26 abril 2006

CONTORCIONISMOS


Diz-nos o blogue Defender o Quadrado que, apesar de não ter um detector de spin, tem mostrado muita intuição para descobrir quais serão as novas tendências da moda discursiva do comentador político para a temporada, que nos iremos habituar a ouvir com bastante frequência a expressão espuma política na próxima primavera de 2006.

Sem me atrever a rivalizar com a riqueza estilística daquele blog quero, a propósito do mesmo episódio do discurso presidencial do 25 de Abril em que faz aquela previsão, recuperar uma outra expressão, menos elaborada, que me ocorreu: contorcionismo. Foi mesmo nessa actividade circense, repleta dos seus segredos, que pensei ao ouvir ontem os comentários de Jerónimo e de Louçã no seguimento do discurso de Cavaco Silva.

Eu bem sei que as habilidades de circo até estão com a popularidade em alta, vide o actual concurso da TVI. E, valha a verdade, eu até prefiro ver Louçã no ecrã em qualquer actividade circense em vez de José Castelo Branco, mesmo que seja tirar pombinhos de uma cartola. Aliás, política e metaforicamente Louçã é mesmo um especialista em tirar animais da cartola.

Mais a sério, chega a tornar-se caricato ver os dois paladinos da esquerda arredondar o mais possível os comentários de forma a dar o mínimo cariz elogioso a um discurso manifestando uma evidente preocupação social, que teria sido muito bom e ido ao encontro das preocupações que têm manifestado, não fora ter sido proferido por um senhor chamado Aníbal Cavaco Silva.

Ora, sem um mínimo de honestidade intelectual e para facciosismo político puro podemos perfeitamente prescindir da democracia representativa e de representantes. O senhor Jorge, do café defronte de minha casa, está perfeitamente habilitado para fazer um discurso a quem o queira ouvir, sobre a corrupção dos políticos, que só vão lá para se encher, que só querem é poleiro e que são um preguiçosos. Ah, e há sempre uma explicação suplementar que justifica qualquer mau resultado do Benfica.

Se é para isto e havendo já mais de dez milhões de telemóveis em Portugal poderíamos implementar a primeira verdadeira democracia directa em que a legislação fosse votada por SMS. É indubitável que os facciosismos de todos os senhores Jorge de todo o Portugal (D.O.P.*) seriam muito mais genuínos e muito mais legítimos do que as habilidades tácticas de Jerónimo e Louçã. Isso sim, seria um verdadeiro choque tecnológico!

Por falar nele, já verifiquei que José Sócrates, como todos os primeiros-ministros que o antecederam fizeram com os discursos de Sampaio, “pegou” no de Cavaco de “cernelha”**. Será que se prepara para lhe fazer o mesmo que se fizeram aos outros discursos?

*Classificação de produto agrícola: Denominação de Origem Protegida.
** Na pega de cernelha, ao contrário da pega de caras, os forcados põem-se ao lado do touro para o dominar.

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