06 abril 2015

CONVERSAS À QUINTA (II)

Em finais de Julho do ano passado descobria-as, às conversas à quinta, e até aqui dei nota do programa, elogiando-o, uma tertúlia semanal que se prolonga por cerca de três quartos de hora com a participação de Jaime Gama e de Jaime Nogueira Pinto e a mediação(?) de José Manuel Fernandes, cujos vídeos estão acessíveis numa das páginas do Observador. Desde aí que me tornei espectador regular, sempre com gosto, muitas vezes com proveito. O tema da conversa da semana transacta (e parece ser sempre José Manuel Fernandes que o escolhe), quiçá pela quadra pascal, teve uma preocupação religiosa e centrou-se na actuação nestes dois últimos anos de pontificado do Papa Francisco. Tema mortiço não fora um momento de José Manuel Fernandes à José Manuel Fernandes, caricato pela preocupação desvelada em não mostrar quanto se encontra intelectualmente vários furos abaixo dos seus interlocutores... e mostrando-o com todas as letras. Dizia ele em lançando a primeira pergunta a Jaime Gama (aos 10:50):

- (...) [Este Papa] escolhe o nome de Francisco, que muitos associam não curiosamente a São Francisco Xavier, que fundou a Ordem dos Jesuítas, mas a São Francisco de Assis que fundou a Ordem dos Franciscanos, mas com uma certa...
É aqui que é interrompido por Jaime Nogueira Pinto:
- O fundador dos Jesuítas é Santo Inácio de Loyola...
- Mas São Francisco Xavier era...era... dos primeiros. Uh... Uh... São Francisco de Assis, portanto, muito ligado à ideia de uma igreja pobre, de uma ideia despojada (...).
Como se percebe, podia pairar a erudição no ar, mas é precisamente nestes momentos que se distingue quem coleccionou os factos pela rama e quem lhes conhece as raízes. Pareceu-me que José Manuel Fernandes ia começar por dizer uma coisa e acabou por dizer outra, confesso aliás que me surpreendeu aquela insinuação sobre o nome do pontífice actual poder estar associado ao patrono dos missionários. O nome de Francisco na Igreja Católica é automaticamente associado ao seu homónimo de Assis. É um nome de referência na Igreja Católica já deste os tempos medievais, a Ordem que adoptou o seu nome foi fundada nos princípios do Século XIII. Até num sentido menos erudito e mais lúdico, José Manuel Fernandes deveria ter retido que é a essa Ordem que pertence o protagonista de O Nome da Rosa, cuja acção decorre em 1327. A Ordem dos Jesuítas, de que aliás Francisco foi o primeiro membro a ser eleito papa, só apareceu (de forma pujante, reconheça-se) quase 350 anos depois. Mais do que isso: se o Cardeal Bergoglio quisesse, após a eleição, assumir o gesto sugerido mais acima por José Manuel Fernandes em homenagem à sua Ordem religiosa de origem, e tendo demonstrado que não se importava com as tradições adoptando um nome nunca escolhido, poderia ter optado pelos nomes de Inácio ou de Francisco Xavier (O Cardeal Luciani já rompera com essa tradição do nome único em 1978 ao escolher o nome de João Paulo I).

Não fosse a qualidade envolvente do programa e nada disto incomodaria, mas assim, José Manuel Fernandes destaca-se: creio que é aquilo que antigamente se designava pela expressão de ir para a oral com a matéria colada com cuspo...

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