Considerando a boa recepção como foi acolhida a metáfora do pombo xadrezista, permitam-me mais esta descrição, mais analítica mas igualmente cáustica, de um outro fenómeno que costuma também perturbar os protocolos comunicacionais da modernidade em rede. Em que consiste esse tal de Efeito Dunning-Kruger? Diz-nos a wikipedia (que é, paradoxalmente, um dos maiores promotores indirectos desse Efeito...) que é «o fenómeno (psicológico) pelo qual indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto acreditam saber mais que outros mais bem preparados, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos; é a sua incompetência que os restringe da habilidade de reconhecer os próprios erros». Como se deduz do gráfico acima (em ordenadas, para além do conhecimento objectivo, valoriza-se também a perspectiva subjectiva desse conhecimento), o grau de confiança de um iniciado (Beginner) tende a crescer exponencialmente (curva dourada) nas fases iniciais da aprendizagem até uma fase intermédia (Hazard) quando ele começa a vislumbrar até onde pode ir o desenvolvimento do tema ou da disciplina. Paradoxalmente, costuma ser entre aqueles que entendem muito mais sobre o assunto (Expert) que se encontram os mais precavidos quanto à qualidade dos seus conhecimentos. Comprovado por trabalhos de campo realizados pelos dois senhores que lhe deram o nome, David Dunning e Justin Kruger, as conclusões foram apresentadas num trabalho que ficou concluído em 1999 e que teve a duvidosa honra de receber o Prémio IgNobel de Psicologia no ano seguinte (2000).
É caso para evocar o velho ditado «Ri melhor quem ri por último», pois o século XXI que despontava assistiu à proliferação mediática dos Tudólogos, comprovando a substância das conclusões do estudo. É o efeito Dunning-Kruger que permite à classe dos que são sempre convidados a opinar sobre os temas que constam da actualidade, têm aquela atitude auto-satisfeita consigo mesmo, dizendo coisas «hoje sobre a crise financeira, amanhã sobre o desaparecimento de Michael Jackson ou a urgente necessidade de economizar água da torneira, e ainda, depois de amanhã, sobre a guerra do Afeganistão» (citação retirada do livro Les éditocrates). Tanta dispersão de temas, que lhes é imposta pela agenda mediática, tem como consequência que, regressando ao gráfico acima, sobre a maioria daquilo que comentam, os conhecimentos dos Tudólogos sejam apenas os de um Beginner em fase de transição para Hazard (e isso só para os que preparam previamente as suas intervenções...). Mas o frenesim como os temas se encadeiam na agenda mediática, impede, até mesmo os mais conscienciosos, de atingirem o tal patamar a partir do qual o conhecimento faria que a petulância se desfizesse. O resultado de anos encadeados de tudologismo, tende a tornar-se cómico. A imodéstia intelectual é um traço comum. Haverá dezenas de exemplos a que recorrer, mas fiquemo-nos por este caso crasso, abaixo, um José Manuel Fernandes que a biografia dá como um lisboeta típico, mas cujos sentidos estão tão embotados por anos a fio das distorções do Efeito Dunning-Kruger, que ele se sente com autoridade para perorar «do país que Lisboa não sabe que existe». O provérbio dizia que a ignorância era atrevida. Actualmente, a ignorância tornou-se insolente.
Penso que nem no tempo de Salazar e da União Nacional se encontravam fascistóides tão refinados como algumas das "pérolas" que hoje opinam no Observador.
ResponderEliminarBrilhante. Posso colocar no Facebook?
ResponderEliminarMas olhe que se for mesmo ver aquilo que se escrevia e dizia no tempo de Salazar e da União Nacional, a começar pela década mais entusiasmada de 1930-40, irá encontrar proclamações ainda mais exaltadas. Algumas de grandes figuras do "antifascismo" e da futura oposição a Salazar como Humberto Delgado, Henrique Galvão ou Rolão Preto.
ResponderEliminarClaro que pode, Fernando Frazão. Isto são aqueles fenómenos que já demos por eles há muito tempo nas redes sociais, não sabíamos é que têm nomes pomposos.
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