«...Eu não me esqueço...», como dizia Vito Corleone. Apesar de todos os comentários pacificadores a celebrar a saída de Portugal do procedimento por défice excessivo, eu não me esqueço nem quero esquecer como a liderança deste país pareceu incapaz de monitorizar devidamente quais estavam a ser as consequências financeiras (e sociais...) da política de austeridade que implementava. Em Novembro de 2012, a mês e meio do fim do ano, Vítor Gaspar continuava a jurar que o défice orçamental seria de 5% (abaixo). E dois meses depois disso, já com o exercício encerrado, a jura, agora perante os seus pares europeus, continuava a ser a mesma: 5%. Na verdade, o valor do défice daquele ano veio a ser algo superior às juras de Gaspar: 5,7% em 2012 (como hoje se constatará em qualquer gráfico com o histórico dos défices em Portugal, até mesmo num gráfico martelado por José Gomes Ferreira). Se Vítor Gaspar passou à história como o ministro que nunca acertava nas previsões, é importante reter que o caso deste (colossal) desvio de 1.200 milhões € não se tratou de nenhuma previsão: era uma estimativa porque o ano já havia sido encerrado quando Vítor Gaspar transmitia em Bruxelas aquela sua convicção. Ou seja, Vítor Gaspar nem sequer parecia acertar na bola mas, ainda assim, isso parecia não incomodar sobremaneira a figura tutelar do seu homólogo alemão Wolfgang Schäuble, que por essa altura ainda andava pouco propenso a empregar metáforas futebolísticas e a descobrir Ronaldos.
«...Eu não me esqueço...» Deve-se preservar a memória daqueles tempos difíceis e dos ensinamentos úteis que me lembro - também! - de ter ouvido ao primeiro ministro Pedro Passos Coelho. Podêmo-lo ouvir mais abaixo, numa das suas intervenções mais polémicas, ao empregar a expressão piegas para se referir ao nosso comportamento colectivo. Como costuma acontecer com as grandes indignações, também esta simplificou em demasia as palavras que foram então proferidas: «...as pessoas percebem que o que estamos a fazer está bem feito (...) então devemos persistir, ser exigentes, não sermos piegas, se encontrarmos sempre desculpas para o coitadinho que não teve tempo de estudar e fazer os trabalhos, se encontrarmos sempre uma explicação para os maus resultados, (...), não vamos lá...» Bom, para o que interessa e apesar da retórica aqui exibida pelo primeiro ministro, não fomos lá: Vítor Gaspar demitiu-se ao fim de dois anos no cargo. O tempo e os resultados vieram a provar que aquilo que eles estavam a fazer estaria afinal a ser mal feito. E o que houve, e ironicamente vindo das bandas do mesmo Pedro Passos Coelho que abaixo discursa, foram variadas "explicações para os maus resultados" e "desculpas para o coitadinho". E o que nos resta, numa outra ironia inversa, é persistir em contradizê-los, ser exigentes, não sermos piegas e insistir que reconheçam que Vítor Gaspar foi um dos piores titulares que passou pela pasta das Finanças...
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