23 abril 2021

A COMUNICAÇÃO PRESIDENCIAL


Há precisamente 60 anos, a 23 de Abril de 1961, um Domingo, um General de Gaulle acossado por um pronunciamento militar que sublevara as forças armadas directamente engajadas no conflito argelino vem socorrer-se mais uma vez da rádio e, pela primeira vez em larga escala, da televisão. O histórico debate presidencial entre Kennedy e Nixon do outro lado do Atlântico tivera lugar apenas há oito meses e em atenção a este último meio de comunicação, um de Gaulle sempre actualizado aparecia propositadamente fardado com a sua desactualizada farda de general da Segunda Guerra Mundial. O discurso que proferiu corroborava aquilo que se via pelo ecrã:

Um poder insurrecto estabeleceu-se na Argélia através de um pronunciamento militar.
Os culpados da usurpação exploraram a paixão dos quadros de certas unidades militares, a adesão inflamada de uma parte da população de origem europeia assustada por temores e mitos, a impotência das autoridades submergidas pela conspiração militar.
Este poder tem uma imagem: um quarteto de generais reformados. Exprime também uma realidade: um grupo de oficiais facciosos, ambiciosos e fanáticos. O grupo e o quarteto mostram ter um desembaraço expedito mas limitado. Mas eles não vêem nem compreendem a Nação e o Mundo senão através da deformação do seu frenesim. O seu empreendimento só pode conduzir a um desastre nacional.
Porque o enorme esforço de recuperação da França, iniciado desde o fundo do abismo a 18 de Junho de 1940, prosseguido até que, apesar de tudo, a Vitória foi alcançada, a independência assegurada, a República restaurada; repegada desde há três anos, a fim de refazer o Estado, de manter a unidade nacional, de reconstituir o nosso poder, de reestabelecer a nossa posição no exterior, de prosseguir a nossa obra no Ultramar através de uma descolonização necessária, tudo isso se arrisca a ser em vão, mesmo em vésperas de ser alcançado, pela aventura odiosa e estúpida dos insurrectos na Argélia. Eis o Estado violentado, a Nação desafiada, o nosso poder minado, o nosso prestígio internacional rebaixado, o nosso lugar e o nosso papel em África comprometidos. E por quem? Veja-se lá, veja-se lá! Por homens cujo dever, honra e razão de existir deveria ser servir e obedecer.
Em nome da França ordeno que todos os meios, e realço todos os meios, sejam empregues em todo o lado para bloquear o caminho a esses homens, até eles serem dominados. Proíbo todo o francês, a começar por qualquer soldado, de obedecer às suas ordens. O argumento de que pode ser necessário aceitar o seu comando pontualmente sob o pretexto de obrigações operacionais ou administrativas não deverá enganar ninguém. Os únicos chefes, civis e militares, que têm o direito de assumir responsabilidades são aqueles que foram devidamente nomeados para o efeito e que, precisamente, os insurrectos estão a impedir de agir. O destino dos usurpadores não deverá ser mais do que aquele que lhes for destinado pelo rigor das leis.
Diante da infelicidade que paira sobre a Pátria e a ameaça que pesa sobre a República, tendo ouvido as opiniões oficiais do Conselho Constitucional, do Primeiro-Ministro, do Presidente do Senado e do Presidente da Assembleia Nacional, decidi accionar o artigo 16 da nossa Constituição. A partir de hoje, irei tomar, conforme as necessidades, as medidas que parecerem exigíveis pelas circunstâncias. Através delas, assumo-me, tanto hoje como amanhã, como guardião da legitimidade republicana que a nação me conferiu, que manterei aconteça o que acontecer, até ao fim do meu mandato ou até que me faltem, quer as forças, quer a vida, caso em que assegurarei que ela se mantenha depois de mim.
Francesas, franceses! Vejam para onde se arrisca a ir a França, em comparação com aquilo em que ela se estava a tornar.
Francesas, franceses! Ajudem-me.

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