Ontem, a meio da cobertura em directo da visita (surpresa!) de Marcelo à Ucrânia, o presidente tem um daqueles arranques cénicos, que parecem mesmo concebidos para serem interpretados diante das câmaras de TV quando em directo (veja-se o canto superior direito da frame acima) e, rapando de um bocado de jornal que, diz ele, apanhara numa das trincheiras que acabara de visitar, chama por Pacheco Pereira (que andava por ali, enquanto Cravinho - ao fundo - já se preparava para entrar no carro), para lho entregar, o «resto de um jornal», como se de uma relíquia se tratasse, que o comentador televisivo acolhe com as duas mãos gratas, destinando-o de imediato para a sua Ephemera... Todo o episódio não dura mais do que 15 segundos, mas, para os que a viram, terá destruído toda uma reputação de distanciamento crítico em relação à conduta presidencial que Pacheco Pereira tenha andado a cultivar ao longo de algumas temporadas consecutivas do programa Quadratura do Círculo, Circulatura do Quadrado, Princípio da Incerteza, enfim, aquele programa de comentário político que, saltitando de um canal para outro, tem de ter obrigatoriamente José Pacheco Pereira a comentar, com outros.
Em primeiro lugar, e como aposto que notaria o mesmo José Pacheco Pereira, caso estivesse sentado na cadeira do estúdio a responder às perguntas de Carlos Andrade, desmontemos esta história de qualificar esta visita de ter sido de surpresa. Ela só terá sido surpresa para as audiências portuguesas. Porque se ela foi discutida previamente com quase toda a gente, incluindo o PCP, a probabilidade é elevadíssima que os russos já soubessem com antecedência da visita de Marcelo. Se os russos não bombardearam a trincheira que o Marcelo visitou foi porque: a) os ucranianos escolheram uma trincheira tão segura e turística quanto aquelas que existem da Primeira Guerra Mundial na Flandres; b) também pode ser que os russos, ao contrário de António Costa, não estejam nada empenhados em pregar partidas ao Marcelo, bombardeando-lhe a trincheira com um drone, enquanto ele lá estivesse. Deixaram-no ir fazer o turismo dele à vontade, talvez. O que nos leva ao segundo tema crítico de um José Pacheco Pereira apreciando os acontecimentos de fora: o que é que lá estava a fazer o mesmo José Pacheco, na comitiva presidencial? Naturalmente, foi convidado. Mas a que título? Se a resposta for: o Marcelo convida quem quiser e o Pacheco Pereira sempre gostou de ir a estas coisas, então, para a próxima vez, registem que há mais quem gostasse de ir, no lugar do ministro Cravinho por exemplo, que sempre apareceu a bocejar e com cara de frete. Finalmente, por último, e regressando ao episódio acima descrito, as pessoas que se arrogam de conhecer Marcelo (como Pacheco Pereira já o fez repetidamente), decerto que lhe conhecem estes arranques cénicos. E aí, uma de duas: ou se demarcam, contrapondo um registo sóbrio à excitação e à teatralidade, em coerência com tudo o que lhes havíamos ouvido comentar anteriormente, ou então alinham na pantomina, perdendo a credibilidade, tornando-se em mais um sucessor de frei Tomás. Enfim, limpem-se (os dois) ao jornal.
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