
Reza a história da
Transição espanhola que, depois do 25 de Abril de 1974, houve um período em que se tornou uma espécie de
desporto enviar monóculos àquele que se encontrava à frente das Forças Armadas espanholas, o
Chefe de Estado-Maior da Defesa espanhola, que era então o Tenente-General
Manuel Díez-Alegria (abaixo). A alusão da
brincadeira era óbvia: o monóculo era o adereço que tornava inconfundível o novo Presidente português depois do pronunciamento militar, o General António de Spínola. E os monóculos eram um convite, não muito velado nem subtil, a que Díez-Alegria o copiasse, e terminasse com o
franquismo por meio de um golpe semelhante.

É mais do que provável que o Tenente-General nunca tivesse tido essa intenção mas, segundo rezam as já referidas crónicas da
Transição espanhola, acabou mesmo assim destituído em 1975, em consequência de um convite aceite para uma inusitada visita à Roménia que afinal incluía um (imprevisto) encontro com o secretário-geral do
PCE,
Santiago Carrilho…O que este episódio tem de mais exótico, quando contado a quem conheceu o período do PREC, mas observado do lado português, é a ingenuidade que parecia existir entre as elites espanholas que deviam estar muito pouco esclarecidas quanto aos poderes reais de António de Spínola e à realidade da Revolução que estava a acontecer do outro lado da fronteira (abaixo)...

É que interpretando o desejo de quem enviava monóculos ao general parecia desejar que ele se apropriasse do poder, roubando-o a um regime franquista que se apresentava já então como irremediavelmente agonizante, entregue a cortesãos, mas em que tudo aquilo se passasse com uns blindados nas ruas (que remédio!), mas como uma suavidade fluida nas negociações entre as altas patentes. Ora em Portugal não era nada isso que se passava.
Pío Cabanillas (abaixo), que era então o Ministro da Informação e Turismo, pertencia à ala menos conservadora do franquismo e era um dos poucos espanhóis bem informados sobre o trajecto revolucionário que estava a acontecer em Portugal, organizou uma sessão de cinema privada para os seus colegas de Governo.

Perante as imagens das manifestações populares nas ruas de Lisboa, os murais
vermelhos e os discursos cada vez mais revolucionários, tudo o que Pío Cabanillas conseguiu ouvir aos seus pares foi um conjunto de
fanfarronadas sobre a capacidade que duas companhias da
Guardia Civil teriam para pôr
tudo aquilo na ordem… Cabanillas demitiu-se em Outubro de 1974. Spínola já se havia demitido no mês anterior e, por essa altura, Díez-Alegria
já deixara de receber monóculos: em contrapartida, aparecia nas forças armadas espanholas uma organização de oficiais pró-democracia
denominada UMD… E os antigos colegas de Cabanillas - cortesãos de um regime moribundo - não tardaram a ter que ser substituídos por gente válida…
Se tivesse usado os monóculos, o Diez-Alegria iria, provavelmente, arrastar-se em "tristeza" num qualquer ELE (versão espanhola de ELP), depois de aclamado na Monumental de Madrid, por uma "maioria ruidosa" de dentes afiados e mão esticada.
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