(Republicação)
3 de Agosto de 1943. Há quase um mês que os exércitos aliados progrediam na conquista da Sicília e o panorama apresentava-se de tal forma favorável que os seus comandantes se podiam dedicar àquelas tarefas que, sendo importantes e caindo bem entre a moral dos homens, não são prioritárias. Como visitar os feridos. Era o que fazia há precisamente oitenta anos o general George S. Patton (1885-1945), o comandante do VII Exército dos Estados Unidos, num hospital de campanha situado em Nicosia, Sicília*. Os americanos estavam a necessitar urgentemente de um general-herói que pudesse rivalizar com Montgomery e o seu VIII Exército, também presentes na Sicília e a que os britânicos davam uma incessante promoção. A acompanhar Patton, havia toda àquela corte que gravita à volta dos grandes chefes militares (e outros) nestas deslocações e que naquele dia foram testemunhas de um incidente anómalo, quando o general desatara a agredir um soldado que fora admitido por stress de combate, chutando-o para fora da tenda por cobardia. E assim ficou estragada uma operação de relações públicas concebida para promover a imagem de um general que se preocupava com os seus homens. Pelos vistos, preocupava-se mais com uns do que com outros. Mais do que abafado, aquilo que ocorreu foi desvalorizado, a começar pela própria vítima, o soldado Kuhl, na narrativa que fez na carta que escreveu para casa. O problema é que, passada uma semana, a cena se repetiu, precisamente nas mesmas circunstância e agora com outro soldado (Bennett) afectado pelos mesmos sintomas, com Patton a exceder-se ainda mais, batendo-lhe mas também apontando-lhe o seu famoso colt .45 de coronha de marfim.
A cena abaixo, é uma reconstituição que aparece no filme Patton de 1970 (protagonizado por George C. Scott) e que mistura os dois episódios. Dessa outra vez, o episódio teve que ser mesmo abafado, embora os circuitos informais rapidamente o levassem ao conhecimento de todo o exército, incluindo Eisenhower, o superior imediato de Patton. Ao contrário de outros, Patton não era considerado um general incompetente, daqueles que subsistem em tempo de paz, mas que as insuficiências do comando de operações em tempo de guerra obrigam a afastar da ribalta**. Porém, Patton revelava-se uma desgraça em termos das relações públicas necessárias para o alto comando que desempenhava. Eisenhower e George Marshall acima dele obrigaram-no a pedir desculpas a quem ofendera e teve que penar quase um ano sem exercer qualquer comando de importância. Entretanto, passados três meses, o que acontecera acabou por se saber em Washington DC, adicionando uma componente política doméstica à controvérsia. Mas, apesar de ingrata, George Patton era aquele género de personagem castiça que valia a pena promover para propaganda de guerra. Coisa distinta era a simpatia dos homens sob o seu comando. Em resposta à alcunha que a propaganda arranjara a Patton de Old Blood and Guts (o Velho Sangue e Tripas), o comentário dos seus soldados, cínico e pouco simpático para com essas fórmulas, era que as tripas podiam ser as de Patton mas que o sangue era o deles...
* Nos relatos mais distraídos/ignorantes, o acontecimento é transferido para Nicósia, mas a capital de Chipre...
** Caso de Lloyd Fredendall, antecessor de Patton à frente do II Corpo e recambiado em Março de 1943 para os Estados Unidos.
** Caso de Lloyd Fredendall, antecessor de Patton à frente do II Corpo e recambiado em Março de 1943 para os Estados Unidos.
Sem comentários:
Enviar um comentário