03 dezembro 2005

BOVINIDADES

Começo por deixar clara a minha maior simpatia pela causa da abolição da pena de morte, por um variado leque de razões que não importa agora mencionar. Agora, devo confessar o meu incómodo quando vejo essa causa ser defendida na comunicação social através da manipulação fraudulenta da apresentação dos dados.

A notícia em questão, emitida e repetida nos Estados Unidos e depois amplificada para o resto do Mundo, assinala o milésimo executado pela Justiça norte-americana depois da reintrodução da pena de morte, há 30 anos. O número (1000) está lá, é fornecido a seco, sem comentários. Atrevamo-nos a pô-lo numa escala relativa.

Os mil executados em 30 anos, representam um pouco mais de 30 executados por ano, num país que tem cerca de 300 milhões de habitantes ou seja, um rácio de 1 execução anual para um pouco menos de 10 milhões de habitantes, o que me parece perfeitamente demonstrativo que, pelo menos analisado por este aspecto, a justiça norte-americana, no geral, parece ter sido cautelosa na aplicação da sanção penal máxima.

Enfim, sempre se pode dizer que é uma efeméride. Mas que tal, se se comparar os mil executados em 30 anos aos mais de dois mil mortos em apenas dois, em consequência da Guerra do Iraque? A causa da abolição da pena de morte deve ser suportada qualitativamente; quantitativamente pode dar nisto…

Mas o mais espantoso é a placidez com que certas notícias parecem rodear o globo, sem que se consigam ouvir vozes discordantes. Como alguém fora do meio recentemente notou, a crise da gripe das aves passou, num par de semanas, da preocupação aguda com o papagaio inglês infectado, à indiferença pela morte de uma rapariga chinesa.

Vendo isto, considerando a classe jornalística mundial, tenho muita pena mas não é propriamente em aves que se pensa…

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