Tratando-se de uma análise baseada na Escala de Mohs (por isso relacionada com a geologia) será importante relembrar a antiguidade aproximada de cada uma das grandes religiões actuais, para verificar quem terá tido oportunidade de chocar com quem. De acordo com a datação atribuída aos mais antigos textos sagrados de cada religião, os mais antigos serão os do Hinduísmo, seguidos dos do Judaísmo, ambos antes do último milénio antes de Cristo. Daí até ao seu nascimento teremos o Jainismo (da Índia), o Zoroastrismo (da Pérsia), o Budismo, o Taoísmo e o Confucionismo. E, depois disso, o Cristianismo, o Islamismo e, já no segundo milénio da era cristã, o Sikhismo (Índia).
Se observarmos num mapa-mundo a distribuição actual das religiões predominantes pelas populações do planeta as designações predominantes incluirão o Cristianismo, o Islão e o Budismo. A China e a Índia constituem duas excepções aquela regra. A segunda porque o Hinduísmo é actualmente uma religião específica sua. A primeira porque resulta numa síntese própria, envolvendo o Budismo, o Taoísmo, o Confucionismo, combinados com a ausência de qualquer prática religiosa, fomentada pelo actual regime chinês. E algo de uma especificidade semelhante acontece no caso japonês. Mas a razão principal para que o mapa-mundo assim apareça reside na circunstância daquelas três religiões serem as que maior sucesso registaram na sua propagação.
Só que curiosamente, das tais religiões com livro, começou por ser o Hinduísmo aquela que mostrou maior dinamismo expansionista na Ásia ao longo do último milénio antes de Cristo, dominando, em primeiro lugar, todo o sub continente indiano de Norte para Sul e projectando-se depois, por via marítima, para o Sudoeste asiático e a Indonésia. Vestígios desse passado em que quase toda a Ásia tropical era dominada pela religião hindu ainda podem ser encontrados em pedra nas ruínas do século XII de Angkor Wat no Camboja e ao vivo na população de Bali, a pequena (e afamada) ilha da Indonésia, onde a maioria da sua população ainda pratica a religião.
O Budismo nasceu também na Índia e, podendo ser considerada (de uma forma muito simplificada) uma espécie de elaboração do Hinduísmo, na nossa Escala de Mohs riscá-lo-ia, pelo menos na sua fase inicial. O Budismo, que chegou a servir de suporte do maior império que a Índia havia visto até então (no século III AC) acabou por fracassar na própria terra de origem que o viu nascer devido a uma espécie de contra-reforma religiosa do Hinduísmo. Mas o Budismo desalojou-o de todo o resto da Ásia: Ceilão, Birmânia, Tailândia, Malásia, Vietname, Indonésia, Tibete, China e… Afeganistão. É pouco conhecida, mas muito curiosa, embora deles se saiba pouco, a história dos reinos greco-báctrios e greco-indianos, descendentes da passagem por ali de Alexandre, que se reclamavam da cultura grega e da religião… budista.
O Cristianismo, que se lhe segue cronologicamente, apareceu em área geográfica muito diversa das duas religiões anteriores, por isso só muito depois houve oportunidade de comparar as suas durezas relativas. Por outro lado, contrariamente ao que se pode saber que aconteceu com a expansão das religiões anteriores, a do Cristianismo raramente deixou de ser feita com apoio militar. Foram raros os episódios onde houve uma expansão religiosa sem o acompanhamento da expansão da tutela política. Mas houve-os: o sucesso da expansão do cristianismo no Vietname (do século XVII ao XIX), na Coreia (no século XX, onde cerca de metade da população sul-coreana actual se assume cristã) ou no Japão (antes de ser interditado em 1638) pode permitir dizer que o Cristianismo risca o Budismo. Quanto à dureza relativa de Cristianismo e Hinduísmo, na época em que se encontraram (a partir do século XVI) já o segundo desistira de se expandir, ao mesmo tempo que parecia ter ganho dureza. No seu santuário, o Cristianismo, apesar da protecção política obteve resultados irrisórios: só 2% da população indiana é cristã.
Será antipático para nós, ocidentais, considerarmos o Islão uma elaboração do Cristianismo mas, de uma forma muito simplificada, assim poderá ser feito. Note-se aliás, como o Cristianismo original dos seus primeiros séculos corresponde às terras do Islão da actualidade. Considerando a nacionalidade dos primeiros grandes pensadores da Igreja, eles seriam sírios e egípcios, haveria um argelino e, para além disso, as grandes reuniões magnas para a definição da fé teriam tido lugar na Turquia… Mas, na verdade, o Cristianismo e o Islão parecem nunca se terem encontrado historicamente sem ser de armas na mão.
O Islão, no confronto contra as outras religiões, manifestou uma grande capacidade de atracção das populações nómadas (península arábica, norte de África e Ásia central) e, fora o choque com o Cristianismo, absorveu as religiões existentes (Zoroastrismo, Budismo) nos caminhos até à Índia, onde chegou a ameaçar a hegemonia do Hinduísmo (1/3 da população do sub continente tornou-se muçulmana) mas parece ter perdido o momento. Mas, por via comercial (pacífica) o Islão, contornou a Índia e conseguiu ainda desalojar o Budismo e alguns vestígios de Hinduísmo da Malásia e da Indonésia, onde se tornou religião dominante em tempos relativamente recentes (séculos XIV a XVI). Tão recentes que a chegada dos Espanhóis às Filipinas no século XVI deu hipótese a que tenha havido mais um confronto entre o Cristianismo e o Islão, desta vez no outro lado do mundo. As Filipinas são hoje um país cristão, o único grande país da Ásia que o é.
Em suma o Hinduísmo é uma religião que se deixou de querer expandir e talvez por isso pode ter ganho a capacidade de resistência que o Budismo está a perder, e este último será, destas quatro grandes religiões mundiais, talvez a mais macia na nossa Escala de Mohs. Quanto à decisão de qual a religião mais dura, deixo para uma terceira parte...
Se observarmos num mapa-mundo a distribuição actual das religiões predominantes pelas populações do planeta as designações predominantes incluirão o Cristianismo, o Islão e o Budismo. A China e a Índia constituem duas excepções aquela regra. A segunda porque o Hinduísmo é actualmente uma religião específica sua. A primeira porque resulta numa síntese própria, envolvendo o Budismo, o Taoísmo, o Confucionismo, combinados com a ausência de qualquer prática religiosa, fomentada pelo actual regime chinês. E algo de uma especificidade semelhante acontece no caso japonês. Mas a razão principal para que o mapa-mundo assim apareça reside na circunstância daquelas três religiões serem as que maior sucesso registaram na sua propagação.
Só que curiosamente, das tais religiões com livro, começou por ser o Hinduísmo aquela que mostrou maior dinamismo expansionista na Ásia ao longo do último milénio antes de Cristo, dominando, em primeiro lugar, todo o sub continente indiano de Norte para Sul e projectando-se depois, por via marítima, para o Sudoeste asiático e a Indonésia. Vestígios desse passado em que quase toda a Ásia tropical era dominada pela religião hindu ainda podem ser encontrados em pedra nas ruínas do século XII de Angkor Wat no Camboja e ao vivo na população de Bali, a pequena (e afamada) ilha da Indonésia, onde a maioria da sua população ainda pratica a religião.
O Budismo nasceu também na Índia e, podendo ser considerada (de uma forma muito simplificada) uma espécie de elaboração do Hinduísmo, na nossa Escala de Mohs riscá-lo-ia, pelo menos na sua fase inicial. O Budismo, que chegou a servir de suporte do maior império que a Índia havia visto até então (no século III AC) acabou por fracassar na própria terra de origem que o viu nascer devido a uma espécie de contra-reforma religiosa do Hinduísmo. Mas o Budismo desalojou-o de todo o resto da Ásia: Ceilão, Birmânia, Tailândia, Malásia, Vietname, Indonésia, Tibete, China e… Afeganistão. É pouco conhecida, mas muito curiosa, embora deles se saiba pouco, a história dos reinos greco-báctrios e greco-indianos, descendentes da passagem por ali de Alexandre, que se reclamavam da cultura grega e da religião… budista.
O Cristianismo, que se lhe segue cronologicamente, apareceu em área geográfica muito diversa das duas religiões anteriores, por isso só muito depois houve oportunidade de comparar as suas durezas relativas. Por outro lado, contrariamente ao que se pode saber que aconteceu com a expansão das religiões anteriores, a do Cristianismo raramente deixou de ser feita com apoio militar. Foram raros os episódios onde houve uma expansão religiosa sem o acompanhamento da expansão da tutela política. Mas houve-os: o sucesso da expansão do cristianismo no Vietname (do século XVII ao XIX), na Coreia (no século XX, onde cerca de metade da população sul-coreana actual se assume cristã) ou no Japão (antes de ser interditado em 1638) pode permitir dizer que o Cristianismo risca o Budismo. Quanto à dureza relativa de Cristianismo e Hinduísmo, na época em que se encontraram (a partir do século XVI) já o segundo desistira de se expandir, ao mesmo tempo que parecia ter ganho dureza. No seu santuário, o Cristianismo, apesar da protecção política obteve resultados irrisórios: só 2% da população indiana é cristã.
Será antipático para nós, ocidentais, considerarmos o Islão uma elaboração do Cristianismo mas, de uma forma muito simplificada, assim poderá ser feito. Note-se aliás, como o Cristianismo original dos seus primeiros séculos corresponde às terras do Islão da actualidade. Considerando a nacionalidade dos primeiros grandes pensadores da Igreja, eles seriam sírios e egípcios, haveria um argelino e, para além disso, as grandes reuniões magnas para a definição da fé teriam tido lugar na Turquia… Mas, na verdade, o Cristianismo e o Islão parecem nunca se terem encontrado historicamente sem ser de armas na mão.
O Islão, no confronto contra as outras religiões, manifestou uma grande capacidade de atracção das populações nómadas (península arábica, norte de África e Ásia central) e, fora o choque com o Cristianismo, absorveu as religiões existentes (Zoroastrismo, Budismo) nos caminhos até à Índia, onde chegou a ameaçar a hegemonia do Hinduísmo (1/3 da população do sub continente tornou-se muçulmana) mas parece ter perdido o momento. Mas, por via comercial (pacífica) o Islão, contornou a Índia e conseguiu ainda desalojar o Budismo e alguns vestígios de Hinduísmo da Malásia e da Indonésia, onde se tornou religião dominante em tempos relativamente recentes (séculos XIV a XVI). Tão recentes que a chegada dos Espanhóis às Filipinas no século XVI deu hipótese a que tenha havido mais um confronto entre o Cristianismo e o Islão, desta vez no outro lado do mundo. As Filipinas são hoje um país cristão, o único grande país da Ásia que o é.
Em suma o Hinduísmo é uma religião que se deixou de querer expandir e talvez por isso pode ter ganho a capacidade de resistência que o Budismo está a perder, e este último será, destas quatro grandes religiões mundiais, talvez a mais macia na nossa Escala de Mohs. Quanto à decisão de qual a religião mais dura, deixo para uma terceira parte...
(continua)
Caro A. Texeira, não desiludiste, apesar de eu não estar à espera que houvesse uma terceira parte - isto já parece uma telenovela ;)
ResponderEliminarA razão pela qual estava, e estou, tão curioso em ler as tuas conclusões é que me parece extremamente difícil hierarquizá-las pela dureza - ainda por cima porque tu o fazes do ponto de vista estritamente religioso, ou seja, sem ter a conta o factor "armas na mão". Aliás, desta segunda parte dá para inferir que também para ti é difícil arriscar uma escala de dureza de religiões: pelo que percebi, e concordo contigo, o budismo seria a mais "macia" (não é de estranhar dada a sua natureza intrinsecamente pacifista e não-activista), e acima disso hinduísmo e cristianismo, sendo que ambas se riscam mutuamente. E o lugar do islamismo é para mim um mistério, sendo que a única coisa que me arriscaria a propor seria agrupá-las num mesmo grau de dureza. Continuo a aguardar as "cenas do próximo capítulo"!
Com o texto assim por episódios talvez ele se apresente menos chato... A blogosfera está pejada de textos curtinhos!
ResponderEliminarÉ verdade que o budismo é a religião mais "macia" actualmente mas isso não foi verdade no passado (a partir do Século IV AC...) quando ele superou o hinduísmo no resto da Ásia.
Este último, quando se reformou para sobreviver, "endureceu", mas à custa da sua capacidade de projecção para o exterior: hoje, tirando o caso de Bali e poucos mais, é uma religião exclusivamente da Índia (e dos dali oriundos).
Atacar o hinduísmo no seu "santuário" pode ser complicado mas na verdade ele também não parece querer atravessar-se no caminho de outra religião.