04 fevereiro 2024

O DUVIDOSO RAPTO DA HERDEIRA PATRÍCIA HEARST

4 de Fevereiro de 1974. Tem lugar aquele que, na altura, se presumiu ser o rapto de Patrícia Hearst, a neta daquele que fora o magnata da imprensa norte-americana William Randolph Hearst (1863-1951). Tendo em atenção os pormenores que haviam rodeado o rapto (e a libertação) recente(s) de um outro herdeiro, John Paul Getty III (já aqui abordado neste blogue), o assunto afigurava-se mediaticamente promissor - acima temos a notícia tal qual foi apresentada originalmente pela CBS. Porém, enquanto os raptores de Getty III se haviam mostrado delinquentes clássicos, interessados apenas no resgate, dispostos até a cortar uma orelha ao refém como forma de pressão, os de Patrícia, que então contava 19 anos, manifestaram ter preocupações políticas. Autodenominavam-se Exército Simbionês de Libertação, procuraram inicialmente trocar a refém por dois dos seus membros presos, mudaram depois as exigências para uma distribuição de comida entre a população pobre da área de San Francisco, onde o rapto ocorrera. Todavia, mais bizarro do que isso, houve a evolução do comportamento da refém quando mais durava o cativeiro. Dois meses depois do rapto, Patrícia anunciaria, numa cassete entregue à imprensa, que aderira à organização que a raptara. Nem duas semanas depois dessa adesão, ela foi fotografada nas câmaras de segurança de um banco, a participar no assalto à mão armada, devidamente armada. Era inédito, era exótico, a herdeira-refém tornada guerrilheira urbana em apenas dois meses, a sua fotografia correu mundo (abaixo, à esquerda). Seguiu-se a divulgação de uma outra fotografia sua devidamente paramentada com o símbolo da organização por detrás (centro).
Mas como tudo o que é bom também acaba, a guerrilheira acabou capturada em 18 de Setembro de 1975. O que foi impressionante no acompanhamento do seu julgamento foi a capacidade de bombardear a comunicação social com a tese de que ela fora sujeita a uma lavagem cerebral e de que as suas acções haviam sido consequência disso! Essa era a tese da defesa. A da acusação - que raramente se ouvia na mesma comunicação social - era que Patrícia Hearst não só aderira de bom grado ao grupo terrorista, como se colocava até a hipótese de que ela conhecia previamente os raptores e que este rapto de há 50 anos fora encenado. Nada se conseguiu provar a esse respeito mas, para aquilo que interessará nesta história, aquilo que aconteceu no julgamento é que foi a tese da acusação que vingou e Patrícia Hearst acabou condenada - para surpresa da opinião pública (e minha) - a sete anos de prisão pelos assaltos à mão armada que cometera. Depois, como há sempre uma justiça para ricos e outra para pobres, ela acabou sendo perdoada pelo presidente (Jimmy Carter), cumprindo apenas 22 meses de prisão. Este é um daqueles casos em que a página da wikipedia da pessoa em causa é uma vigarice completa. Esta é também uma história que me ocorre com frequência quando me deparo com os repetidos exercícios que nos querem fazer condoer com a doença de Alzheimer de Ricardo Salgado, ao ritmo de uma notícia todos os meses: Novembro, Dezembro, Janeiro, este mês deve estar a aparecer mais uma...

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