13 dezembro 2008

OS ESTADOS PRINCIPESCOS DA ÍNDIA – 5

O Estado Principesco de Junagadh, situado na região natal do Mahatama Gandhi e de Vallabhbhai Patel, o Gujarate, era mais pequeno e menos próspero do que aqueles que foram referidos até aqui – apenas 15 salvas de canhão! Em termos mais concretos eram aproximadamente 400.000 habitantes (dos quais cerca de 82% eram hindus) em quase 9.000 km² de extensão. Como curiosidade, refira-se que era o Estado que fazia fronteira com a praça portuguesa de Diu. E possuía um monarca de religião muçulmana, um Nawab, devidamente aconselhado pelo seu chefe de governo, o Dewan.

Ao contrário do Maharaja de Jodhpur, quando dos acontecimentos de 1947 o Nawab de Junagadh era um monarca veterano, e ocupava o trono desde a infância (1911). Com 47 anos de idade, o Nawab Muhammad Mahabat Khanji III era também conhecido por uma das suas excentricidades: a sua predileção por seus cães (acima), a quem propiciava um tratamento invejável. Mas o burlesco desse facto – depressa aproveitado pelo Congresso para o desacreditar – não nos pode fazer esquecer a legitimidade das suas pretensões quanto ao futuro do Estado de que era soberano: assinar a Adesão de Junagadh ao Paquistão!
Na realidade, quando dos acontecimentos do Verão Quente de 1947, o Nawab até estava de férias na Europa e o governo estava entregue ao Dewan, um político sindi, próximo da Liga Muçulmana, de seu nome Sir Shahnawaz Bhutto (acima, com a família), que os leitores facilmente referenciarão se o der como o avô paterno da recentemente assassinada Benazir Bhutto. Seguindo as suas sugestões, o Nawab depois de regressar de férias manteve-se em silêncio apesar de todas as pressões a que foi sujeito, até anunciar na véspera do dia da Independência (14 de Agosto) que pretendia aderir ao Paquistão.

E tirando a questão da maioria hindu, que era um problema moral mas não formal (o monarca era soberano para decidir qual o país a que pretendia aderir), não havia mais nada que a Índia pudesse invocar para contrariar essa adesão. Embora estivesse separado fisicamente do resto do Paquistão e rodeado por outros Estados Principescos que haviam optado pela Índia, Junagadh possuía vários portos numa costa extensa (abaixo) que se localizavam a uma distância aceitável (325 milhas) do principal porto paquistanês, Karachi. Recorde-se que o resto do Paquistão também estava dividido em Ocidental e Oriental…
A própria recepção paquistanesa à intenção de Junagadh foi, inicialmente, moderada. Para Jinnah, Junagadh poderia servir como uma eventual moeda de troca no quadro negocial mais vasto das rectificações a processar na fronteira indo-paquistanesa depois de Agosto de 1947 mas, de uma forma realista, os domínios do Nawab não passavam de um grande enclave cujas possibilidades de defesa militar, se a tal extremo fosse preciso chegar, eram nulas(*). Só passado um mês, em 13 de Setembro, e sobretudo por causa do que se estava a passar em Caxemira é que o Paquistão aceitou a Adesão de Junagadh.

A manobra de resposta escolhida pelos indianos foi a de arranjar um governo de Junagadh no exílio (em Bombaim), chefiado por um sobrinho de Gandhi, Samaldas, que era de lá natural. E no ambiente da época, a concorrência dessa autoridade paralela à administração, com uma pressão militar discreta (abaixo) acabou por desmoralizar as autoridades legais, a começar pelo Nawab, que em Outubro acabou por partir para o Paquistão acompanhado da família e de uma dúzia dos seus cães favoritos. A 9 de Novembro de 1947 foi o Dewan que entregou formalmente a administração de Junagadh à Índia.
Para conferir um ar de legitimidade à anexação, três meses depois (20 de Fevereiro de 1948), a nova administração organizou um plebiscito consultando as populações sobre o futuro do Estado. O resultado foi uma previsível vitória da opção indiana mas que, de tão esmagadora, acabou por se tornar embaraçosa para os organizadores: de entre os 190.870 votantes apenas 91 (ou seja uns míseros 0,05%) se pronunciaram a favor da Adesão ao Paquistão... Quanto ao Nawab, como um daqueles monarcas europeus depostos, a sua causa continua de pé através dos sucessores, como se pode ver nesta página da internet.
(Continua)

(*) Foi pena que Salazar não tivesse tido essa mesma percepção em relação aos enclaves que constituíam a Índia Portuguesa.

3 comentários:

  1. O que se vai aprendendo por aqui...bastante melhor que ouvir o "Professor".. :-)

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  2. Pois, o "Professor" fala sobretudo sobre tudo.

    Aqui fala-se de muita coisa, mas apenas de coisas que percebo.

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