03 fevereiro 2024

O «PARADOXO MONTENEGRO» E O »PARADOXO JOÃO MIGUEL TAVARES»

João Miguel Tavares escreve hoje o seu artigo de opinião no Público perguntando-se porque «é que a poderosa máquina de propaganda do Governo e do PS não transformou os 98,7% na maior notícia do ano?» (Eu tenho uma resposta: porque a quase totalidade das pessoas persuasíveis à propaganda desta época não faz, nem quer fazer, a mínima ideia do significado dos 98,7%. O sucesso de um indicador macroeconómico não se vende agora.) João Miguel tem uma outra resposta, diferente, que ele aliás adianta no seu artigo. Baptizou-a de «paradoxo Montenegro», baseada numa «frase imorredoura» pronunciada pelo presidente do PSD vai para dez anos: "A vida das pessoas não está melhor, mas a do país está muito melhor". Ainda segundo João Miguel Tavares, «ele tinha razão».
E é aqui que começa a minha discordância. João Miguel Tavares pode não ter dado por isso, mas houve duas razões para que Luís Montenegro tivesse sido, como ele o descreve, «o bombo da festa durante meses». A mais elementar e que ele terá captado, é que as declarações de Montenegro davam mostras de uma enorme insensibilidade social. A razão mais complexa, que lhe terá escapado, é que a vida do país, no conceito das contas pública a que Montenegro se estava a referir, também não estava melhor. Aproveito para o recordar acima, que o indicador da dívida pública, o tal que agora se situa em 98,7%, andava em 2014 pelos 128,7%, aumentara e, pior, o Governo (de Passos Coelho) voltara a enganar-se, outra vez, nas previsões. Portanto, além de insensível, Montenegro não tinha razão, estava a mentir.
Não se trata apenas do indicador de 2014 ser 30% acima do de hoje (128,7% vs. 98,7%) , é sobretudo uma questão de, apesar das prioridades do governo de então, não se registarem resultados compatíveis com os sacrifícios que estavam a ser impostos aos portugueses. Se neste artigo se revela o «paradoxo Montenegro», paradoxalmente, também se percebe que existe o «paradoxo João Miguel Tavares», aquele que estabelece que, quando é conveniente, uma opinião pode ser assertivamente emitida, mesmo que uma consulta ao passado (este blogue tem memória!) comprove que essa opinião não tem nada a ver com o que foram os factos... A China maoista também fazia disso, embora de forma visual, e por isso, mais caricata.

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