30 novembro 2019

A HISTÓRIA DA GUERRA DO VIETNAME de MAX HASTINGS

Já não é o primeiro livro sobre a História moderna do Vietname que aqui recomendo. E também não é o primeiro livro sobre conflitos modernos escrito por Max Hastings que aqui destaco. Deve ser por andar a escrever sobre estes assuntos no Herdeiro de Aécio há alguns anos. O livro é recente, saiu há pouco mais de um ano (em Setembro de 2018) e enfatiza o facto de que quase toda a informação que esteve disponível do lado norte-vietnamita durante o conflito foi filtrada para benefício da propaganda, o que distorceu muitas das obras que se escreveram sobre o conflito até agora. É um ponto de vista de que acabei razoavelmente convencido.

7 comentários:

  1. Hm... OK... Mas isso da pratica da filtragem da informacao para efeitos propagandisticos nao e quase uma verdade universal de todos os conflitos armados? E assim sendo, todas as obras historicas acerca de conflitos sao relatos distorcidos. Nao percebo bem qual e o valor acrescentado que o ponto de vista traz a analise.

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  2. Bom, digamos que filtragem haverá sempre, agora a dose da filtragem é que não se pode comparar entre sociedades totalitárias e outras que o não são. Para lhe dar um exemplo concreto, e mesmo que eu admita que não conheça quase nada sobre o conflito, durante a Guerra do Vietname era conhecida a rivalidade entre o presidente (Nguyen Van Thieu) e o vice-presidente (Nguyen Cao Ky) do Vietname do Sul enquanto que, no Vietname do Norte, a relação entre Le Duan (secretário-geral do PC) e Pham Van Dong (o primeiro-ministro) era uma completa incógnita.

    Outro exemplo, os norte-vietnamitas estavam a violar descaradamente a neutralidade laociana com a sua Trilha Ho Chi Minh e, no entanto, não havia qualquer hipótese dos jornalistas lá chegarem e mostrarem essa Trilha ilegal por onde os norte-vietnamitas reabasteciam as suas tropas no Vietname do Sul.

    Ainda outro exemplo, só muitos anos depois da Guerra é que foram conhecidas as opiniões críticas em Hanói ao desencadear da Ofensiva do Tet, incluindo a de Vo Nguyen Giap, o vencedor de Dien Bien Phu.

    Ora, ao contrário da opacidade dos comunistas, a divergência de opiniões em Washington e em Saigão, e entre Washington e Saigão, eram assuntos discutidos pela comunicação social.

    No quadro concreto daquele conflito, não faz qualquer sentido relativizar os conceitos de filtragem, e tentar comparar uns com os outros. Quem ler as fontes oficiais norte-vietnamitas, os combatentes partiam sempre felizes para a guerra!

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  3. Caro A. Teixeira,
    Os exemplos que aponta sao informacao que so foi tornada conhecida muito depois do conflito termiinado, os intervenientes mortos ou ja sem influencia politica. Mas isso tambem sucedeu no "outro lado", muita da informacao agora disponivel sobre os processos de decisao no governo Americano so se tornaram conhecidos muitos anos depois e com contextualizada em camadas de campanhas de relacoes publicas...
    E o mesmo se passou com o conflito colonial portugues.
    Outro ponto que suscita, a capacidade de filtragem das partes em conflito devido as caracteristicas dos regimes politicos tem fundamento, mas isso apenas demonstra capacidade de e nao vontade de. Porque ha um outro fenomeno que tambem sucede , e que as sociedades democraticas, devido as limitacoes que o poder tem nessas sociedade de controlar a informacao que sai ca para for a desenvolveu industrias de relacoes publicas sofisticadissimas, ja o eram a altura do Vietname, e os EUA usaram relacoes publicas a exaustao para aguentar a opiniao publica.
    E nao esquecer tambem que quem esta agora a consultar estas fontes de informacao e a escrever a historia dos conflitos sao predominantement historiadores nascidos, criados e educados num dos lados da barricada.

    Os comunistas usaram metodos de propaganda muito mais toscos e primitivos? De mais nao precisaram!

    Os meus pontos sao: parece-me que os pontos levantados pelo A.Teiceira e autor do livro sao indubitavelmente verdadeiros. Mas de tao universais, ubiquos e conhecidos que sao a mim afiguram-se como lugares-comuns, quase senso comum para qualquer historiador minimamente competente atrevo-me a dizer eu, que nao sou historiador mas mero curioso. E por outro lado ignoram muitos outros fenomenos que tambem ocorrem em paralelo que tambem distorcem de forma substantive a compreensao do conflito.
    Nao estou a relativizar o fenomeno da distorcao. Apenas a expressar alguma perplexidade com o valor dado a esta forma particular de distorcao.
    Gostaria de ver alguma quantificacao (um "distorcometro" permita-me o neologismo) da sua influencia antes de comecar a gritar "Eureka!".

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  4. PS:
    Nunca cheguei a ler nenhum dos livros que me recomendou ha muito tempo mas os exemplos que cita sao todos mencionados no excelente documentario do Ken Burns - Vietnam disponivel na Netflix permita-me a publicidade.

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  5. Parece-me que está a baralhar conceitos, mas sugiro-lhe que leia alguns dos livros que outrora lhe recomendei.

    Quanto à série televisiva que refere - que vi e gostei - é isso mesmo: uma série documental e não um livro. As primeiras não substituem os segundos. Têm muito mais kilobytes de imagens, mas têm infinitamente menos kilobytes de hard data. E raras são as séries televisivas que convidam à reflexão a quem as vê.

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    1. 1) As minhas desculpas pelo comentario de ontem que esta confuse e mal redigido mas estava a tentar fazer "multi-tasking" e ja nao tenho cabeca para isso...

      2) A minha pergunta central era esta: o autor quantifica ou qualifica em relacao a outras formas de distorcao do relato historico a filtragem de informacao por parte do regime norte-vietnamita?

      3) Que conceitos estou a confundir?

      4) Serie televisiva vs livro: nada a opor de substantivo, apenas interjecto a fraca defesa de que, infelizmente, entre a minha ocupacao profissional (que me obriga a ler tambem bibliografia tecnica especializada) e a familia em casa nao sobra tempo suficiente para "hobbies"...

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    2. 1) Ora essa, não tem por que pedir desculpa pelos seus comentários. O que é evidente, é que as caixas de comentários não são muito propícias a que os assuntos se consigam abordar com muita desenvoltura.

      2) O autor não quantifica nem qualifica as distorções do lado norte-vietnamita. Aliás, creio que nem se refere expressamente a elas. Eu é que o fiz. É uma opinião e é uma síntese de um livro de 650 páginas. E com o acontece em qualquer síntese, alguma coisa ficou por clarificar.

      3) Se me está a dizer, como me pareceu, que se pode equivaler aquilo que se sabia, na época, do processo de condução da guerra em Saigão, com Westmoreland e o MACV, e aquilo que se sabia reciprocamente, do outro lado, em Hanói, então só lhe posso dizer que considero que, mais do que discordar, acho que está fundamentalmente errado. Por mim, não houve qualquer comparação entre a transparência das duas partes durante o conflito. E claro que os exemplos que evoquei aqui foram propositadamente de lana caprina. E, finalmente, a reapreciação de um conflito não é a mesma coisa que o revisionismo sobre o seu desfecho. A guerra mostrou-se decidida deste muito cedo. Aliás, uma das surpresas deste livro (para mim) é a precocidade como apareceram opiniões - fundamentadas - antecipando o seu desfecho. Os Estados Unidos poderiam ter tentado "comprar" o Vietname do Norte. Não tentaram porque também não faziam a mínima ideia qual seria a reacção de Hanói. Na verdade, os americanos não faziam a mínima ideia do que se passava em Hanói, tanto assim que, quanto a fontes de Humint, eles dependiam dos activos britânicos.

      4) O tempo do audiovisual - e a preciosidade do tempo em televisão - conseguiu nivelar o que supostamente é muito diferente: uma análise sumária de um tema complexo tanto pode resultar do trabalho apurado de concisão de alguém que sabe muito desse tema como de alguém que leu umas coisas a respeito antes de vir para o programa (olhó o Miguel Sousa Tavares...). Pode parecer, mas não é a mesma coisa. Um livro é um livro, um vídeo é um vídeo. «O Nome da Rosa» é um bom filme realizado por Jean-Jacques Annaud, mas é um livro excepcional escrito por Umberto Eco.

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