31 março 2018

A OFENSIVA DIPLOMÁTICA DO III REICH NA PRIMAVERA DE 1943

31 de Março de 1943. Adolf Hitler recebe o rei Bóris III da Bulgária (acima). Essa vai ser a primeira visita de um dos seus aliados europeus, na ofensiva diplomática que o III Reich irá desencadear na Primavera de há 75 anos, exibindo um bloco coeso de parceiros. Os ventos da Guerra mostravam-se agora potencialmente adversos para as armas alemãs e, para além de Bóris, ao longo do mês que se seguirá, Hitler ir-se-á encontrar com o duce Benito Mussolini de Itália (7 de Abril), com o conducator Ion Antonescu da Roménia (14 de Abril), com o regente Miklós Horthy da Hungria (16 de Abril), com monsenhor Jozef Tiso da Eslováquia (23 de Abril), com o poglavnik Ante Pavelić da Croácia (27 de Abril) e, finalmente, com o chefe do governo do Estado francês, Pierre Laval (29 de Abril). Os resultados podiam parecer ressonantes, se se acreditasse naquilo que as máquinas de propaganda então produziam (abaixo), mas a intuição geral da esmagadora maioria dos observadores apontava para que as vantagens iam agora todas para o lado dos Aliados.

LYNDON JOHNSON RENÚNCIA À REELEIÇÃO


31 de Março de 1968. Num discurso televisionado o presidente Lyndon B. Johnson surpreende os americanos ao anunciar que não se reapresentará ás futuras eleições presidenciais que virão a ter lugar em Novembro daquele ano. Embora hoje se admita que a ideia já estivesse a medrar desde há meses intimamente em Johnson, admite-se, também hoje, que a decisão terá sido a mais drástica consequência da conclusão da reunião dos sábios («wise men») da Casa Branca, a que me referi aqui há alguns dias

«(...) Com os filhos da América em campos tão distantes, com os desafios ao futuro da América cá entre nós e as esperanças mundiais na Paz a permanecerem todos os dias em agenda, não creio que deva dedicar um dia ou uma hora, sequer, do meu tempo a causas partidárias ou a quaisquer outros deveres, que não os exigentes deveres deste cargo que ocupo - a presidência deste vosso país.
Por consequência, não vou procurar, e não irei aceitar a nomeação do meu partido para (concorrer a) um outro mandato como vosso presidente.(...)»

No dia seguinte ao do discurso, o grau de aprovação do presidente subiu bruscamente dos 36 para os 49%. Milhares de especulações se fizeram desde então sobre o que teria sido a História dos Estados Unidos se Lyndon Johnson tivesse tomado decisão diferente. Por um lado é provável, pelo efeito de inércia, que tivesse ganho as primárias que teriam feito de si o natural candidato democrata às eleições. Mas, por outro, não é adquirido que as viesse a ganhar, por causa da controvérsia do problema vietnamita. Ainda nesse século, Jimmy Carter em 1980 e George H. Bush em 1992 tornar-se-ão presidentes derrotados quando da reeleição. Descontando as incontáveis especulações sobre aquilo que Lyndon Johnson teria decidido de diferente em relação a Richard Nixon, factualmente, o que se pode dizer é que a saúde do presidente teria afectado, quase de certeza, a forma como ele exerceria a presidência deste último mandato: Lyndon Johnson morreu de ataque cardíaco, quase exactamente quatro anos após ter abandonado a presidência, dois dias depois do final desse tal mandato virtual. Tinha apenas 64 anos.

30 março 2018

NOS: «NOT OTHERWISE SPECIFIED»

As primeiras notícias que, na semana passada, davam conta de uma rixa feroz num restaurante do Prior Velho estavam mal classificadas e induziam em erro (acima). O que o costume acabou por estabelecer é que, quando se noticiam cenas de violência como a descrita e não se refere a identidade dos envolvidos, é porque não é conveniente mencioná-lo, e isso aí é um indicador bastante que o episódio envolveu ciganos. Aquilo que em classificação científica costuma ser designado pela abreviatura NOS (not otherwise specified), nesse caso específico acaba por estar muito bem especificado: só que por omissão... O que não é dito, torna-se esclarecedor. Só que naquele caso de Loures não era verdade. Daí o equívoco inicial, quando a identidade dos intervenientes ainda não era mesmo conhecida. Aliás, depois dessa identificação, os jornalistas tiveram um outro à vontade para desenvolverem o assunto, identificando as facções em confronto e complementando-o já esta semana com informações disponibilizadas pelas Secretas (sic). As rivalidades entre clãs ciganos não interessa às Secretas.

29 março 2018

CONTAS DE MERCEEIRO, CONTAS DE JORNALISTA

Assim se conclui, pelo que poderá ser uma abordagem superficial da leitura de cabeçalhos, que uma prolongada estadia no espaço nos parece afectar muito mais como seres humanos do que o facto de termos tido uns longínquos avoengos de uma outra espécie.

O FRANCISCO LOUÇÃ DOS RUSSOS

De óculos, ao centro na fotografia acima, chamava-se Lev Bronstein e não era Doutor em Economia como o original. Mas era um intelectual também, que depois se veio a mostrar muito competente na esfera militar. Menos bem sucedido na esfera política.

JUAN CARLOS DE BORBON: CINQUENTA E SEIS ANOS DE «BOA IMPRENSA» (até 2012...)

29 de Março de 1956. Num acidente trágico com arma de fogo, morre Alfonso, o filho mais novo de Juan de Borbon, o pretendente ao trono espanhol, que então vivia exilado no Estoril. Uma daquelas notícias pertinentes por se tratar de quem se trata e que valeria a pena desenvolver informativamente como o faz o Diário de Lisboa do dia seguinte (abaixo). Mas, mais importante do que a notícia - que tem um amplo desenvolvimento nas páginas interiores - explica, é aquilo que a notícia não explica. Típico de um jornalismo controlado pela censura como então acontecia em Portugal, as explicações sobre o que acontecera esquecem-se de referir que fora o irmão mais velho, o príncipe Juan Carlos, que disparara o tiro fatal. A mesma mordaça, ou ainda pior, se verificava também na imprensa espanhola onde o acidente tivera, como se imagina, ainda mais repercussão. Aí, a versão oficial - falsa - era que o ferimento fatal fora auto-inflingido.
Aliás, pode-se constatar quanto o tema era delicado e a omissão deliberada, logo através da escolha da fotografia usada pelo Diário de Lisboa para ilustrar a notícia, uma demonstração de amor fraterno que é protagonizada pelo príncipe Juan Carlos (então com 18 anos) para com o seu irmão Alfonso (de 14). Mas, num processo que hoje está (felizmente) esquecido, as redes sociais de há 62 anos puseram a circular a verdadeira versão dos acontecimentos, com o peso adicional de que, porque fora abafado pela censura, se tratar de um segredo (o que tinha um outro valor informativo!). Conclusão: pelo menos em Portugal todos souberam que fora Juan Carlos a disparar o tiro fatal. A questão perpetuou-se e serviu para, durante anos, alimentar teorias da conspiração alimentadas pelos círculos republicanos. Muito mais eficazes se mostraram os outros círculos que protegeram a imagem mediática de Juan Carlos, como príncipe e depois como rei, nos cinquenta e tal anos que se seguiram.
Observada agora a uma distância de seis anos, é forçoso constatar a fragilidade da imagem pública de Juan Carlos, quando se percebe a facilidade como ela se desmoronou completamente na sequência de um acidente (por coincidência associado à caça e também a armas de fogo...) ocorrido durante uma caçada no Botswana, estava a Espanha em plena crise económica em 2012. Tantas vezes amparado desde a sua ascensão ao trono em 1975, sobretudo quando das suas hesitações por ocasião do 23F (1981), dessa vez, por detrás das prontas desculpas do rei, assistiu-se subitamente a uma exposição dos segredos da casa real, que terão tornado a sua permanência no cargo insustentável. Actualmente, a repescagem da intensa vida sentimental de Juan Carlos tornou-se um tema de cariz cómico: Juan Carlos “tinha um helicóptero” só para se encontrar com amantes ou então Juan Carlos encontrou-se com amante num barco, mas rainha chegou e amante foi atirada à água. Estranha reviravolta da protecção que lhe começaram a conceder desde há 62 anos.

28 março 2018

CHAMEM A... quem??

Quando é a própria polícia a estar envolvida no acidente, por quem é que se há de chamar? O apelo dos Trabalhadores do Comércio (abaixo) parece ultrapassado. Uma reflexão que me parece apropriada na sequência da notícia que os dois polícias que acompanhavam Carles Puigdemont foram, por sua vez, detidos.

QUEM CONTA UM CONTO...

Subtilmente, as façanhas da Cambridge Analytica estão a evoluir, conforme se pode comprovar pelos títulos acima. Da intervenção nas presidenciais norte-americanas para o impacto que as suas acções terão tido no desfecho do referendo do Brexit, aquilo que originalmente era uma influência, passou a ser considerada uma influência decisiva e já se estica o argumento até considerar que essa influência decisiva foi mesmo batoteira. Quem conta um conto... dá uma volta ao texto. Convém não misturar os temas. As batotas nas eleições são processos antigos, implicavam, naqueles bons velhos tempos e, quando as fraudes eram feitas com qualidade, encher as urnas com boletins preenchidos em nome de eleitores abstencionistas, um boletim por cada nome descarregado no caderno eleitoral. E quando se ia proceder ao escrutínio, os resultados reportavam os resultados desejados. Foi assim que aqui há 60 anos, nas eleições presidenciais portuguesas, o candidato Américo Thomaz venceu esmagadoramente o seu rival Humberto Delgado. Isso sim, foi uma eleição que se sabe ter sido batoteira. Com a adopção mais recente do voto electrónico, a prática continua a ser possível, mas os métodos passaram a ser outros. Agora envolve a pirataria informática e muito se falou do assunto por ocasião das eleições presidenciais norte americanas: falou-se muito - mas não se chegou a conclusão alguma. Mas aquilo de que se está acima a referir, a propósito da intervenção de organizações como a Cambridge Analytica, é completamente diferente.
Os votos que foram depositados e escrutinados em qualquer das eleições em que a organização interveio foram votos limpos (pelo menos até agora não houve alegações que não o foram). O processo como ela obteve a informação que lhe permitiu formatar a opinião dos eleitores pode ser (é) irregular, mas a formatação em si, não o é. Foi de livre vontade que o eleitores influenciados decidiram se votariam e como votariam e o seu voto é tão legítimo quanto o de todos os restantes eleitores. A eleição em si foi legítima, não existiu batota alguma. O que o desfecho daquelas eleições nos deve trazer como lição é como os processos de decisão democrática são afinal frágeis, ao contrário daquilo que estávamos habituados a considerar, sobretudo quando se referia a sociedades desenvolvidas do Ocidente. A fragilidade que assim se expôs é mais um ensinamento e uma responsabilidade para aqueles que, numa perspectiva cívica, acreditam que as decisões colectivas podem e devem ser influenciadas pela eficácia do esclarecimento público. É a Democracia, estúpido! Acredito que, para outros que já davam esse trabalho por adquirido, estes desfechos possam ser tão mais irritante quando há actos eleitorais que os poderes fácticos considerariam meros pró-forma, como os factos posteriores vieram comprovar que aconteceu nestas duas eleições de 2016. Mas este género de reacções acima, como que amuadas e a querer reverter o que já está feito, fazem-me lembrar os jogos de futebol da infância e os caprichos de alguns putos que queriam ganhar o jogo a todo o custo, apenas porque eram o dono da bola...

«REAVALIANDO» AS AVALIAÇÕES DA TROIKA

A 28 de Março de 2013 concluía-se a sétima avaliação da troika. Até mesmo os leigos se apercebiam do fracasso da execução do programa de controlo das contas públicas. Meses depois de tomar posse o governo apresentara um Documento de Execução Orçamental até 2015, onde se antecipava um défice rondando os 3% para 2012. Ora o número que então estava em vias de se apurar seria mais do dobro disso: 6,4%. Mas o fiasco na execução era apenas uma parte do problema. O resto - que não pouco - era o visível descontrolo sobre aquilo que estava a ser feito: como se pode ler na passagem sublinhada, tudo o que o governo estimara podia ser revisto abruptamente e isso até mesmo num par de semanas. Será difícil demonstrar mais incompetência, mas os quadros da troika, perante isto, mostravam-se de uma benevolência que os arrastava, por sua vez, para o mesmo descrédito. A quem interesse, diga-se que o número do défice que ficou para a história se cifrou em valores felizmente melhores do que o susto de há cinco anos: apenas 5,7%. Mas o que ainda tem interesse actual em toda esta história não são os protagonistas e a sua incompetência - Gaspar, Moedas e os membros empastados - em mais do que um sentido... - da troika - já que entretanto eles mudaram de ramo ou de paragens; quem continua por aí no activo são aqueles ditos jornalistas económicos, a quem também é preciso pedir responsabilidades pela forma como se conduziram naquela época. Recupere-se o exemplo de Helena Garrido que, naquele dia e naquelas circunstâncias, dedicava, no Jornal de Negócios (ainda não havia Observador...) o seu melhor talento ao problema premente de saber quem suportaria os custos da Cultura como bem económico...
Helena Garrido é apenas um exemplo. Há outros. E o jornalismo económico em Portugal, se alguma vez existiu, hoje parece ter desaparecido ao constatar-se esta duplicidade de critérios...

27 março 2018

A GENEROSIDADE DOS CAMARADAS

27 de Março de 1975. A edição do Diário de Lisboa prestava uma atenção especial a um negócio que se acabara de fechar com a União Soviética que passava pela venda àquele país de 500 toneladas de amêndoa e de 155 mil hectolitros de vinho. Com uma pequena chamada na primeira página, o assunto era depois desenvolvido no interior. Apesar de se tratar de uma exportação como tantas outras, a que só havia a destacar o exótico de ter como destino a União Soviética, em qualquer das duas notícias, contudo, não se perdia de vista o que era o essencial, enfatizar que a União Soviética ia pagar pelos dois produtos preços superiores aos que eram praticados nos mercados internacionais. Não se escrevendo explicitamente, subentendia-se obviamente que era um favor que os soviéticos nos estavam a fazer, porque quer(er)iam ajudar a revolução portuguesa. Se a sociedade portuguesa e a imprensa filiada continuar a ser tão ingénua quanto o era há 43 anos, pode-se especular se não será em retribuição a essa generosidade de outrora que agora o governo português (ainda?) não expulsou nenhum diplomata russo.

«DIGA BOM DIA COM MOKAMBO»


As opiniões de João Marques de Almeida são mais engraçadas quando lidas pela manhã, ao pequeno almoço.
Então se o assunto meter presidenciais, assunto sobre o qual ele é um humorista com provas dadas...

26 março 2018

A CONCLUSÃO DOS SÁBIOS («WISE MEN»)

(Também) 26 de Março de 1968. Com o encerramento de uma reunião de sábios que havia sido convocada pelo presidente norte-americano Lyndon Jonhson para o assessorar, assumia-se a conclusão que o envolvimento militar dos Estados Unidos no Vietname nunca se concluiria de uma forma satisfatória com os objectivos anteriormente traçados, e recomendava-se ao presidente que adoptasse as medidas que ele considerasse necessárias para que, a partir daí, se procedesse gradualmente ao progressivo desengajamento no conflito. A conclusão e recomendação terá abalado profundamente o presidente. E ele há de haver um dia em que se virão a conhecer os bastidores da Casa Branca com Donald Trump.

OS PROBLEMAS POLÍTICOS DE INTERPRETAR CANÇÕES NUM «DIALECTO»...

26 de Março de 1968. Nem de propósito, se atendermos aos últimos desenvolvimentos noticiosos, que nos mostram por essa Europa fora os dirigentes nacionalistas catalães a serem detidos (Espanha, Alemanha, Reino Unido), vale a pena recuperar este mini escândalo de há cinquenta anos, quando o intérprete (e autor) da canção que iria representar a Espanha no próximo Eurofestival é substituído á última hora por uma outra intérprete, essa castelhana, depois de ter mostrado a intenção de interpretá-la em catalão. Para lá da capa acima, a história está depois explicada na página 8 da edição do Diário de Lisboa desse dia (abaixo). Registe-se porém que o idioma catalão é ali qualificado repetidamente como dialecto - eram as «malhas» que o franquismo (e a ignorância doméstica) teciam. E recorde-se que a nova intérprete, mesmo com uma canção emprestada à última da hora, virá a ganhar o certame dali por 11 dias. Mas de quase tudo isso já eu aqui havia falado. Dessa vez a Europa não parece ter ligado nenhuma às controvérsias internas da Espanha. E desta?...

25 março 2018

O DIA EM QUE O OBSERVADOR DESCOBRIU A UTILIDADE DA CRONOMETRAGEM POLÍTICA

Numa fotografia clássica do jornalismo politico (o seu autor é o fotojornalista Horst Faas) vemos um Richard Nixon a distribuir um distraído bacalhau a um admirador à sua direita enquanto simultaneamente consulta as horas. O instantâneo, colhido há cerca de cinquenta anos, expõe cruelmente aquilo que acaba por ser intuitivo se pensarmos no quotidiano dos políticos: o quanto todo aquele género de cerimónias são um aborrecimento para eles quando nelas têm de tomar parte e o quanto estarão ansiosos para se desenfiarem dali para fora. E isso é humano, não é ideológico e, mais do que tudo, percebe-se que é frequentíssimo acontecer. Hoje o Observador descobriu que a cronometragem em política podia ser um tema de reportagem (abaixo). Confesso que me ri, porque tem a sua piada imaginar que António Costa terá despendido o dobro ou o triplo ou o quádruplo do tempo a dar entrevistas sobre a limpeza da floresta do que a limpá-la efectivamente. Mas não estou à espera que o jornal seja objectivo e coerente na utilização do seu recém descoberto cronómetro... A cobertura das actuações de Assunção Cristas, por exemplo, vão ser certamente todas feitas sem olhar para o relógio. E isso retira toda a piada à piada.

UMA HISTÓRIA SIMPLES

A 25 de Março de 1943, às 7H07 locais, enquanto navegava à velocidade de doze nós a umas 80 milhas náuticas a sudeste de Aracaju (a capital do pequeno estado brasileiro do Sergipe), o pequeno cargueiro Industria (1.688 toneladas), de pavilhão sueco, foi torpedeado pelo submarino U-518 da Kriegsmarine. O navio, que vinha do porto norte-americano de Filadélfia e se destinava ao Rio de Janeiro, confiara nas suas pinturas laterais que o identificavam como neutral (abaixo) e não adoptara qualquer comportamento evasivo-defensivo quanto à ameaça submarina. O navio afundou-se em oito minutos e os escaleres de salvamento embarcaram ou recolheram depois 25 dos 26 homens que compunha a tripulação.
No diário de bordo do U-518 constará que, por não estarem iluminadas as pinturas laterais de identificação, o submarino não identificara a tempo a nacionalidade do navio antes de o afundar. O comportamento posterior da sua tripulação desmentirá a versão: o submarino emergiu junto aos 25 náufragos, inteirou-se se havia feridos ou se eles precisariam de água, mas aprisionou os três oficiais mais graduados da tripulação. Meia hora depois submergiu e afastou-se com os prisioneiros. Depois de passarem o dia inteiro no mar, os 22 tripulantes - o tripulante em falta nunca mais foi visto - foram recolhidos nessa noite, por volta das 23H00, pelo navio suíço(!) St. Cergue que os desembarcou posteriormente em Salvador na Baía.
Quanto aos três oficiais aprisionados, capitão, imediato e maquinista, esses tiveram que esperar mais de um mês até que o U-518 tivesse regressado à sua base francesa de Lorient a 27 de Abril. Depois de umas desculpas formais e pouco sentidas, foram libertados e regressaram à Suécia. Com o Industria, e apenas nesse primeiro trimestre de 1943, já se ia no quarto navio sueco que era afundado pelos U-Boot da Kriegsmarine. O U-164 afundara um logo em 1 de Janeiro, o U-358 outro a 22 de Janeiro, o U-530 um terceiro a 9 de Março e agora o U-518 há precisamente 75 anos. Todos esses acidentes tiveram lugar em pleno Atlântico. Eram distracções a mais para com a frota mercante de um país reconhecidamente neutral e que se podem explicar sobretudo pela posição geográfica e estratégica incómoda que a Suécia ocupa, estando então totalmente cercada numa Europa dominada pela Alemanha. Ao contrário de Portugal, a Suécia tinha que engolir e calar, não estava em condições de retaliar às contínuas provocações alemãs, cedendo aos seus inimigos amplas facilidades logísticas em bases aéreas nos arquipélagos situados no meio do Atlântico.

24 março 2018

A METAMORFOSE DA «COMMONWEALTH»

Estamos a 17 de Março de 1961, em Londres, a cerimónia é de gala porque se trata do encerramento da conferência de primeiros ministros, e esta fotografia assinala o início do que será a metamorfose da imagem da Commonwealth britânica. A fotografia em que a monarca Isabel II aparece, ao centro, rodeada dos chefes de governo dos países que outrora haviam composto o Império, parece ser uma composição cada vez mais heterogénea, quando comparada com as fotos de cerimónias precedentes, uma heterogeneidade que, tanto como as aparências, se substancia também pelos percursos e pelos anseios díspares de quem rodeia a monarca. A Commonwealth mostrava que não podia ser o desejado prolongamento do Império Britânico desejado por Londres. A Irlanda já saíra, a África do Sul preparava-se para o fazer, a instituição manifestava-se impotente para gerir a animosidade indo-paquistanesa. Há 57 anos e da esquerda para a direita, identificam-se Kwame Nkrumah pelo Gana, John Diefenbaker pelo Canadá, Hendrik Verwoerd pela África do Sul, Jawaharlal Nehru pela Índia, Ayub Khan pelo Paquistão, a Rainha, Roy Welensky pela Rodésia (que hoje são a Zâmbia e o Zimbabwe), Sirimavo Bandaranaike pelo Sri Lanka, Harold Macmillan que foi o anfitrião britânico, Robert Menzies pela Austrália e o arcebispo Makarios III por Chipre. Ausentes da foto, mas presentes na conferência, haviam estado ainda os dirigentes da Malásia, Nova Zelândia e Nigéria. Abaixo, pode comparar-se o que fora a tradição daquelas conferências (a de 1926, acima, ainda com Jorge V, o avô de Isabel II) e aquilo em que se iriam transformar (a de 1983, abaixo).

«A GERAÇÃO MAIS BEM PREPARADA DE SEMPRE»

Se a actual costuma ser considerada como «a geração mais bem preparada de sempre», nem dá para imaginar como será a que, daqui por uns anos, lhe irá suceder: acabo de chegar da FNAC, onde estava a decorrer uma concorridíssima sessão de autógrafos com o «cientista» (estas aspas não são minhas, constam do original) D4RKFRAME que acabou de publicar Experiências loucas e factos bizarros.

23 março 2018

CATERPILLAR, PAI E FILHO

...era para ter sido publicado no princípio desta semana, no Dia do Pai, mas ainda vai a tempo.

O CENTENÁRIO DO «PARIS GESCHÜTZ»

23 de Março de 1918. Cerca das 7H20 da manhã, a cidade de Paris é atingida por um primeiro disparo, seguido de outros de que não se consegue identificar a proveniência. Como se percebe pelo encadeado de comunicados oficiais publicados acima, primeiro pensou-se que se trataria de bombas que eram lançadas de aviões a altitudes extremas, só de tarde, já os disparos haviam cessado por volta das 15H00, é que se conseguiu atribuir conclusivamente a sua origem a um canhão de longo alcance, estacionado na discreta comuna de Crépy, situada para lá das linha alemãs, a uns 130 km de Paris. A nova arma é um aprimoramento do que já existia, um canhão naval de 380 mm recalibrado para 210 mm com o cano prolongado até aos 34 metros. O conjunto de adaptações tornava possível que um projéctil de 106 kgs percorresse, em cerca de três minutos, uma trajectória de 130 km em que chegava a alcançar mais de 40 km de altitude. Porém, a precisão era mínima, assim como o era o seu poder destrutivo, limitado a uns 7 kg de TNT. A arma valia pelo seu impacto psicológico junto das populações civis, não por qualquer valor militar directo nas frentes de batalha, como acontecia, por exemplo, com a introdução contemporânea dos carros de combate (tanques). Rebaptizado (mal) de Grande Berta pela opinião pública parisiense, o Canhão de Paris terá estado na origem de várias manifestações de mau estar social ao fim de três anos e meio de guerra, rapidamente abafadas pelas autoridade. No total, entre a data de hoje de há cem anos e os princípios de Agosto de 1918, virão a ser disparados entre 320 e 360 tiros nestas condições sobre Paris. O total de vítimas cifrar-se-á nos 250 mortos e 620 feridos. Apesar de mínimas, estas baixas humanas tornavam os parisienses muito mais sensíveis à guerra do que os seus homólogos berlinenses que chegariam ao fim dela sem serem submetidos a provações equivalentes. Talvez essa falta de contacto com a frente de batalha explique porque milhões de alemães, entre os quais os berlinenses, estariam no futuro propensos a acreditar que a derrota no conflito fora uma questão de traição, conforme argumentarão Adolf Hitler e os nazis.
Em paralelo, nesta mesma data, os Aliados decidiram-se a requisitar todos os navios holandeses que estavam internados nos seus portos. Os Países Baixos até eram um país neutral mas as fortes perdas de navios mercantes que continuavam a ser provocadas pela guerra submarina dos alemães, faziam com que os beligerantes se dispensassem de cortesias mesmo para com terceiros. Recorde-se que fora por adoptar uma atitude semelhante para com os navios alemães e austríacos nos portos portugueses que, dois anos antes, Portugal se vira arrastado para a Primeira Guerra Mundial.

22 março 2018

O MOVIMENTO do 22 de MARÇO

22 de Março de 1968. Mais do que acontecerá com este blogue, há um vento nostálgico que parece varrer uma data de sites franceses na evocação deste acontecimento de há cinquenta anos, que é considerado o detonador do que veio a acontecer posteriormente em Maio daquele ano em França, sobretudo em Paris. Se o despojarmos de misticismos, aquilo que aconteceu foi a ocupação das instalações administrativas da universidade de Nanterre, a que se seguiu a publicação de um manifesto por parte dos ocupantes a que se deu o título de Manifesto dos 142 (o número de estudantes envolvidos, depreende-se, e vale a pena lê-lo, já que o texto foi aprovado por esmagadora maioria, com apenas 2 votos contra e 3 abstenções). O episódio foi também a revelação de Daniel Cohn-Bendit, que virá a ser um dos três líderes mais conhecidos (com Alain Geismar e Jacques Sauvageot) da revolta estudantil. Mas não valerá a pena desenvolver por agora muito mais o tema, já que isso me privaria de tópicos de um assunto ao qual conto regressar daqui a dois meses, noutras evocações sobre os momentos mais quentes dos acontecimentos de Maio de 1968.
Mas dá para perceber por estas fotografias já dessa altura, que a referência ao Movimento constituído nessa data perdurava simbolicamente. Era uma designação literalmente brandida pelos cartazes, mas que todos os estudos ulteriores têm uma enorme dificuldade em definir do ponto de vista ideológico em que é que consistia o seu azimute: entre os 142 encontraram-se comunistas das mais sortidas orientações (ortodoxos, heterodoxos, trotskistas, maoistas,...), anarquistas e até mesmo prosaicos reformistas, que a dinâmica da proclamação, da agenda reivindicativa facilmente engajou. Ao ouvir o veterano dos acontecimentos do vídeo abaixo, que até lá estava, constatamos que ele se lembra bem do que se propôs, não se lembra de quem o propôs e não se refere o quanto foi discutido o porquê das propostas terem sido aquelas (e não outras). E contudo, o expediente pegou de estaca: quando os membros de um movimento contestatário nada têm em comum a não ser a dinâmica da contestação, baptiza-se a coisa com uma data para que não haja engajamentos doutrinários que provoquem desagrados: ainda há alguns anos apareceu por cá o Movimento 12 de Março.

E, apesar dos cinquenta anos entretanto transcorridos, 22 de Março é uma boa data evocativa para fazer greve em França...

21 março 2018

O VASCO... É UM GÉNIO

Já se sabia o quanto Vasco Pulido Valente era considerado um sobredotado, nomeadamente como prosador e historiador, áreas de letras. O que não se sabia era o quanto ele também era dotado para a área das ciências, como pneumologista e cirurgião torácico, uma sumidade tal que até já emprestou o seu nome a um hospital...

A sério, isto de mudar de nome (Vasco Pulido Valente chama-se no bilhete de identidade Vasco Correia Guedes) às vezes dá borlas destas...

O CENTENÁRIO DO INÍCIO DA KAISERSCHLACHT

21 de Março de 1918. Tem inicio a primeira grande Operação (Michael) de um conjunto de ofensivas concebidas pelo Alto Comando Alemão para a Primavera de 1918, forçando uma decisão militar na Frente Ocidental antes de que a superioridade industrial e de recursos humanos dos Estados Unidos decidisse o desfecho da Grande Guerra. A esse conjunto de ofensivas preemptivas e decisivas os alemães deram o nome Kaiserschlacht (A Batalha do Kaiser). Em 1978 o historiador britânico Martin Middlebrook escreveu o livro acima sobre o primeiro dia da Operação Michael (a versão exibida é uma reedição de 2007). Vale a pena transcrever um trecho da análise desse primeiro dia a que o autor se dedica no seu 13º capítulo (p.308 da edição de que disponho):

«O primeiro dia da Kaiserschlacht terminara. Pelo número de efectivos envolvidos e pelo total de baixas sofridas, tornara-se no dia de mais intensos combates na Frente Ocidental até então e esse recorde perduraria até ao fim do conflito. A escala dos combates daquele dia só virá a ser superada em 10 de Maio de 1940, quando os alemães atacarão simultaneamente França, Bélgica e Holanda. Mas a importância deste dia para a História Militar não se fica apenas pelos números de homens envolvidos e de baixas sofridas, por muito importantes que eles sejam. 21 de Março de 1918 é o dia do princípio do fim da Primeira Guerra Mundial. Quando as tropas de assalto alemãs atravessaram as massacradas trincheiras britânicas alguns minutos antes das 10H00 da manhã daquele dia, elas desencadearam uma cadeia de acontecimentos que iria conduzir ao término do conflito. Esses acontecimentos não estão abrangidos pelo âmbito deste livro, mas os resultados desse primeiro dia de combates e a forma como esses combates foram conduzidos têm uma importância suficiente para merecerem um estudo mais aprofundado. (...)
A primeira tarefa, a mais fácil, é a de apresentar os resultados mais evidentes do dia de combates. À meia-noite, os alemães haviam conquistado 255 km² de um território que fora até aí defendido pelo III e V Exércitos britânicos - 49 km² pelo III Exército e os restantes 206 km² pelo V. Neste território perdido estavam as ruinas de 46 aldeias francesas. Não se pretende sugerir que a batalha se cingiu à conquista ou à perda de terreno e de aldeias arruinadas, mas esse era o padrão pelo qual tanto generais, quanto civis, as seguiam naquela época, olhando para mapas em busca de modificações do traçado das frentes.
Os sucessos alemães em 21 de Março de 1918 ridicularizaram tudo o que fora alcançado previamente pelos Aliados, ocasiões quando, para efeitos de propaganda interna, a captura de umas trincheiras, mais uns hectares de terreno juncado de crateras e ainda um par de destroços de aldeias a juncá-los haviam sido apresentados como grandes vitórias ofensivas, justificativas dos milhares de baixas sofridas para os alcançar. A batalha que começara naquele dia virá a ser depois conhecida, ainda que de forma oficiosa, como a Segunda Batalha do Somme, e é a comparação com o que fora alcançado durante a Primeira Batalha desse mesmo nome que nos pode dar uma dimensão mais impressiva do feito dos alemães nesse dia solitário de 1918. No Somme em 1916, os exércitos britânicos e franceses haviam conquistado 254 km² de território e 46 aldeias ao fim de 140 dias de combates árduos que lhes haviam custado mais de meio milhão de baixas. Ora esse era precisamente o resultado que os exércitos alemães haviam agora alcançado em apenas 1 dia de combate! Para mais, em 21 de Março à noite os britânicos estavam ainda em processo de retirar voluntariamente as suas unidades mais expostas, concedendo ao inimigo uns adicionais 104 km² e 11 outras aldeias. A nova configuração da linha da frente nos mapas evidenciará modificações gigantescas pelos padrões conservadores que a guerra forjara até aí, o que se tornou numa fonte de enorme embaraço para os líderes britânicos, tanto políticos, quanto militares, uma fonte de tensões entre esse dois grupos, e também entre os britânicos e os seus aliados, particularmente os franceses a quem pertenciam os territórios em disputa e que apreciaram de modo muito crítico a extensão da cedência territorial dos britânicos. Os seus oficiais de ligação colocados em unidades francesas foram objecto de variadíssimas manifestações de antipatia nos dias que se seguiram.
Mas o aspecto principal desta batalha foi realmente o humano - não apenas as baixas mas o efeito que ela teve na moral e na vontade de combater daqueles que dela saíram incólumes. A frente Ocidental tornara-se um daqueles campos de batalha onde, a partir de 1916, se procurava sobretudo desgastar o inimigo, e o objectivo manifesto dos alemães nesta Primavera de 1918 era destruir o Corpo Expedicionário Britânico (BEF). Anteriormente, já aqui se explicou que, no que concerne aos recursos humanos e materiais, a Alemanha não podia esperar vir a vencer a guerra se ela se arrastasse por tempo suficiente até que os Estados Unidos conseguissem mobilizá-los todos. A Alemanha tinha que romper a coligação adversa antes que isso acontecesse e para isso tinham seleccionado os exércitos britânicos como o alvo mais vulnerável para desfecharem os ataques da Kaiserschlacht. (...)»

Lembro-me de ler pela primeira vez esta análise (aqui necessariamente truncada), e perceber através dela como, aqui em Portugal, se costuma comentar de forma distorcida - e ignorante - aquilo que veio a acontecer ao Corpo Expedicionário Português (CEP) em La Lys a 9 de Abril de 1918. Nesse dia, os alemães desencadearam a segunda Operação (Georgette) da Kaiserschlacht e as unidades da frente tornaram a colapsar diante da ofensiva - com o pormenor adicional (e importante para nós) que, dessa vez, havia unidades portuguesas envolvidas na hecatombe. Houve e ainda há opiniões internas que carregam as tintas da responsabilidade portuguesa pelo colapso desse dia e, para isso, socorrem-se das opiniões britânicas. É um disparate e, ainda por cima, de uma fundamentação que mostra ignorância. O alvo não foram especificamente as unidades portuguesas, o nosso peso na ordem de batalha dos Aliados era tão pequeno que do colapso das nossas unidades nunca se esperaria nenhum desfecho decisivo. Como se comprova acima e por fonte insuspeita, 19 dias antes de La Lys, os britânicos não haviam precisado das fraquezas lusas para que a suas unidades colapsassem fragorosamente diante das tropas de assalto inimigas. E quanto às recriminações britânicas, recorde-se o tratamento que os oficiais britânicos de ligação receberam dos franceses por ocasião de Michael, que a crítica deve ir, inteirinha, para os que, por cá, atribuem valor à opinião de quem está metido no mesmo sarilho e quer, mesmo assim, arrogar-se ares. Mas a diferença substantiva está no aspecto que é abordado no último parágrafo da transcrição acima: o da moral e da vontade de combater. E aí sim, os britânicos podem-nos olhar de cima porque, de algum modo, eles ainda foram buscar ânimo para prosseguir a Guerra até ao fim, enquanto os portugueses desapareceram depois de Abril de 1918. E isso constituiu um embaraço nacional. Mas não tem nada a ver com os aspectos técnicos porque saímos derrotados naquele dia, em La Lys.

20 março 2018

OS ÓSCARES DA ACADEMIA DE 1948


20 de Março de 1948. 20ª Cerimónia da atribuição dos Óscares. Com excepção de alguns maduros, já ninguém se lembra de quem foram os premiados. Esta é uma evocação para colocar na devida perspectiva a nova moda (tonta e provavelmente mentirosa na maioria das vezes), de se reclamar no dia seguinte ao desta cerimónia anual, que se passou a noite toda a pé a segui-la pela TV. Até conheço quem tenha feito o mesmo apenas para seguir o Grande Prémio de Fórmula 1 da Austrália, mas, para a esmagadora maioria de nós, descontando a frescura da confissão do gesto, aquilo não tem propriamente o impacto histórico da chegada do homem à Lua...

19 março 2018

EM SESSÃO CONTÍNUA E SEM INTERVALOS, COMO NO VELHO OLÍMPIA...

Quem pensava que alguma coisa acabara com a demissão de Feliciano Barreiras Duarte desengane-se que, já no dia seguinte, a exploração das complicações dentro do PSD são para se encadear, ao mesmo ritmo como outrora eram passados os filmes X no velhinho Cinema Olímpia (acima). Em sessão contínua, onde nem havia intervalos, entrava-se sempre a meio do filme. Ao ritmo a que se trava a luta interna do PSD também não parece haver compassos de espera, a pornografia é que é outra... Sei lá, assistir a figurões como Marco António Costa a invocar a ética é verdadeiro hardcore!
Adenda:
...e no dia seguinte, como era mais do que previsível, novo filme em exibição: "Deep Throat" (em homenagem à fonte que dizia aos dois jornalistas encarregados do Caso Watergate onde eles deviam ir investigar).  

A ALEGRIA EM ESTADO PURO

O que a infância contém é aquela capacidade impar de expressar um sentimento no seu estado mais puro. Esta fotografia mostra alegria refinada a 99,99% de pureza. O autor da foto foi Wayne Miller.

O INCIDENTE POLACO LITUANO

Para além da nacionalização dos petróleos mexicanos, por estes dias de há oitenta anos assistia-se ao que parecia ser mais outra grave crise na Europa, escassos dias depois da anexação da Áustria pela Alemanha. A disputa envolvia também dois países de dimensões bem distintas, a Polónia e a Lituânia, e também era o maior, a Polónia, a assumir uma postura agressiva, no caso a pretexto de um incidente de fronteira que causara a morte de um soldado polaco. Houvera dezenas de incidentes nos anos precedentes, um punhado com um desfecho infelizmente idêntico, a morte de um dos membros da segurança da fronteira de um dos seus lados, mas dessa vez, na Polónia orquestrara-se uma campanha de rádio e imprensa que mimetizava em mais do que um aspecto a pressão que quase simultaneamente em Berlim se exercera sobre Viena. Na verdade, as relações fronteiriças entre os dois países eram tensas. Desde o fim da Primeira Guerra Mundial que ambos reivindicavam a cidade de Vilnius e a região adjacente. Na altura, a Polónia ganhara a posse de Wilno (como a cidade era designada em polaco) muito à custa da sua superioridade militar, mas a questão mostrava-se muito longe de solucionada, já que os lituanos consideravam-na a capital natural do seu país. E para fazer valer o seu ponto de vista, usavam um bizarro instrumento de pressão diplomática, recusando-se a estabelecer relações diplomáticas com o seu poderoso vizinho polaco enquanto a questão de Vilnius não fosse legalmente resolvida. Parecia aparentemente pouco, mas o encadeamento dos acontecimentos mostra que era uma atitude que irritava profundamente os polacos, afectando-lhes a sua imagem internacional, uma imagem que os polacos precisavam cultivar para as suas políticas de alianças a Ocidente com a França e o Reino Unido, alianças essas contra os outros seus vizinhos mais poderosos, esses sim, inimigos históricos decisivos dos polacos: os alemães e os russos.
Esse receio não impedia, contudo, os polacos de copiar o estilo dos nazis, e é impossível não ver neste forcing da Polónia sobre a Lituânia, com a emissão de um ultimato a 17 de Março de 1938, como uma cópia do ultimato que, por sua vez, a Alemanha enviara à Áustria apenas seis dias antes e que culminara com a anexação da segunda. Será esse ambiente de déjà vu que poderá explicar em grande parte o amplo destaque noticioso que vemos a ser dado aos acontecimentos nestas edições sucessivas do Diário de Lisboa de 17, 18 e 19 de Março de 1938, apesar de se tratar de acontecimentos que decorriam quase do outro lado da Europa. Como se pode perceber pela leitura cronológica dos cabeçalhos das notícias, dia 19, cumprem-se hoje precisamente 80 anos, a Lituânia, que se vira diplomaticamente isolada, acabou por ceder às exigências polacas, nomeadamente na prosaica mas famigerada questão do reatamento das relações diplomáticas. O futuro virá a tornar os polacos numas vítimas da barbárie nazi alemã e da duplicidade soviética russa, mas a realidade daqueles dias mostrava uns polacos que se comportavam como uns sacanas para com os países mais fracos do que eles. O incidente polaco-lituano está hoje completamente esquecido, porque a narrativa adoptada depois da Segunda Guerra Mundial seguiu um outro percurso completamente retocado, exonerando os polacos de todos os pecados cometidos antes do conflito. Ora esta visita ao passado mostra que o assunto foi seguido em Portugal com bastante atenção e apreensão – e isso, apesar de, recorde-se, haver simultaneamente uma guerra civil a decorrer em Espanha. Em contrapartida e para acentuar o contraste do interesse relativo dos assuntos, e para acabarmos o assunto por onde o começámos, vale a pena ver no poste respectivo qual o espaço (exíguo) que o mesmo Diário de Lisboa dedicou à nacionalização dos petróleos mexicanos.

18 março 2018

A EXPROPRIAÇÃO DOS PETRÓLEOS MEXICANOS

18 de Março de 1938. Há oitenta anos, num discurso radiodifundido, o presidente Lázaro Cárdenas (1895-1970) anunciava a expropriação da indústria petrolífera no México, que fora até aí detida por empresas de capital maioritariamente norte americano (de que a maior era a Standard Oil de New Jersey) mas também capital anglo-holandês (uma sucursal da Shell). Nesses anos, quando as jazidas da Arábia Saudita apenas haviam acabado de ser descobertas, o México era o sexto produtor mundial de uma commodity onde os Estados Unidos detinham 60% da produção mundial. O que podia ter sido um episódio canónico, em que as forças do nacionalismo se enfrentavam contra o internacionalismo capitalista, acabou por não o ser. Não que as reacções das empresas expropriadas fossem distintas da hostilidade expectável: em conjunto, as multinacionais adoptaram um conjunto de medidas tendo por objectivo dificultar a actividade da nova empresa nacional de petróleos, a Pemex. Contudo, tanto o presidente Roosevelt, quanto britânicos e holandeses em menor destaque, tiverem que contemporizar, reconhecendo que, quanto maior a hostilidade demonstrada para com os mexicanos, mais os induziriam a aprofundar laços comerciais com alemães e italianos, manobra que se revelaria contraproducente numa época em que a tensão já aumentava na Europa (Hitler acabara de entrar em Viena). No quadro da grande disputa ideológica do século XX, este episódio é desconhecido porque se mostra imprestável para a propaganda dos dois lados. Porque houve razoabilidade das partes, esta derrota do capitalismo não foi uma vitória do comunismo. Dali por um pouco mais de vinte anos em Cuba, vai-se ver como é possível fazer-se diferente...

Adenda:
Se no México a notícia valia (naturalmente) o exclusivo da primeira página, em Portugal a questão valia o destaque que se pode apreciar numa página interior.

O «ESTRANHO SABOR» DE SE VOTAR EM LIBERDADE

Hoje realizam-se eleições presidenciais na Rússia. Não há dúvidas: a reeleição de Putin está garantida e por uma esmagadora maioria. Na Rússia quase todos adoram Vladimir Putin. Dá-se a coincidência que, há precisamente 28 anos, a 18 de Março de 1990, os alemães orientais foram às urnas. Por acaso, nem era coisa nova, eles até já haviam ido às urnas por dez vezes, ao longo dos quarenta anos de existência da República Democrática Alemã. A novidade é que por aquela vez eles podiam votar em liberdade. E por essa essa vez, imagine-se, o Partido Comunista local, que ganhara de forma inequívoca todas as eleições precedentes, recebeu apenas 16,5% dos votos, vencendo em apenas meia dúzia de círculos eleitorais (acima, a roxo). Um exemplo oportuno para nos recordar que nunca se deve confundir o voto com a liberdade de voto. O primeiro, sem mais nada, pode não passar de um artifício para legitimar uma ditadura.

«MA BELLE AMIE»


Este é um dos primeiros, senão mesmo o primeiro, vídeo-clip que me lembro de ter visto, estar-se-ia em 1970 e 1971. Se retive a melodia, assim como a parte das imagens em que a belle amie conduz um magnifico Ford Mustang original, nunca soube mais nada a respeito da canção pelos mais de 40 anos posteriores, até que um acaso fez com que a encontrasse como um hit daquela época no Youtube. Os autores e intérpretes eram uma banda holandesa chamada Tee Set - origem que se depreenderia facilmente pelo próprio cenário do vídeo-clip, caso eu então já tivesse conhecimentos e cultura suficientes para o interpretar.

17 março 2018

A HISTÓRIA INFELIZ DE UM ALDRABÃO CHAMADO FELICIANO

O desfecho da história de Feliciano Barreiras Duarte parece-me encerrado. A questão já não é o que vai acontecer a seguir, é quando é que isso vai acontecer. Mas a história não deixa de ter interesse, sobretudo pela identidade dos protagonistas. Eu suponho que seria natural que os cómicos do lado da área dos partidos da geringonça - um Galamba, um Daniel Oliveira, um Bernardino Soares - tivessem aproveitado a ocasião para um stand-up mediático sobre o assunto, que ele merece, o Feliciano é um cromo. Mas não. O protagonismo da festa, e aí estão do cabeçalhos do Observador nos últimos dias a comprová-lo, tem pertencido todo ao outro lado do espectro político, a começar pelos órfãos de Passos Coelho.
O que, à medida que a festa se prolonga e os amigos de Feliciano de dentro do PSD desenterram mais tópicos do seu passado, só tende a tornar o assunto mais ridículo. É que Feliciano Barreiras Duarte é um aldrabão que fez parte de não sei quantos governos do PSD, incluindo o de Pedro Passos Coelho, como muito bem se recorda nesta nota biográfica que o jornal i publicava em Novembro de 2013. E, como o jornal i hoje o faz (o Observador ainda não se publicava em 2013...), também os passistas (ou montenegristas, ou seja lá o que forem...) que agora municiam a denúncia do aldrabão, esquecem-se o quanto umas perguntas prosaicas os podem desarmar: só agora é que se deu por isso?... Nos quatro anos e meio de Passos Coelho o Feliciano comportava-se bem?

Tanto é o acinte posto em ser-se a oposição à oposição que a coisa acaba assemelhando-se à marcação de golos na própria baliza. Não chutem a bola demasiado para cima, que o vento sopra de frente...

16 março 2018

O RAPTO DE ALDO MORO

16 de Março de 1978. A notícia deste dia de há quarenta anos era o rapto de Aldo Moro, um político italiano de topo, dirigente democrata-cristão que já fora primeiro-ministro daquele país por cinco vezes entre 1963 e 1968 e entre 1974 e 1976. Os autores do rapto haviam sido os membros da organização terrorista brigadas vermelhas que, para o concretizarem, haviam assassinado a tiro todos os cinco membros da escolta policial de Moro. Sinal dos tempos, a reacção de ultraje mais visível dos italianos consubstanciava-se na... adesão a uma greve geral (abaixo). Aldo Moro viria a ser assassinado pelos seus raptores quase dois meses depois. O que se passou entretanto, durante o período em que Aldo Moro este cativo, ainda hoje é um tópico extremamente controverso.
Produto nacional bruto baixa em 1978. Colateralmente ao rapto e apenas porque o assunto partilha o cabeçalho da primeira página do jornal daquele dia: as espectativas do governo português eram para que a taxa de crescimento do Produto Nacional Bruto decrescesse em 1978, não que o próprio produto diminuísse. É isso que se percebe do texto, e hoje ainda aí estão os dados do crescimento económico desse ano de 1978 (6%) para o comprovar. A incompetência dos jornalistas, mormente quanto infiltrada pela cegueira política (aqui eram os comunistas a atacar o governo socialista), é um fenómeno velho de décadas.