12 dezembro 2005

ELE TEM DOIS AMORES

Se algum estrangeiro vier a Portugal para tentar investigar e compreender o fenómeno deste senhor aqui do lado na opinião publicada, asseguro-lhe que vai ter um fracasso estrondoso.

E pur si muove*, como diria Galileu, os resultados das vendas e da popularidade de Marco Paulo já de há muito que são evidentes e dispensam os circuitos de promoção tradicionais de muitos dos seus colegas de profissão. Não apreciando a sua obra já é aceitável entre os bem pensantes dar mostras de respeito pelo artista.

Aproximando-nos da campanha para a eleição presidencial, ocorre-me às vezes, se Cavaco Silva não será uma espécie de Marco Paulo político. É que, se a memória não me trai, Cavaco já nos pregou duas vezes partidas semelhantes e convém prepararmo-nos para, no meio do barulho de fundo sem significado de uma campanha, evitar cair na mesma esparrela pela terceira vez.

Se o resultado do PSD das eleições legislativas de 87 havia sido uma surpresa (50%), a expectativa para as de 91 era a de ver a capacidade de Cavaco de limitar o desgaste. Os jornais que estavam fora do controlo laranja massacravam em cima do governo – O Independente então era por demais –, quase se tornava obrigatoriamente chique que, socialmente, se mostrasse antipatia pelo PSD. Vamos a votos e o PSD duplica a dose: 50%. Onde é que andavam esses eleitores que não se dava por eles?

Quatro anos depois, para as presidenciais de 1995, o grau de saturação ainda era maior, Cavaco ainda abrilhantou mais o espectáculo a brincar aos tabus, mas a verdade é que os outros candidatos da esquerda (Carlos Marques da UDP e Jerónimo de Sousa – que ainda não fora descoberto fresco, jovial e genuíno pela imprensa e ainda era mais um daqueles leninistas da cassete do costume…) retiraram as suas candidaturas para não forçarem uma segunda volta. Cavaco, como ele próprio outro dia lembrou, perdeu, mas com 46,5%. É o mesmo resultado que deu esta maioria a Sócrates…

Em Cavaco vota-se, não se debate, não se discute. Não debate o candidato, não discutem os seus eleitores. Maldosamente, poder-se-ia insinuar que ainda são ecos daquele famoso discurso de Salazar que não discutia nem Deus, nem a Pátria, nem a Família… Mas em Cavaco, como em Marco Paulo, convém vergarmo-nos à realidade dos discos de platina…

Em suma, estou convencido que Soares vai mesmo ter de deixar Cavaco fazer o tal passeio pela Avenida, retribuindo, aliás, o passeio que Cavaco lhe proporcionara em 1991. De bónus Soares vai-lhe dar o prazer de ser humilhado quando se concluir que a sua presença só serviu para dispersar os votos de um resultado que, muito provavelmente, Manuel Alegre conseguiria sozinho.

* E contudo ela move-se – disse Galileu ao ser condenado a deixar de ensinar que a Terra se movia à volta do Sol.

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