29 dezembro 2023

A CANÓNICA INCOMPETÊNCIA DOS JORNALISTAS PORTUGUESES SOBRE O NOTICIÁRIO INTERNACIONAL

Como de costume, quando o noticiário é internacional, as notícias chegam a Portugal já formatadas e os jornalistas cá do burgo nem se dão ao trabalho de mexer no que já vem acondicionado para leitor engolir. Como acontece no caso abaixo, quando alguns estados se pronunciam pela interdição de que Trump apareça nos boletins de voto, considerado «inelegível» por causa das suas tentativas para tentar sabotar o acto eleitoral de 2020 e por causa da sua conduta durante os acontecimentos que levaram à invasão do Capitólio a 6 de Janeiro de 2021. Aquilo que os jornalistas portugueses não estão a destacar devidamente é que estas iniciativas estão a ser tomadas por facções de eleitores republicanos e que as suas petições se destinam à exclusão de Trump durante as eleições primárias do partido republicano e não durante as eleições presidenciais propriamente ditas. Portanto, tratar-se-á de uma espécie de guerra civil entre republicanos e não propriamente, pelo menos para já, de uma manobra dos democratas rivais para que Trump concorra. O que está em causa, nesta fase dos acontecimentos, é a exclusão de Trump às eleições de delegados à convenção republicana que escolherá o candidato daquele partido às eleições de Novembro de 2024. Nessa convenção haverá 2.467 delegados com direito de voto. O estado do Maine, que justifica este cabeçalho abaixo, estará representado nessa convenção por... 20 delegados (0,8%). Quanto ao estado do Colorado, o primeiro estado que terá barrado o nome de Donald Trump, esse estará representado por... 37 delegados (1,5%). Em contrapartida, o estado da Califórnia que, no mesmo dia do Maine, se pronunciou em sentido oposto, permitindo a presença de Trump nos boletins de voto das primárias republicanas no estado, esse estará representado por... 169 delegados (6,9% do total - o que corresponde ao triplo dos delegados dos dois outros estados somados). Como se percebe, a importância atribuída pelos cabeçalhos não tem nada a ver com a repercussão dos acontecimentos... A Califórnia vale eleitoralmente o triplo dos outros dois estados mas é ao que aconteceu nestes últimos que se dá o destaque noticioso. E, para mais, qualquer das duas decisões, do Colorado e do Maine, estão pendentes de recursos. Como se constata, está-se ainda muito longe de poder noticiar que Donald Trump se verá impedido de disputar as eleições presidenciais de Novembro de 2024 em condições idênticas às do seu rival - que será previsivelmente o presidente Joe Biden. Mas esse é o formato noticioso para quem se disponha a ler superficialmente notícias como a que aparece abaixo. Pior do que isso: é com base nesse formato incompleto e distorcido que vemos o assunto a ser depois discutido pelos opinadores. E, como neste momento, os media estão a substituir a informação pela opinião, o efeito perverso de tudo isto é que muitas vezes o que há que considerar sobre o opinador é que ele não faz a mínima ideia sobre aquilo de que está a falar...

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