A cinco dias da data acordada para a independência de Cabo Verde (5 de Julho de 1975), mas um pouco mais de dois meses depois das primeiras eleições - efectivamente - livres realizadas em Portugal (as de 25 de Abril de 1975), o Diário de Lisboa noticiava discretamente a realização daquilo que qualificava como as primeiras eleições livres na colónia portuguesa em vias de se emancipar. Símbolo de uma tolerância ideológica que o tempo torna hoje ridiculamente inaceitável, as eleições livres(?) de Cabo Verde caracterizavam-se pela apresentação de uma única lista concorrente (a do PAIGC), sem qualquer outra opção de voto, algo que fora a característica das pretensas eleições(?) durante os 48 anos da ditadura do Estado Novo, e algo que fora enfaticamente renegado pelos portugueses em 25 de Abril com a sua afluência às urnas de 91%. Mas naquele caso, ou por ser quem era (o PAIGC), ou por ser para quem era (os cabo-verdianos), os problemas de consciência pela falta de pluralismo nem se pareciam colocar em quem redigia estas notícias. Por todo o lado brincava-se demasiado com as palavras sem que se apercebessem das implicações do que diziam: aqui abaixo Sérgio Godinho cantava que África é dos africanos, assim como hoje a extrema-direita lhe pode pegar nessas palavras de outrora e acrescentar que a Europa é dos europeus...
Sem comentários:
Enviar um comentário