20 dezembro 2006

PERPÉTUA RODRIGUES, FILHA DO MAJOR SALEMA

Em A Maluquinha de Arroios, uma peça de teatro de André Brun datada de 1919, mas que foi depois adaptada para cinema e também várias vezes para teatro televisionado, há uma personagem secundária que passa o tempo a indignar-se com os enxovalhos a que é submetida, exteriorizando essa indignação ultrajada em frases como: Imagine-se fazerem-me uma coisa dessas a mim. A mim, Perpétua Rodrigues, filha do major Salema!

As pretensões da personagem estão condensadas naquela segunda frase. Resultante da época em que foi escrita, a graça pressupõe que um major seja alguém muito importante (na altura até era) mas o maior efeito cómico é obtido pela contradição entre o apelido da própria – na verdade uma modista pretensiosa, se bem me recordo - e o do famoso major, numa época em que a moral dominante fazia de filiação ilegítima um estigma.

Mas a frase fica no ouvido sobretudo pelo contraste estudado entre o que se ouve e aquilo que se estava à espera de ouvir. E agora, imagine-se lá que a causa de me ter lembrado da boa da Perpétua Rodrigues tem a ver com os patrulheiros da blogosfera! Que os há, não é novidade nenhuma. Há certos assuntos que já se percebeu, pelas reacções, que deverão ser continuamente pesquisados através dos motores de busca.

Por exemplo, beliscar um tema que seja caro aos comunistas aumenta exponencialmente as probabilidades que apareça inserido um extenso comentário contrário na caixa dos ditos, normalmente assinado por um nome banal, mas diferente de José Silva… Mas isso não será nada de que não se esteja à espera e é até aprazível de rebater, com excepção daqueles militantes que julgam que a militância ardente pode ser sempre um substituto para a ignorância do tema sobre o que se escreve…

Eu não contava era vir a descobrir comportamento semelhante, havendo quem patrulhe o nome de José Pacheco Pereira, para chegar ao meu blogue e nele inserir um comentário contrário à minha opinião. Inseri-lo, note-se, não é nada de mais, trata-se até de uma das funções mais saudáveis e que mais aprecio da blogosfera (o debate de ideias) e a minha resposta ao comentário lá está, incluindo até um pedido meu ao comentador que espero sinceramente que seja satisfeito.

Sendo já de si bizarro que alguém tenha assumido para si as penas de refutar as discordâncias que aparecem na blogosfera com aquilo que José Pacheco Pereira escreve, a minha surpresa cresceu ao verificar, numa segunda observação mais atenta, que o comentador que se assinou como Alberto Marques, Braga, estava a fazer as suas pesquisas e comentários e a aceder à rede a partir de um IP da telepac da região de… Santarém.

Escapa-me à imaginação as causas para que alguém que esteja em Santarém pretenda assumir que está em Braga (pseudónimos e secretismos sempre foram especialidades do PC) mas a verdade é que, em sonoridade, o episódio me faz lembrar a tal personagem de A Maluquinha de Arroios: Perpétua Rodrigues, filha do major Salema, e Alberto Marques, Braga, a escrever-nos de um computador instalado algures na região de Santarém…

8 comentários:

  1. A mim, o que me escapa à compreensão (decerto limitada)é este seu estranho interesse e investigações sobre motores de busca, IP, pseudónimos etc. e tal.

    Desencontros do tempo e da história: o A. Teixeira há 60 anos seria logo recrutado pelo Beria. E não era propriamente para blogar.

    ResponderEliminar
  2. Não é um estranho interesse, é apenas uma constatação. Se me puder explicar – talvez esteja mais bem habilitado que eu – porque é que os comentários menos simpáticos são desproporcionadamente mais vezes assinados por nomes anónimos do que os outros?

    Talvez não seja um problema de há 60 anos, mas de sempre com certas pessoas: a falta de coragem de dar a cara pelas suas opiniões. E não brinque aos Berias. O problema dos Bérias não se punha ao descobrir quem tinha sido, punha-se depois de descobrir quem tinha sido… E às vezes nem se descobria quem tinha sido, mas o problema punha-se à mesma… E há sempre quem se esconda atrás de pseudónimos, com Beria, ou sem Beria…

    ResponderEliminar
  3. Caro A. Teixeira, essa Perpétua Rodrigues, filha do major Salema - desculpe a inconveniência -, não foi violada por um macaco, na casa de banho?
    Olhe, tenha um bom Natal!

    ResponderEliminar
  4. Um excelente Natal para si também!

    ResponderEliminar
  5. Realmente...
    Tambem não percebo porque não se assumem determinadas posições...

    Mas tudo bem...

    À parte isso, o post tem uma ironia giríssima ;)

    E recordou-me essa passagem da peça que é impagável...

    Beijinhos :)

    ResponderEliminar
  6. Obrigado Cristina!

    Que essa dinâmica comentadora não se perca...

    ResponderEliminar
  7. Este lamentável episódio é um alerta para o nosso Herdeiro que alia a vastos conhecimentos, uma pontaria certeira na observação do quotidiano e uma ironia subtil que, pelos vistos, incomoda algumas pessoas.
    Daí as tentativas de provocação e/ou insulto, tudo anónimo, cobardezinho, como se pode ver.
    Por estas e por outras, surgem os filtros. É pena, mas percebe-se...

    ResponderEliminar
  8. Obrigado Paciente pelas suas palavras. Espero e desejo que o filtro não seja necessário.

    Já foi preciso deixar contadores de judeus (dos que morreram mas não existiram...) a falar sozinhos, mas a verdade é que existe uma ameaça constante.

    ResponderEliminar