O primeiro-ministro demissionário e recém-demitido concedeu uma entrevista à TVI/CNN. Se ainda não o tiver feito e estiver interessado, quem quiser que a veja. Mas o que eu quero aqui destacar não é a entrevista em si, mas as repercussões da mesma, algumas delas provocadas pela forma distorcida como António Costa apresentou os factos e que não vejo a serem devidamente contraditadas, como elas mereceriam. O aspecto da distorção da narrativa de António Costa que mais me incomoda é o pressuposto de que a sua demissão se deverá exclusivamente ao parágrafo que se sabe ter sido adicionado ao comunicado pela própria procuradora-geral da República. Vale a pena recordar as palavras do primeiro-ministro, tal qual a TVI o cita:
«Quem exerce as funções de primeiro-ministro não pode estar sob uma suspeita oficial. Aquele parágrafo foi determinante. Há quem pergunte e se não tivesse havido o parágrafo? Não adianta discutir o que teria feito se.(...)
Eu sou um daqueles que considera que vale a pena e faz todo o sentido discutir o que ele teria feito se - não tivesse havido o tal parágrafo. É que o ênfase que António Costa atribui ao parágrafo, evita-lhe a complicação de explicar à opinião pública como é que ele, já político experimentado, com quase cinco anos no cargo, foi capaz de escolher para seu chefe de gabinete uma pessoa que se vem a descobrir nos dias imediatos à sua demissão que gosta de coleccionar notas de banco como separadores de livros ou acondicionadores de garrafas de vinho. Este episódio seria e será, só por si, politicamente insustentável para o primeiro-ministro porque, decerto de maneira privada, mas também publicamente, houve quem o tivesse alertado na época para a inconveniência daquela escolha. Costa teimou, mas com a consciência do preço a pagar se corresse mal. E correu mal. E Costa teria que vir abaixo com as notas do chefe de gabinete. Das regras do jogo político, extrai-se que, se a opinião pública simpatizará com as vítimas de cabalas que os derrubam, mas não suporta ter otários no cargo de primeiro-ministro... E compete aos jornalistas/comentadores apresentar a história toda, não apenas a versão truncada que convém ao primeiro-ministro.
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