A última obra de Hergé, chamada Tintin e os Pícaros, consta de uma história onde Tintin, para salvar os seus amigos, tem de promover um golpe de estado num país sul-americano, substituindo um ditador, o general Tapioca, cujo regime havia condenado à morte os seus amigos, por um outro, um conhecido seu, o general Alcazar, que naturalmente, tão logo chegou ao poder, anulou as condenações.
A moral da história – se a tiver - está repleta de um cinismo de Guerra-Fria idêntico ao da famosa frase atribuída ao presidente norte-americano Harry Truman: Fulano – era um qualquer ditador manhoso sul-americano, talvez Somoza, da Nicarágua - é um filho da puta? Claro que é um filho da puta! Mas é o nosso filho da puta! Neste caso é Alcazar que faz o papel do filho da puta do, por esta vez, amoral Tintin.
Em imagens, a síntese disto faz-se em duas imagens de fundo de página. Na primeira (p.11), a propósito da aterragem do avião que traz Tintin, vê-se uma patrulha de dois homens a passear-se por um bairro de lata, onde está afixado um cartaz de propaganda (Viva Tapioca), na segunda (p.62), o pretexto é a descolagem do avião que leva Tintin, a patrulha lá continua embora com novas fardas, e com o cartaz mudado (Viva Alcazar).
Não deve ter sido coincidência que os capacetes usados pelos polícias durante o regime de Tapioca fizessem lembrar os do exército chileno sob o regime de Pinochet (por sua vez inspirados nos usados pelos alemães durante a Segunda Guerra), nem que os barretes dos polícias do novo regime de Alcazar fossem quase decalcados do modelo usado por Fidel Castro e pelos cubanos.
Em suma e, embora com algumas variações por detrás*, Hergé como que atribuiu a Tapioca o papel do ditador sul-americano de direita e a Alcazar o de ditador sul-americano de esquerda. O fim da história (com uma vitória de Alcazar) é uma novidade porque, à data da sua publicação (1976), a única ditadura latino-americana esquerdista que existia efectivamente era a cubana. Os Estados Unidos asseguravam-se que era assim e que assim continuaria a ser...
Pelos vistos, o fim da Guerra-Fria permitiu que aparecessem novos Alcazares, como o presidente venezuelano Hugo Chavez, que recentemente, ao tomar posse para mais um mandato, fez mais uma das suas profissões de fé onde costuma misturar citações de Lenin, Jesus Cristo, Mao Zedong, Lincoln, Martin Luther King, Ho Chi Min, Che Guevara, Mitterrand, Fidel Castro e, claro, o seu preferido, Simão Bolívar.
E muitas medidas por ele decididas estão a tornar-se deveras preocupantes, como muito bem assinala neste poste Pedro Correia, do Corta-Fitas. Mas, não me colocando na defesa das acções dos Alcazares como Chavez, na Venezuela ou Morales, na Bolívia, muito gostaria de ver os Tapiocas do continente sujeitos a igual escrutínio mediático. Ou será que a Colômbia, o Peru, o Equador ou o Paraguai são todas democracias consolidadas?
A moral da história – se a tiver - está repleta de um cinismo de Guerra-Fria idêntico ao da famosa frase atribuída ao presidente norte-americano Harry Truman: Fulano – era um qualquer ditador manhoso sul-americano, talvez Somoza, da Nicarágua - é um filho da puta? Claro que é um filho da puta! Mas é o nosso filho da puta! Neste caso é Alcazar que faz o papel do filho da puta do, por esta vez, amoral Tintin.
Em imagens, a síntese disto faz-se em duas imagens de fundo de página. Na primeira (p.11), a propósito da aterragem do avião que traz Tintin, vê-se uma patrulha de dois homens a passear-se por um bairro de lata, onde está afixado um cartaz de propaganda (Viva Tapioca), na segunda (p.62), o pretexto é a descolagem do avião que leva Tintin, a patrulha lá continua embora com novas fardas, e com o cartaz mudado (Viva Alcazar).
Não deve ter sido coincidência que os capacetes usados pelos polícias durante o regime de Tapioca fizessem lembrar os do exército chileno sob o regime de Pinochet (por sua vez inspirados nos usados pelos alemães durante a Segunda Guerra), nem que os barretes dos polícias do novo regime de Alcazar fossem quase decalcados do modelo usado por Fidel Castro e pelos cubanos.
Em suma e, embora com algumas variações por detrás*, Hergé como que atribuiu a Tapioca o papel do ditador sul-americano de direita e a Alcazar o de ditador sul-americano de esquerda. O fim da história (com uma vitória de Alcazar) é uma novidade porque, à data da sua publicação (1976), a única ditadura latino-americana esquerdista que existia efectivamente era a cubana. Os Estados Unidos asseguravam-se que era assim e que assim continuaria a ser...
Pelos vistos, o fim da Guerra-Fria permitiu que aparecessem novos Alcazares, como o presidente venezuelano Hugo Chavez, que recentemente, ao tomar posse para mais um mandato, fez mais uma das suas profissões de fé onde costuma misturar citações de Lenin, Jesus Cristo, Mao Zedong, Lincoln, Martin Luther King, Ho Chi Min, Che Guevara, Mitterrand, Fidel Castro e, claro, o seu preferido, Simão Bolívar.
E muitas medidas por ele decididas estão a tornar-se deveras preocupantes, como muito bem assinala neste poste Pedro Correia, do Corta-Fitas. Mas, não me colocando na defesa das acções dos Alcazares como Chavez, na Venezuela ou Morales, na Bolívia, muito gostaria de ver os Tapiocas do continente sujeitos a igual escrutínio mediático. Ou será que a Colômbia, o Peru, o Equador ou o Paraguai são todas democracias consolidadas?
Ou, alternativamente, porque serão apenas os projectos de poder pessoal de Hugo Chavez a merecer a nossa melhor atenção?
* O regime europeu que apoia Tapioca, o da Bordúria, havia servido numa história anterior (O Caso Tournesol) como exemplo para retratar os regimes socialistas (e muito pouco democráticos…) do Leste europeu do pós-guerra.
* O regime europeu que apoia Tapioca, o da Bordúria, havia servido numa história anterior (O Caso Tournesol) como exemplo para retratar os regimes socialistas (e muito pouco democráticos…) do Leste europeu do pós-guerra.
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