Havia uma história antiga que descrevia certa cidade onde o sector da restauração era não só bastante disputado mas onde havia também a particularidade dos concorrentes se concentrarem todos numa mesma rua. A uma esquina da rua, um dos concorrentes proclamava-se em cartaz o melhor restaurante da cidade, para alguns metros adiante um seu rival se proclamar o melhor restaurante do país, seguido de um outro que os batia na imodéstia de se considerar o melhor restaurante do Mundo até que se chegava ao do fundo da rua, que apostava no impacto psicológico dos superlativos dos rivais a que fora submetido o potencial cliente e que procurava pôr senso na escalada, assumindo-se simples e prosaicamente como o melhor restaurante desta rua...
Os superlativos têm isso: se lhes pregarmos uma rasteira, eles estatelam-se. Quando a BBC convocou 177 críticos para escolher o melhor filme do século e anuncia que "Mulholland Drive" assim foi considerado, põe-se um evidente problema de aritmética que nada tem a ver com o número - robusto - de críticos - decerto competentes - a que a BBC pediu a opinião. É que o século XXI ainda não completou 16 anos, o que corresponde a menos de 1/6 da duração normal de um século. Será talvez prematuro dispormo-nos a estas classificações seculares; o filme de David Lynch não sairia rebaixado se, como o restaurante do fim da rua, fosse reclassificado como o melhor mas apenas dos últimos 16 anos. Afinal o século XXI ainda nos reserva mais 84 anos de produção cinematográfica...
E que bem pode superar a que foi produzida até agora. Atendendo ao precedente do século XX, analisando este calhamaço que recomenda os 1001 filmes para ver antes de morrer (publicado em 2003 e ao qual, confesso, nunca prestei demasiada atenção...), verifica-se que só 5 deles foram feitos até 1916...
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