11 outubro 2006

AS INDEPENDÊNCIAS AO LONGO DO SÉCULO XX (5)

2) Os Ajustamentos Após a Grande Guerra (1917-1932)
Sem procurar aligeirar um tema que está longe de o ser, podemos comparar a 1ª Guerra Mundial a uma final de um jogo de futebol que terminou empatado no tempo regulamentar, com os jogadores exaustos. No prolongamento desse jogo, entrou um substituto folgado (os Estados Unidos em substituição da Rússia), que acabou por ser decisivo para o resultado.

Os cerca de quinze anos que se lhe seguem vão dar origem ao aparecimento de oito novos países. Aproximadamente uns 3% da população mundial ganharam assim um protagonismo próprio. Quem são? Basicamente são os países da Europa de Leste, nascidos da implosão simultânea dos Impérios Russo e Austro-Húngaro – Finlândia, República Checa (na altura, Checoslováquia), Polónia – e, por outro lado, os países árabes mais importantes do Próximo Oriente, nascidos, por sua vez, da implosão do Império Otomano – Iraque, Arábia Saudita, Jordânia.

O aparecimento destes últimos é um salto qualitativo de significado em relação à fase anterior – é reconhecido aos países pertencentes ao grupo civilizacional islâmico a capacidade de se auto governarem. As potências europeias ocidentais ficaram reféns da sua propaganda de guerra, apelando para o nacionalismo árabe como seu aliado na luta contra o domínio otomano. Finda a guerra, como acontecia nos contos tradicionais das mil e uma noites, tornou-se impossível voltar a mandar o génio para dentro da lâmpada mágica. Mesmo assim, as independências foram concedidas de uma forma comedida, e os novos países eram todos monarquias conservadoras – a Jordânia (1924), o Iraque (1932) e a Arábia Saudita (1932). Por arrastamento, também o Egipto foi contemplado em 1922. Por detrás de todas elas estava o tutelar poder britânico. E as, estrategicamente importantes, regiões costeiras da Síria, Líbano e Palestina não entravam neste processo de emancipação. Só que, por outro lado, se tornou cada vez mais difícil aos britânicos explicar, especialmente aos indianos, porque razão os árabes possuiriam a maturidade cultural para alcançarem a independência que era negada aos outros.

Na Europa, ajustaram-se as contas de um conflito prolongado entre britânicos e irlandeses: a Irlanda tornou-se independente em 1921, mas, nos termos britânicos, com o Ulster maioritariamente protestante a permanecer ligado ao Reino Unido. As sequelas do facto ainda aí estão, nos dias de hoje. Os outros novos países eram o resultado do retalho da Europa de Leste, em cima dos cadáveres dos Impérios Alemão, Austro–Húngaro e Russo. Surgidos quase todos formalmente em 1919, a configuração das novas nações (para além das supracitadas Checoslováquia, Polónia e Finlândia, havia as novas Áustria e Hungria, os três países bálticos e novos territórios para a Roménia e a Jugoslávia) adicionavam 11.000 quilómetros de fronteiras novas ao velho continente.

Estes resultados são já uma vitória do princípio das nacionalidades, constante dos catorze pontos do presidente norte-americano Woodrow Wilson. Mas, tal qual acontecia com os magnatas de fortuna recente, os Estados Unidos desta fase do pós guerra não estavam ainda à altura de arcar com as suas responsabilidades sociais no panorama da política mundial. A ideologia de Wilson não teve um seguimento, na prática, por parte dos seus sucessores na cadeira presidencial americana. Quem devia (mandar) não queria, e assim, mandava quem podia. Os resultados demorariam vinte anos a evidenciar-se: a 2ª Guerra Mundial.

Mais curioso, foi o que não aconteceu no Leste da Europa. Também aqui havia uma ideologia nova, a dos bolcheviques, os novos dominadores dos restos do antigo Império Russo – um território muito extenso, habitado por múltiplas nacionalidades. Era de esperar, de uma ideologia que se anunciava libertadora, um fomento da emancipação dos povos. Nada disso. A construção lógica de Lenine, o líder bolchevique, é poderosa pela força da sua subtileza: para os comunistas, a luta social precede, em importância, qualquer outra, mesmo a luta nacional. O poder soviético só estaria preparado para reconhecer as aspirações nacionais dos povos do antigo império russo se eles se viessem a constituir como estados socialistas. Nas condições reais existentes na época, é uma maneira tortuosa de dizer que não, proclamando que sim. Só com o apoio do Exército Vermelho (o exército bolchevique), qualquer estado socialista não russo poderia emergir. E o Exército Vermelho era sinónimo do controle de Moscovo. A coroar esta Revolução de 360º, a nomeação de Estaline (um georgiano) para o lugar de Comissário das Nacionalidades (não russas), antecipava um método, muito peculiar (...), de resolver todas as questões, nacionais ou outras.

Repartidos os comentários entre o que aconteceu e o que não aconteceu, os anos 30, terminam esta segunda fase, com a ordem internacional um pouco em autogestão, a Itália invadindo a Etiópia, o Japão a China, lutas internas entre fascismo e comunismo na Europa, uma recessão económica terrível. Mas, em termos de ordem internacional, a par dos europeus e embora de uma forma mitigada, já se reconhecia aos países árabes muçulmanos a capacidade de autodeterminação.

1 comentário:

  1. Muito interessante a interpretação das não independências a leste! Espero a continuação.

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