dos professores Bambo (acima, à esquerda) e Karamba enquanto nos complexamos facilmente com as patranhas do Wolfgang e do Schulz

12 fevereiro 2012

FORAM GANHOS, FORAM PERDAS

Através deste antigo teledisco de Foram Cardos, Foram Prosas (1981) comprove-se o que foram ganhos e foram perdas. Ou seja, o que se teria ganho se Manuela Moura Guedes tivesse explorado esta sua boa vocação de intérprete musical e o que não se teria perdido a aturá-la como a jornalista medíocre em que se veio a tornar. Uma pena…

O TAMANHO DA COISAS…

Não restem dúvidas de como há ocasiões em que não há substituto para o gesto como reforço do discurso. Nestes dois instantâneos temos acima o famigerado senador norte-americano Joseph McCarthy a mostrar-nos algo avantajado que poderá ser o tamanho do comunista infiltrado que ele terá acabado de descobrir e temos abaixo o famigerado senador português António Bagão Félix, a descrever-nos uma coisa diminuta que poderia ser o montante – mil euritos – da pensão que ele recebe como político reformado