30 novembro 2019

O ESCÂNDALO MALTÊS

Em Malta, rebentou o escândalo completo quando uma contribuição inusitada - um cão farejador de notas! - deu um impulso inesperado às investigações - que se arrastavam - sobre o assassinato de uma jornalista de investigação que havia tido lugar há mais de dois anos. O país é pequeno mas o escândalo é grande! O puxar dos fios desta nova meada levou o assunto para onde sempre suspeitou que estivera a origem: os próximos do primeiro ministro maltês. Mas o que adiciona um requinte de canalhice mafiosa a todo o escândalo está a ser a resistência do primeiro-ministro a fazer o que se esperaria de si. No mesmo dia e em diferentes jornais portugueses, tanto se anuncia a sua demissão, como não. Na última versão, ainda lá está. Numa época em que é a realidade cada vez mais a copiar a ficção, a farsa da demissão que já está escrita nas estrelas antes do visado saber que se vai demitir, reproduz flagrantes semelhanças com cenas de uma série política britânica, "The Thick of It" (veja-se o video abaixo), série que infelizmente nunca foi transmitida por cá. Uma infelicidade que é recíproca, porque os argumentistas da série também nunca pensaram em Portugal como fonte de inspiração para as suas personagens: a aparição de um político-animal-feroz inspirado em José Sócrates na intimidade poderia ter sido, nas últimas temporadas da série, um contraponto interessante ao bullying de Malcolm Tucker, que era o director de comunicação e homem de mão do primeiro-ministro naquela série, famoso pelo chorrilho de palavrões como se dirigia aos outros.

ASTÉRIX - A ZARAGATA (XV)

A HISTÓRIA DA GUERRA DO VIETNAME de MAX HASTINGS

Já não é o primeiro livro sobre a História moderna do Vietname que aqui recomendo. E também não é o primeiro livro sobre conflitos modernos escrito por Max Hastings que aqui destaco. Deve ser por andar a escrever sobre estes assuntos no Herdeiro de Aécio há alguns anos. O livro é recente, saiu há pouco mais de um ano (em Setembro de 2018) e enfatiza o facto de que quase toda a informação que esteve disponível do lado norte-vietnamita durante o conflito foi filtrada para benefício da propaganda, o que distorceu muitas das obras que se escreveram sobre o conflito até agora. É um ponto de vista de que acabei razoavelmente convencido.

29 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (XIV)

O DIA DA «LIBERTAÇÃO» DA ALBÂNIA

29 de Novembro de 1944. Foi a data escolhida pela Resistência albanesa para considerar o seu país definitivamente liberto da ocupação das tropas alemãs, data essa que posteriormente veio a ser comemorada como o Dia da Libertação (Dita e Çlirimit em albanês). Assemelhando-se em muitos aspectos aos outros movimentos de Resistência balcânicos, casos do jugoslavo ou do grego, também o albanês aparecia totalmente tutelado pelo partido comunista local. Alcançado o poder, os comunistas albaneses iriam construir um estado que se tornaria célebre por ser, simultaneamente, e durante os 45 anos que se seguiriam, o país mais isolado da Europa e também o mais pobre. E no entanto... Sempre me intrigou como a proclamada pureza ideológica - e que tanto encantou tantas luminárias da UDP durante os tempos do PREC, mas essa é toda uma outra história... - do regime albanês tivesse à sua frente uma pessoa com a aparência castiçamente jovial do seu grande líder Enver Hoxha (1908-1985). Ao contrário da forma tipicamente façanhuda como os dirigentes dos partidos comunistas aparecem fotografados, nestas fotografias: a de cima datada dessa época, onde podemos apreciar um Enver Hodxa que se distingue dos demais pela expressão, por não assumir uma pose marcial, por ter a túnica aberta, por ser o único a fumar; e na de baixo, de tanta descontracção no cerro do punho, até parece ser um marxista-leninista menos compenetrado. E era esta pessoa, que tomaríamos à primeira vista por um bacano, a face de um dos regimes comunistas mais herméticos e repressivos de sempre!

28 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (XIII)

Este é um momento crucial da trama: a guerra pxicológica mostra-se impotente contra Obélix! 

A PRIMEIRA DEPUTADA A SENTAR-SE EM WESTMINSTER

28 de Novembro de 1919. Ganhando uma eleição intercalar no círculo de Plymouth Sutton, Nancy Astor (1879-1964) torna-se na primeira mulher a tomar assento no Parlamento britânico. Convém esclarecer que Nancy Astor não foi a primeira mulher a ser eleita como deputada. Esse feito pertence a Constance Markievicz que fora eleita como nacionalista irlandesa por um círculo daquela ilha nas eleições que haviam sido realizadas em Dezembro do ano anterior. Só que, como aqui expliquei, os deputados nacionalistas do Sinn Fein que haviam sido eleitos naquela eleição não se reuniram em Londres, mas sim em Dublin, provocando uma crise política que prenunciou a secessão da Irlanda. Nancy Astor foi assim a primeira mulher que veio, de facto, a ocupar o seu lugar em Westminster depois de ter sido eleita. Refira-se que o deputado que ocupara o cargo até então havia sido o seu marido que, por força da morte do pai, fora obrigado a ocupar o lugar deste na Câmara dos Lordes. A eleição de Nancy Astor foi, assim e apesar do seu valor simbólico, um pouco obscurecida por essa condição de esposa do antecessor no cargo. Contudo, o mérito de ter mantido o lugar pelos 26 anos que se seguiram, até Julho de 1945, é inteiramente seu.

27 novembro 2019

AINDA A PROPÓSITO DO 25 de NOVEMBRO E O QUE ISSO POSSA TER COM AS PESSOAS QUE JÁ ERAM BENFIQUISTAS NA ALTURA EM QUE O BENFICA CONQUISTOU A SUA ÚLTIMA TAÇA DOS CAMPEÕES EUROPEUS

As comemorações do 25 de Novembro são sempre um incómodo para a Esquerda. Para a Esquerda não democrática porque foi derrotada, e não lhes apetece, compreensivelmente, falar do assunto. Mas também é um incómodo para uma parte da Esquerda democrática, porque há por lá quem costume passar essa ocasião a envidar os seus melhores esforços para se demarcar das manifestações revanchistas da Direita não democrática, atropelando nesses esforços a Direita democrática, que até foi sua aliada no processo que conduziu ao 25 de Novembro, e esquecendo-se da outra Esquerda, que foi o seu adversário e de todos os verdadeiros democratas nesse processo. Para esta temporada da controvérsia de 2019, alguém pôs a circular umas declarações de Ramalho Eanes proferidas em 2015 e do outro lado do Mundo (nas Filipinas), que se adequavam ao espírito que o governo e aquela que acredito seja a facção mais esquerdista do PS pretendiam dar à evocação da data:

«O 25 de Novembro foi um momento fracturante e eu entendo que não devemos comemorar; os momentos fracturantes não se comemoram, recordam-se e recordam-se apenas para reflectir sobre eles

Esta é a parte que interessava destacar e que, apesar de já ter quatro anos, milagrosamente se pôde ler em quase todos os órgãos de comunicação social nos artigos referentes ao tema. Menos interessante para o agendamento mediático era a continuação dessas antigas declarações de Eanes: «No caso do 25 de Novembro, devíamos reflectir porque é nós, portugueses, com séculos e séculos de história, com uma unidade nacional feita de uma cultura distintiva profunda, porque é que nós chegámos àquela situação, porque é que chegámos à beira da guerra civil.» Menos interessante ainda, e igualmente datado de Novembro de 2015, seria os jornalistas recuperarem uma reportagem do Expresso onde o mesmo Eanes foi citado em destaque dizendo: «Se perdêssemos, seria fuzilado». O que quer dizer que, mesmo quarenta anos transcorridos, Eanes continua convicto que não receberia dos vencidos do 25 de Novembro um tratamento tão magnânimo como aquele que lhes foi dispensado pelos vencedores. Afinal, mesmo sem celebrações, o que esteve em disputa não foi assim tão irrelevante quanto o que hoje se possa querer fazer pensar.
O que pode ser é inoportuno recordá-lo. E por mais de que um motivo. Uma das constatações mais interessantes é o do número e identidade das pessoas de destaque da nossa sociedade actual que hoje deduzimos estarem do lado dos vencedores do 25 de Novembro (i.e., do lado da Democracia parlamentar) mas que se descobre que, na altura dos factos, estiveram do lado dos vencidos. A começar, e apenas para exemplo, pela segunda pessoa da hierarquia do Estado, Eduardo Ferro Rodrigues, o presidente da Assembleia da República, que então militava numa organização interessantíssima de extrema esquerda denominada MES, que achava que «A Democracia burguesa não tem (tinha) viabilidade em Portugal». Haverá centenas de outras pessoas cujo percurso político subsequente os fez viajar de concepções autocráticas da sociedade para outras mais democráticas. Uns são mais descarados no virar da casaca. Outros são mais compungidos na elaboração de formulas que compatibilizem o que pensaram e o que pensam, sem se auto-criticarem. Neste último caso, o esforço afigura-se-me meritório, mas baldado: no dia 25 de Novembro enfrentaram-se duas formas antagónicas de encarar a sociedade: uma era Democrática e a outra não era. E a tentativa de fazer uma ponte entre elas faz-me lembrar um certo tipo de benfiquistas que existiu há umas décadas atrás que, embora tendo idade para isso, só se haviam tornado benfiquistas depois da última conquista da Taça dos Campeões Europeus em 1962 (vídeo inicial). Sempre que se evocava essas duas finais gloriosas para o clube (1961 e 1962), notava-se que eles reagiam de uma forma mais mortiça do que os benfiquistas de sempre, que haviam acompanhado entusiasmados aquelas duas ocasiões. É também esse o problema destes Democratas (que eu acredito honestamente agora serem genuínos) do pós Novembro que, quando têm que lidar com a evocação desta data, não torceram pela equipa certa na altura certa. E isso deixa-os pouco confortáveis. Mas isso é um problema deles, não da maioria dos portugueses - de então e de hoje.

«CONCORDO...»

Onde, senão a rede social facebook para repescar este pedaço de lógica? O opinante até admite que, dos filmes do ano, apenas viu mais um (acha ele, não terá a certeza...), mas isso não o inibe de, desse universo alargado de dois filmes, concordar com a escolha de um deles para melhor filme do ano. Eu ter-me-ia ficado pelo regozijo de ter acertado nas minhas escolhas das poucas vezes que me dispusera a ir ao cinema. Mas não, ele, a partir dos dois filmes que viu, endossa veementemente a escolha alheia. É preciso ter um conceito elevado de si próprio, proporcionado ao da sua obtusidade! Na pré-história, antes das redes sociais, estas figuras patéticas eram pessoais e discretas e, se tínhamos o azar de as ouvir em directo, punhamo-nos a pensar interiormente o quão convencido e imbecil seria o autor de tal disparate. Hoje, temos a vantagem de as ler «urbi et orbi», como se se tratasse de uma benção do Papa. São demais para darmos conta de todas, mas há algumas, porque particularmente estúpidas (mas também por causa da petulância irritante dos autores), que merecem um ocasional destaque.

ASTÉRIX - A ZARAGATA (XII)

26 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (XI)

- «Sobretudo não devemos mostrar-lhes quantos somos!» - é uma frase que devia figurar nos anais das citações ao lado de outras semelhantes (como algumas de Sancho Pança), dando o exemplo de como as arengas mais entusiasmadas devem ser sempre temperadas por uma boa dose de realismo.

O INCIDENTE DE MAINILO

26 de Novembro de 1939. A artilharia soviética disparou contra a própria povoação russa de Mainilo, situada na fronteira russo-finlandesa, a uns 30 km a Norte de São Petersburgo (na época conhecida por Leninegrado). A intenção, como já acontecera com os japoneses na China em 1931 ou com a Alemanha em relação à Polónia há menos de três meses, era criar um falso incidente diplomático que a União Soviética viesse a invocar para justificar a intervenção militar (invasão) sobre a Finlândia que Moscovo pretenderia desencadear de seguida. Porque o assunto tinha uma ressonância de déjà vu e era grave, era tratado pelos jornais com o destaque e a gravidade que as imagens acima documentam, como se o incidente não tivesse grandes hipóteses de remissão e se se tratasse apenas dos preâmbulos de uma declaração de guerra da União Soviética à Finlândia. Os jornais não estavam enganados: a denominada Guerra de Inverno iria começar dali por quatro dias (30 de Novembro), com a invasão da Finlândia. Só que as coisas não iriam correr militarmente da mesma maneira que a Alemanha fizera na Polónia. Muita água iria correr debaixo das pontes até 1945 por aquelas paragens, mas, por estes dias de há oitenta anos, em termos de política internacional, a semelhança entre os métodos e estilos dos nazis alemães e dos comunistas russos era mais do óbvia...

25 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (X)

Há quem tenha visto neste episódio da tentativa de reconversão da legião romana para um armamento menos convencional, adoptando-se aos métodos de uma «guerra psicológica» (que era nitidamente mal compreendida pela tropas...), como uma alusão, ainda que rebuscada, à guerra da Argélia e à vertente político-militar assumida pelo exército francês nesse conflito. Na época em que A Zaragata foi inicialmente publicada, 1970, também em Portugal, por via dos três conflitos que travava em África, havia um certo deslumbramento com essa maneira moderna de travar os conflitos armados que incluía, para além das acções exclusivamente militares, as iniciativas para conquistar a simpatia das populações.

O FUNERAL DE GEORGES CLEMENCEAU

25 de Novembro de 1929. Tem lugar o funeral de Georges Clemenceau que falecera no dia anterior em Paris com 88 anos. De acordo com as suas próprias disposições, o funeral tem lugar em Mouchamps (uma aldeia da Vendeia) e decorre de uma forma despojada, «sem manifestações, nem convites, nem cerimónias» (p. 649 do livro abaixo). Além da família, só algumas centenas de locais compareceram. Não há relatos mais detalhados porque também a imprensa foi instada a não comparecer. Respeita-se esta convicção profunda de quem, até na morte, ou talvez sobretudo na morte, fez toda esta questão de prescindir de homenagens.

24 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (IX)

A REVOLUÇÃO DE VELUDO ACOMPANHADA POR UM JORNAL COMUNISTA PORTUGUÊS

24 de Novembro de 1989. Em Praga, falho de qualquer simpatia popular mas também do tradicional apoio de Moscovo, o presidium do partido comunista checoslovaco, que era encabeçado desde há 2 anos por Miloš Jakeš, demite-se. Está em curso na Checoslováquia aquela que virá a ser denominada por Revolução de Veludo (sametová revoluce). Mas isso são acontecimentos razoavelmente conhecidos. O que me parece interessante recordar, porque o é bastante menos, é a forma como esses acontecimentos era acompanhados pelos jornais comunistas de então. Na edição desse mesmo dia 24 de Novembro de 1989 o Diário de Lisboa ainda guardava para a primeira página a ameaça velada da intervenção dos militares checos: «Oficiais superiores do Exército checoslovaco fizeram sentir a sua voz, lançando um aviso ameaçador contra as manifestações favoráveis à liberalização do regime.» O espantoso é que o jornal, sempre tão pronto a condenar putschs militares por todo esse Mundo fora, neste caso nada dizia de condenatório a respeito da voz dos militares e desta maneira um pouco cardada demais de eles - os generais - quererem fazer ouvir a voz da classe operária... Mas a edição do dia seguinte do mesmo jornal (abaixo) fazia uma inflexão de 180º no que publicara, e aderia de forma entusiástica ao facto de haver «um moderado na liderança de Praga», um moderado que ontem ninguém fazia a mínima ideia quem era... e que iria durar cinco dias no cargo. Era a propriedade do poder pelos comunistas que estava em causa naquelas paragens por aqueles dias. E  porque por cá os seus camaradas ainda não o haviam compreendido, chegava a ser ridículo argumentar em prol destes vários regimes comunistas no Outono de 1989.

A EXTINÇÃO DA PIDE E A CRIAÇÃO DA DGS

24 de Novembro de 1969. Com a publicação do Decreto-Lei nº 49 401, procede-se à extinção da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado) e à criação da DGS (Direcção Geral de Segurança). Podia ter sido significativo mas não o foi. Um caso evidente em que se percebe que não se deve esperar que as modificações semânticas acabem por modificar a natureza das organizações.

23 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (VIII)

Os pássaros desta última tira são uma reedição do gag do mocho em «O Combate dos Chefes».
Hoje, a pretexto dos sessenta anos do "nascimento" de Astérix, vai ser realizada para France Culture a gravação de um espectáculo radiofónico com público baseado precisamente em «A Zaragata», a transmitir no próximo dia 22 de Dezembro.

«VAMOS PENDURAR A NOSSA ROUPA A SECAR NA LINHA SIEGFRIED»

Por uma associação de ideias, que me levou a ir a um daqueles estabelecimentos com máquinas de lavar e secar roupa, lembrei-me que em Novembro de 1939, o hit musical daquela época dos dois lados da Mancha era esta canção de encorajamento que, concebida em Inglaterra, fora rapidamente traduzida para benefício e regozijo conjunto com os aliados franceses. A canção tinha um título como só o clássico humor britânico pode conceber: «Vamos pendurar a nossa roupa a secar na Linha Siegfried», uma espécie de promessa de vitória que virá a ser cumprida, mas somente uns anos depois ao que os cantores de há oitenta anos poderiam estar à espera...

22 novembro 2019

ASTÉRIX - A ZARAGATA (VII)

A guerra pxicológica e o seu operacional especializado, o legionário Sabioprimus (Savancosinus, no original), são uma das consagrações desta aventura.

COMO SE EQUILIBRAVAM AS REFEIÇÕES HÁ CINQUENTA ANOS

Numa página interior de um jornal de há precisamente cinquenta anos, Maria de Lourdes Modesto, a referência da nossa culinária televisiva, propunha, em quatro ementas, aquilo que designava por sugestões para refeições equilibradas. Vale a pena lê-las. Reparei que, numa dessas ementas, o almoçinho dava excepcionalmente «sopa na sopa» porque era constituído robustamente por uma magnífica dobrada com feijão, depois rebatida com uma salada de frutas. Qualquer coisa de monstruoso pelos padrões da actualidade. Ah! Andei à procura, mas, para provável desgraça da saúde dos nossos antepassados, não havia qualquer ementa que metesse quinoa...

21 novembro 2019

OBITUÁRIOS DE UM SEGUNDO QUE SE TORNOU FAMOSO POR SER SEGUNDO E DE UM PRIMEIRO QUE SE TORNOU «FAMOSO» POR NÃO SER PRIMEIRO

Os obituários têm destas coisas. Há aqueles de pessoas que gostaríamos de ter sabido na ocasião que haviam falecido e nos escapam, como foi o caso do campeão francês de ciclismo Raymond Poulidor (acima, à direita), ídolo da modalidade nas décadas de 60 e 70, e que só hoje me apercebi que falecera no dia 13 deste mês. E depois há aqueles obituários em que tropeçamos, de pessoas que não fazemos a mínima ideia de quem foram ou, pior, até fazemos, como foi o caso de Luís de Barros, um antigo director do Diário de Notícias durante o período do PREC, quando aquele jornal ganhou a alcunha - a meu ver, merecida - de Pravda português, tal o escrupuloso alinhamento com as directivas emanadas do PCP (abaixo). Ao contrário de Raymond Poulidor, e talvez por um ser francês e outro português, Luís de Barros morreu ontem e ficou logo a saber-se disso. Mas pode estabelecer-se outro engraçado contraste entre os dois recém-falecidos: Raymond Poulidor foi um campeão de ciclismo que alcançou uma espécie de fama paralela por nunca ter ganho as grandes competições da modalidade - Poulidor foi «o eterno segundo»; Luís de Barros foi o director de uma publicação centenária (1864) que se tornou num jornal de facção sobre a sua direcção, durante o PREC, mas a quem ninguém responsabiliza por isso, porque tudo o que então aconteceu ao e no jornal costuma ser assacado ao seu adjunto, o muito mais mediático José Saramago - Barros foi um «primeiro que não estava lá a fazer nada».

ASTÉRIX - A ZARAGATA (VI)

20 novembro 2019

QUANDO SE DÁ TEMPO AO TEMPO DAS NOTÍCIAS, ELAS TORNAM-SE NOUTRAS NOTÍCIAS

Há quinze anos lembro-me das críticas endereçadas a Pedro Santana Lopes por causa da sua decisão de domiciliar meia dúzia de secretarias de Estado em outras tantas capitais de distrito. Agora é a vez de António Costa fazer o mesmo com outras três secretarias de Estado. Muito provavelmente também esta decisão irá ser criticada mas não estou à espera de qualquer coerência entre críticos e apoiantes, entre o que eles disseram naquela altura e o que opinam agora, tanto mais que quinze anos é muito tempo e ninguém já se lembra de quem é que disse o quê e porquê. Num outro contexto, nove anos também são muito tempo. Foram os anos que o ministério público sueco demorou a investigar preliminarmente se as acusações de violação e agressão, que permitiram acossar Julian Assange a refugiar-se numa embaixada, teriam condições de vingar em tribunal. Afinal, parece que não. Mas, da próxima vez que se falar - justificadamente! - da morosidade da justiça portuguesa, ponha-se os olhos nesta justiça sueca, que é bem pior que a nossa. Sim, porque em comparação com as nossas dúvidas em saber se o primeiro-ministro Sá Carneiro morreu num acidente ou num atentado, eles exibem a proeza de saberem que o primeiro-ministro Olof Palme morreu assassinado; mas o que não fazem a mínima ideia é a razão e, sobretudo, quem foi o autor.

ASTÉRIX - A ZARAGATA (V)

É muito engenhosa a maneira como a disposição de Obélix evolui e isso se reflecte nas flacteras, no tamanho da letra e no verde progressivamente mais suave.