09 julho 2017

AS GRANDES DECISÕES DE UMA PRESIDÊNCIA

9 de Julho de 2004. Acompanhado da solenidade de uma comunicação ao país, o presidente Jorge Sampaio informa os portugueses da sua decisão de indigitar Pedro Santana Lopes para formar um novo governo no seguimento da resignação de Durão Barroso, que queria ir para a Comissão Europeia. «Foi uma decisão complexa, dada a controvérsia sobre a melhor forma de resolver o problema. Qualquer das alternativas comportava custos. A opinião pública tinha a percepção destes custos e, por isso, dividiu-se entre os dois caminhos para resolver a crise. (...) Nestas circunstâncias, o Presidente da República tem de avaliar e decidir, de acordo com a Constituição e com a sua interpretação do interesse nacional.» A opinião pública estaria dividida mas apenas um dos lados da opinião pública é que estaria certo. E era o lado que discordava da decisão do presidente. Dali por apenas cinco meses o mesmo Jorge Sampaio estava a demitir o governo e a dissolver o parlamento, invocando «a falta de credibilidade» do executivo que empossara nesse mesmo Verão.
Quanto apreciadas a esta distância e como se se tratasse de um capitão de um navio de longo curso, os presidentes acabam por ser julgados pela História só por algumas (poucas) das suas decisões, mas sempre pelas decisões que se vêm a revelar (como esta) as cruciais do seu mandato. São o género de decisões onde é a própria posterioridade que acaba por apreciar sem controvérsia o acerto da decisão - ou então a desmenti-lo. Jorge Sampaio cometeu há precisamente treze anos o primeiro de dois grandes erros políticos. Decidiu mal invocando boas razões para depois, no segundo erro, em Dezembro desfazer o que fizera, aí decidindo bem, mas pelas más razões - a fundamentação engrolada da sua decisão deixou Santana Lopes com um capital de queixa de que até hoje ele não prescinde. Porque Sampaio goza da reputação de ser pessoa de bom fundo (algo que não se poderá dizer nem do seu antecessor, nem do seu sucessor), parece haver um alargado entendimento social tácito para não lhe bater com muita força por causa disto. Sampaio é tido pessoalmente por uma boa pessoa, melhor do que Soares e muito melhor do que Cavaco, mas, quando precisámos dele, foi um mau presidente. Não nos devemos esquecer do que aconteceu. Tanto mais que existe em todo o episódio uma componente pedagógica que vale a pena preservar: a de que, por muito ambição política que se tenha, nem todos têm capacidade para ser primeiro-ministro. Trump, esse tendo uma legitimidade incontestável, anda por aí a demonstrá-lo.

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