22 agosto 2006

AS ELEIÇÕES Á PORTUGUESA

Sendo o povo português tão avesso a confrontos, não podemos ser uns grandes adeptos de eleições (democráticas ou não) que sejam muito disputadas. A prática do Estado Novo (vem mesmo a calhar este exemplo, depois das efemérides dos 100 anos de Marcello Caetano) de eleições vencidas de antemão, de forma esmagadora e sem quaisquer surpresas, são métodos que parecem enraizar-se na nossa maneira de ser.

Ainda a propósito de Marcello Caetano, da primavera marcelista e das eleições legislativas de 1969, ninguém na altura se pareceu surpreender – com excepção dos próprios – pelo facto da oposição – autorizada a concorrer – não ter conseguido obter um único lugar na nova Assembleia Nacional. Suponho que uma esmagadora maioria de deputados, em vez da unanimidade, não retiraria à Acção Nacional Popular (ANP) a legitimidade para governar…

Una anos mais tarde, em Julho de 1972, lembro-me de ter seguido em directo pela RTP da Assembleia, a reeleição de Américo Thomaz pelo Colégio Eleitoral, numa cerimónia que tinha tanto de pomposa como de falha de interesse, havendo apenas um candidato a concurso. As eleições legislativas de 1973, com a ANP concorrendo sozinha, também carregavam a mesma emoção. Quando ouvi na TV que, na comunidade goesa exilada em Timor, a ANP tinha tido 100% dos votos (...25 em 25), fiquei... surpreendido.

Por causa disso, depois do 25 de Abril ficou-se em Portugal com o trauma de evitar a lista única e disputa eleitoral bocejante. Mesmo os comunistas, que eram normalmente tão amigos das amplas frentes unitárias, fomentavam frequentemente o aparecimento de listas alternativas às suas (fossem do MDP ou de Os Verdes…) nas organizações onde eram hegemónicos, para evitar o aspecto unanimista das eleições do fascismo.

Mas, fora da política, e mais de trinta anos passados sobre o 25 de Abril já voltámos à prática de sempre. Seja para dirigir o condomínio, para a direcção da cooperativa ou do clube de futebol são raríssimas as verdadeiras disputas eleitorais. O futebol é um caso a que vale a pena dar destaque porque também tem sido devidamente destacado pela comunicação social os vários actos eleitorais que têm decorrido a ele respeitantes.

Dentro das disputas dentro dos clubes, a última grande disputa séria ocorreu dentro do Benfica, quando se formou uma ampla coligação para afastar da presidência Vale e Azevedo (2000). Entretanto, Pinto da Costa, presidente do FC Porto desde 1982 e sucessivamente reeleito, já bateu o recorde de Américo Thomaz (16 anos) e mesmo de Óscar Carmona (25 anos). E Valentim Loureiro, no Boavista, transferiu, à coreana, o cargo para o seu filho...

Entretanto, quando Artur Jorge tentou disputar a direcção da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) a Gilberto Madaíl nem o número de assinaturas necessárias para se poder candidatar conseguiu reunir... Quanto à Liga de Futebol, recentemente Hermínio Loureiro foi eleito* numa das cada vez mais tradicionais listas únicas. É desagradável olharmo-nos, e concluirmos que em Portugal a disputa política (ou qualquer outra) muito raramente se trava em e tem a ver com o resultado de eleições.

Não serve de consolo, mas reconheça-se que é um hábito antigo. Já no período da monarquia constitucional (1826-1910), as substituições dos governos normalmente começavam com a queda do governo anterior (normalmente por causas extra-parlamentares), depois um novo governo era formado e era este que convocava e organizava as eleições por forma a que lhe dessem a maioria na Câmara de Deputados. Sem surpresas, portanto, genuínas da nossa maneira de ser…

* Como me lembrou um amigo, as reticências de Luís Filipe Vieira, do Benfica, em votar a lista única, por ela não assegurar a mudança que ele julga necessária ao futebol português, não se transmitiram à lista para a Assembleia, votada favoravelmente por ele, e encabeçada por aquele modelo da renovação do futebol português chamado… Valentim Loureiro.

1 comentário:

  1. O pior é que herminio loureiro ainda mantem o cargo de deputado! isso é inadmissivel.

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