

Filmada na perspectiva de um vulgar espectador que vai ao teatro depois de jantar, a apresentação da peça em televisão é precedida da respectiva viagem até ao teatro e de imagens de uma Lisboa à noite que já só existem na memória dos mais velhos, destacando-se a frota de táxis, que era quase toda composta pelos (na altura) novíssimos Mercedes 180 D, pretos de capota verde, bagageira arredondada e estofos (muito) duros de couro…
Mas se os táxis eram uma novidade, a relação algo cúmplice entre público e os actores mais populares já pareciam ecos de atitudes que estavam em vias de desaparecimento acelerado. A salva de palmas de quase fazer o teatro vir abaixo a saudar a entrada em cena da veneranda Palmira Bastos, a vedeta da peça, e antes de ela dizer umas linhas que fossem para a justificar, já soava a gesto deslocado, de uns outros tempos.
A história narrada pela peça é, de certa maneira, banal, mas até essa banalidade acaba por ter uma utilidade simbólica. Num jogo cruzado de fingimentos é a duplamente veneranda Palmira Bastos que leva a melhor, fingindo que acredita na encenação fingida que lhe prepararam. E daí a frase que remata a peça (recebida com uma estrondosa ovação!): Morta por dentro, mas de pé, de pé, como as árvores!
O nosso respeito cresce quando se descobre que Palmira Bastos tinha, na altura, 91 anos. E, por falar em nonagenários, do respeito que eles nos merecem e da forma como eles, aproveitando-se disso, conseguem dissimular a sua recusa deliberada às realidades, é daquela peça e do papel de Palmira Bastos que retiro o exemplo mais flagrante do que suponho devem ter sido os últimos anos da vida de Álvaro Cunhal…
Também há árvores que caem à beira das estradas da História.
ResponderEliminarTambém há muros que caem e rolam como bolas de Berlim.
Também há homens notáveis que fingem ignorar a queda dos muros e se escondem da realidade atrás de árvores de cenários de ilusão como os do teatro e os de certos partidos políticos...
E também existem pessoas cujo carácter é imortal e intocável por quaisquer críticas não só pelo simbolismo que construíram à sua volta como pela atitude e verticalidade que pautaram as suas vidas.
ResponderEliminarTem que ser mais específico, Luis Carlos Martins, porque já vi panegíricos muito parecidos com o seu dedicados tanto a Ernesto "Che" Guevara como a monsenhor Escrivá de Balaguer...
ResponderEliminarEstá referir-se a alguém ou a algum grupo de pessoas em particular?