Na história política da América recente, ficou famoso o momento (televisivo) em que uma assessora da Casa Branca de Donald Trump, cunhou a (ridicularizada) expressão «Factos Alternativos» - leia-se aqui. Mas a questão é que, seis anos e meio depois e por muito que aquela prática do uso de factos alternativos (mentiras) tenha sido denunciada e parodiada na altura, podemos continuar a apreciá-la em todo o seu "esplendor", em prol do mesmo Donald Trump, mesmo já afastado do poder. Neste momento há uma narrativa "consagrada" na comunicação social americana, que estabelece que todas as recentes acusações judiciais que têm levado Donald Trump a comparecer em tribunal por sucessivas acusações distintas (1) (2) (3), se têm reflectido num aumento da sua popularidade. É o que inspira o cartoonista acima, num desenho que foi publicado esta semana.
Essa será a presunção, mas o que é que nos dizem os factos não alternativos? Retirados do site político FiveThirtyEight, adiciono aqui dois gráficos que acompanham o que tem sido a popularidade de Donald Trump, avaliada em função das múltiplas sondagens que se fazem (os resultados destas são os pontos esbatidos; as linhas mais escuras são o cálculo das médias de todas essas sondagens). Há um gráfico que mostra a popularidade de Trump durante o período em que exerceu a presidência (acima) e outro desde que a abandonou (abaixo). Como se pode observar, a impopularidade que Donald Trump granjeara à data da saída da Casa Branca, consequência do assalto ao Capitólio em 6 de Janeiro de 2021 (38,6% - 57,9%), é praticamente a mesma de hoje (39,5% - 56,3%). E estes é que são os factos acerca da evolução da popularidade de Donald Trump.
Que a popularidade de Donald Trump não tenha entretanto decaído por causa daquilo que tem vindo a ser revelado a respeito da sua conduta, isso pode ser chocante, já que daí se deduz que há uma minoria significativa de americanos que mostra não atribuir qualquer valor ao cumprimento das virtudes cívicas por parte dos seus representantes políticos, mas aí trata-se de toda uma outra discussão. Mas não é essa a narrativa - porventura assustadora, de uma América profundamente dividida, que não compartilha os mesmos valores - não é isso que o aparelho informativo tem contribuído para dar ao público como estando a acontecer. Alguns desse aparelho promovendo activamente os factos alternativos e elaborando em cima deles como se fossem verdade, outros pecando pela omissão de não dar relevo aos factos que não são alternativos como este caso do falso aumento da popularidade de Trump. Abaixo, temos mais um cartoon com os factos como os simpatizantes de Donald Trump gostariam que fosse. Só que não é verdade.
Como também não é verdade este outro cartoon da revista The Economist. A popularidade de Trump até pode ser muito vocal e impressionar o circo mediático, mas, se as sondagens estiverem certas, não evoluiu quase nada desde que ele abandonou - a mal - a presidência dos Estados Unidos. Eu até percebo que esta outra narrativa da subida da sua popularidade nas sondagens até tenha um enredo muito mais atractivo para ser contado aos leitores, mas o jornalismo não é para ser ficção, muito menos um instrumento para manipular a percepção da opinião pública.
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