11 agosto 2006

CHANEL Nº5

Há um jogo alegre de que sempre gostei, que era o de procurar o título disparatado na capa de um jornal. Felizmente o Público conseguiu baixar a frequência do jogo de anual, como era outrora (no dia das mentiras, 1 de Abril), para um refrescante disparate semanal, canonicamente afixado à Sexta-Feira.

O de hoje, dia 11 de Agosto, reza assim: França e EUA chegam a acordo sobre o cessar-fogo. Mas tranquilize-se quem pensar, assim à primeira vista, que a animosidade entre americanos e franceses, que levou os primeiros a rebaptizar as batatas fritas retirando-lhes a referência aos segundos, passou para um patamar superior de agressividade…

Nada disso. Percebe-se com a leitura do corpo da notícia que o cessar-fogo em questão se refere ao Médio Oriente onde, como se sabe, o exército israelita e os milicianos do Hezbollah continuam a sua luta. E que os dois parceiros mencionados conseguiram pôr-se de acordo quanto a um documento sobre a cessação das hostilidades.

O desenvolvimento da notícia numa página interior (16), apesar do subtítulo aí existente (Franceses e americanos chegaram a um compromisso para parar imediatamente a guerra no Sul do Líbano) fica-se ainda mais esclarecido que, no actual estágio, o tal documento que origina a notícia ainda tem um caminho penoso a percorrer.

Adquirida automaticamente a concordância do Principado do Mónaco e da Sereníssima República de São Marino, o documento ainda tem de merecer a concordância explícita ou tácita dos restantes membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Reino Unido, China e Rússia) o que está muito longe de ser certo.

Por outro lado, existem ainda muitas incertezas sobre a capacidade de influência que a parceria franco-americana poderá ter sobre os verdadeiros contendores, os que estão a fazer o fogo no terreno e que o deverão cessar. Recorde-se que se trata de algo com que os dois contendores deverão concordar e em simultâneo…

Deve haver uma grande distinção entre duas assinaturas firmadas por dois diplomatas de terceiros países num documento e a obtenção de um efectivo cessar-fogo no terreno de um conflito. E suponho que deveria haver uma substancial diferença na forma como se noticiariam esses dois acontecimentos…

É muito curiosa a forma como a França se propagandeia a ela mesma quando acredita que está a desempenhar um papel na política mundial que dá relevo ao seu estatuto de potência. Quase se sente e se fica inebriado com o perfume contido nessas notícias. E título em causa releva que esta notícia é, de facto, uma notícia muito perfumada

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