30 agosto 2016

A POLÍTICA NA PRIMEIRA PESSOA DO SINGULAR

A interminável crise governamental da Espanha é para ser acompanhada com uma atenção cada vez mais displicente e com um indefinível sorriso irónico nos lábios: ainda ontem houve mais um episódio, onde Sánchez do PSOE deixou dito que a reunião havida era «perfeitamente prescindível», ao que Rajoy do PP, enxofrado, respondeu que «o diálogo por Espanha nunca é prescindível, muito menos na situação actual». No meio de todas estas proclamações de urgência e de importância que se acumulam desde há meses, mormente proferidas por Mariano Rajoy, o que ainda não se ouviu foi manifestações de disponibilidade dos protagonistas, especialmente do mesmo Mariano Rajoy (mas também dos outros parceiros), para se afastarem do centro das negociações por forma a que não se assaque a razões meramente pessoais (sobretudo de antipatia pessoal...), as causas pelas quais a Espanha permanece neste impasse governativo desde há quase um ano. Isso sim, mais do que as proclamações tonitruantes, mostraria por um gesto concreto uma grande capacidade de sacrifício dos protagonistas pelo bem maior da governabilidade de Espanha! Mas desse género de alternativas negociais não se tem ouvido falar...
Atravessamos tempos bizarros de um predomínio acentuado da política conjugada na primeira pessoa do singular. Também do lado de cá da fronteira e num dos seus discursos deste fim de semana podemos ler que «Passos (Coelho) diz que principal objectivo do Executivo é proibir o PSD de governar». Como Mariano Rajoy mais acima, também Pedro Passos Coelho parece confundir-se a si mesmo entre o que será a sua pessoa e o que é a organização política que dirige. Não tenho quaisquer dúvidas que, por muito que o executivo actual se esforce em o impedir, o PSD há de voltar a governar Portugal no futuro; assim como não tenho quaisquer dúvidas que, a não ser que o executivo actual se empenhe em governar particularmente mal, esse retorno do PSD ao poder nunca irá ser protagonizado por Pedro Passos Coelho... O que cimenta a geringonça é a memória dos tempos de poder de Pedro Passos Coelho, de Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque, de Miguel Relvas e de Carlos Moedas... Não é por esses tempos de extrema-direita no poder não serem referidos por essa designação, que se altera a percepção de uma maioria de portugueses de que vivemos algo de muito dramático e que, se vem comprovando agora, foi desnecessariamente brutal e radical para os (parcos) resultados produzidos.

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