Uma das surpresas que muitos estudantes de alemão tiveram ao tentarem conversar com um falante nativo da língua foram as reacções normalmente pouco acolhedoras para quem manifestava a cortesia de os estar a interpelar na sua língua materna, apesar dos pontapés na gramática (e se o alemão é um idioma que os suscita…), que são naturais num iniciado de qualquer idioma.
É um conceito – o de considerar apenas os estrangeiros que se exprimam sem mácula em alemão - que parece ser cultural. O comportamento dos alemães parece funcionar ao contrário da maioria dos falantes de quaisquer outros idiomas maternos, onde o exemplo mais comum é o do idioma inglês, que costumam acolher normalmente com simpatia quem se esforça por falar no seu idioma, embora o possa assassinar no esforço.
Eu até aceito que possa haver excepções. Por exemplo, eu até compreendo que qualquer falante de inglês não tenha nenhuma razão para ser simpático para com um espanhol depois de o escutar a falar o seu idioma. E, já agora e nem de propósito, convém dizer que os alemães – em média - estão muito longe de se qualificarem nos lugares cimeiros quanto ao rigor da sua pronúncia de inglês…
A respeito das memórias do ex-chanceler Schroeder que estão a ser publicadas pelo semanário alemão Der Spiegel, é curioso notar as razões com que ele fundamenta a sua antipatia por Bush, associadas ao facto de Bush ter um estilo – conversando com Deus - em que transmite uma desconfortável mistura entre laico e religioso. São razões que dizem muito acerca de quem é Bush.
Em contrapartida, os rasgados elogios sobre a personalidade de Putin – parece não haver no livro nenhuma referência à confortável avença que a empresa petrolífera estatal russa pretendia atribuir a Schroeder… - que, passando da inteligência para o carácter, tocam na forma física para rematarem (cá está!) no domínio pleno da língua alemã, dizem muito mais sobre a personalidade de Schroeder do que na do senhor do Kremlin.
Equivale a vários capítulos de um qualquer livro sobre a forma como os alemães se relacionam com outros povos este pormenor de Schroeder ao qualificar como uma virtude a habilidade de alguém falar alemão sem erros gramaticais. É que é nestas ocasiões que nos apercebemos mais claramente porque é que o conceito de softpower é perfeitamente intraduzível para o idioma alemão…
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