14 setembro 2007

O SEGREDO DO KAISER

Guilherme II (1859-1941, acima) foi o último Imperador da Alemanha e Rei da Prússia (1888-1918) e é normalmente conhecido pelo primeiro título, em língua alemã, sem demais complementos: o Kaiser. Kaiser é a palavra germânica para imperador, uma corrupção da palavra latina Caesar, do nome de Júlio César, que depois veio a tornar-se num título. Apesar de não se costumar usar qualquer especificação, havia um outro Kaiser de língua alemã contemporâneo de Guilherme II, Franz Joseph I (Francisco José, 1830-1916), Imperador da Áustria, mais discreto e menos carismático.

Se há que pensar num traço físico que identifique Guilherme II a escolha recai obviamente no seu reconhecível bigode ondulado, que só podia ser resultado de muito cuidados de manutenção, incluindo uma rede que se aplicava à noite para não o destruir durante o sono… As poses que escolhia para as fotografias oficiais, como a de cima, levaram um ministro francês a comentar perante uma fotografia sua, pouco depois de subir ao trono, em 1890: parece-se com uma declaração de guerra! E a fotografia era muda… o ministro não tinha o privilégio de ouvir Guilherme II…
Porque Guilherme II adorava dizer coisas: Estamos destinados a fazer grandes coisas. Conduzo-vos para belos dias!. Ou Se o vosso imperador o ordenar, devereis disparar sobre o vosso pai ou sobre a vossa mãe!... Guilherme tinha uma espécie de toque de Midas* congénito em que conseguia sempre irritar alguém importante com cada uma das suas proclamações… A verdade é que parecia que o ego de Guilherme II precisava de um fluxo contínuo de lisonja e adoração fornecido pelos cortesãos que depois se expressava assim em proclamações despropositadamente agressivas.

O problema ampliava-se porque o sistema constitucional alemão, que fora montado por Otto von Bismarck (1815-1898) depois da unificação alemã em 1871, era para funcionar com um monarca carregado de poderes, mas receoso de os exercer, Guilherme I (1797-1888), avô de Guilherme II, mas auxiliado por um chanceler à frente do governo que sabia perfeitamente o que queria e para onde ia: o próprio Bismarck, retratado abaixo. Ele detinha o poder sem quase ter que prestar contas diante de um parlamento. A subida ao trono de Guilherme II em 1888, com o entusiasmo e a disposição de governar ele mesmo, levou Bismarck ao desespero e à demissão em 1890, depois de ter sido chanceler durante 19 anos.
Apesar do lendário feitio difícil, a culpa, por esta vez, parecia não ser de Bismarck mas das intenções descontroladas e erráticas do monarca: o seu sucessor Leo von Caprivi (1831-1899) esteve no cargo por quatro anos (1890-94) e o chanceler seguinte, o príncipe Hohenlohe (1819-1901), aguentou seis (1894-1900). Para chefes de governo que não dependiam de aprovação parlamentar, é um ritmo interessante… Conhecido por não engolir desaforos, as últimas palavras ficaram reservadas para o ex-chanceler no seu epitáfio, concebido por si para o enorme funeral de estado que lhe foi prestado, em 1898: Aqui jaz um alemão, fiel servidor do Kaiser Guilherme I

Na verdade, por detrás de todas essas demonstrações gratuitas de exercício de autoridade, Guilherme II era um complexado. A fotografia abaixo é uma das raras em que se nota a deficiência de nascença que possuía no braço esquerdo, discretamente camuflada nas outras fotografias deste poste. Numa hipotética inspecção militar, um qualquer outro cidadão do Reich que apresentasse tal deficiência teria ficado desobrigado do cumprimento do serviço militar… Guilherme II provavelmente sabê-lo-ia e isso não é o tipo de ideia que reconforte aquele que, por inerência, era o Comandante Supremo das Forças Armadas Imperiais alemãs...
* O toque de Midas é uma alusão a um episódio mitológico em que o rei Midas transformava em ouro tudo aquilo em que tocava. Aqui é usado em sentido figurativo, por analogia a um efeito – a irritação – que é provocado de forma involuntária.

2 comentários:

  1. Talvez, tenha lhe faltado o apoio afetivo necessário, pois a vida dos príncipes pode ser bastante solitária.

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  2. Guilherme II era mesmo um exibido que posava de guerreiro
    de combatente de corajoso mas não era nada disso. Apenas
    um homem frívolo que jamais amou seu povo nem nunca disse
    uma palavra reverente a seus combatentes mortos, como mostram suas memórias. Em suma: um homem vulgar.

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